O garçom dos governadores

 O garçom dos governadores

 ‘Um dia fui a Assembléia visitar os amigos e quando cheguei todo mundo veio me dizer: Milton a mulher do governador quer falar contigo. Eu não sabia nem quem era Palmira’

Milton Pereira da Silva

Miltinho, o garçom dos governadores de Rondônia

Conheci o Miltinho quando nossa turma “Curriola 40” freqüentava o Meio Quilo Bar (década de 1970), que ficava na esquina da rua Campos Sales com a Pinheiro Machado, daí pra frente, sempre nos encontramos, seja nos clubes sociais no tempo do carnaval e desde o final da década de 1980 e inicio da década de 1990, pelos corredores do palácio do governo. “De Jerônimo Santana até Confúcio Moura, sou um dos garçons do gabinete”. Mesmo sem ainda ser contratado como funcionário público, Miltinho foi convidado ou contratado para servir o presidente João Figueiredo em sua visita a Porto Velho. “Me deram dois crachás, uma para atender no gabinete do palácio Presidente Vargas e outro para atender o presidente na residência oficial. Até hoje guardo esses crachá”.

Sexta feira passada (15) fui até o nono andar do palácio Rio Madeira módulo Rio Pacaás Novos só para entrevistar o Milton Pereira da Silva ou o garçom Miltinho.

ENTREVISTA

Zk – Vamos começar falando sobre sua origem, onde nasceu essas coisas?

Milton – Nasci em Lábrea no Amazonas, no dia 13 de dezembro de 1950. Meu pai Francisco Pereira da Silva era seringalista lá, porém, quando abriu a estrada ele fechou o seringal de Lábrea e abriu um seringal aqui em Rondônia na beira do rio Abunã, era o seringal Mocambo. Em 1970 vim servir o exército aqui em Porto Velho e em 1971 voltei e fui tocar o seringal de um cunhado que tinha casado com uma irmã minha. Esse seringal ficava perto de Extrema, passei um ano trabalhando lá e resolvi voltar para Porto Velho e fui trabalhar de hoteleiro, Puxei 15 anos de hotelaria.

Zk – No seringal você fazia o que?

Milton – Puxava borracha e castanha do Velho e entregava mercadoria aos fregueses dele, geralmente charque em fardo de 60 quilos, pirarucu seco, farinha que vinha do Pará em paneiros, açúcar em saca de 60 quilos, sal que vinha em saco de 30 quilos e conserva em lata. Pirarucu e charque, aquelas mantas que ficavam embaixo do lote, estragava, ficava escorrendo aquela salmoura para debaixo do assoalho do barracão e o gado vinha lamber aquilo que ficava entranhado na terra.  Vale salientar que não era gerente do seringal, os seringueiros me chamavam de “filhinho de papai”, porém, eu trabalhava só pela comida e a roupa, a gente tinha dois armazéns, um na boca do Remancinho e outro na sede central do seringal.

Zk – Como era a vida do filinho do papai no seringal?

Milton – Quando eu chegava, mandava “chover” o velho tinha dinheiro mesmo, as meninas vinham pra cima com garra, botava elas na garupa do jumento e caia no trecho. Pra me fazer respeitar andava com um terçado 128 de um lado e um revolver 38 do outro.

Zk – Veio servir o exército em qual unidade?

Milton – Servir no 5º BEC, trabalhando na abertura da BR 421 em Ariquemes no serviço de terraplanagem, ajudei a montar muito bueiro, fui ajudante no serviço de topografia, cortando estaquinha, enfrentando sol quente, caba e abelha que dava muito naquele trecho.

Zk – Como foi que você se tornou garçom?

Milton – Eu trabalhava no Meio Quilo Bar que ficava ali na Campos Sales com a Pinheiro Machado e era freqüentado inclusive pela sua turma, a chamada “Curriola" 40. O Agostinho que era dono do Meio Quilo me viu trabalhando no posto de gasolina “Canarinho” limpando vidro de carro, me convidou pra trabalhar com ele e eu aceitei. O Selthon Hotel tinha acabado de inaugurar e então fui lá procurar emprego. A sorte foi que o Luiz chefe do RH era freguês no Meio Quilo e então ele falou de cara, “Amanhã você já pode vir trabalhar”.

Zk – Entrou como garçom?

Milton – Não, comecei como “Cumim”, que é o ajudante do garçom. O garçom serve e o “Cumim” vem depois limpando a mesa e levando o material sujo para a cozinha. Por coincidência um colega que era o barman teve um problema com a direção e me colocaram no lugar dele e então passei a ser o encarregado em preparar as bebidas como coquetel, caipirinha, caipirosca, gim tônica e outras. Aí surgiu o restaurante do Hotel Floresta e um colega me convidou pra ir trabalhar lá. O bom no Floresta era que no final do dia o dinheiro estava na mão. Fiquei la por mais de nove anos. Acontece que naquele tempo, segundo me informaram, quando o trabalhador completava 10 anos na mesma empresa, passava a ter direito nos lucros e então o gerente me chamou e explicou que teriam que me dispensar porque eu estava para completar o tempo limite de dez anos. Me pagou direitinho a indenização e fui embora.

Zk – Como garçom vocês atendem todo tipo de pessoa, os mais exigentes os cheios de frescura. Fala sobre isso?

Milton – Meu sistema de trabalho é o seguinte: Não diferencio ninguém. Não sei se você já notou, garçom gosta de chamar todo mundo de doutor. Até hoje atendo todos com a mesma gentileza. Ninguém é melhor que o outro.

Zk – E nos clube sociais?

Milton – Trabalhei em todos, em especial o Clube dos Oficiais do 5º BEC que era freqüentado pela fina flor da sociedade porto-velhense. Ypiranga, Ferroviário, Botafogo, Yes Banana enfim, em quase todos. Tem uma história interessante:

Zk – Qual é?

Milton – O dono do hotel Rondon Pálace o Chico Torres, fez uma festa no Botafogo, que ninguém dava conta de puxar bandeja, a gente levava a cerveja na grade, ele estava querendo ser candidato a deputado federal e fez a festa, porém, não conseguiu sair candidato.

Zk – Um evento importante?

Milton – Quando o presidente João Figueiredo veio a Porto Velho eu fui escolhido para ser o garçom dele, fui eu e o Lourival, inclusive peguei dois crachás porque tinha que servir dentro do gabinete e servir o almoço na residência oficial. Até hoje guardo os dois crachás. Eu ainda não era funcionário público, pois o Figueiredo veio aqui na época do governador Teixeirão.

Zk – Explica como é que o garçom tem que servir o cliente?

Milton – O sistema do restaurante é: Primeiro apresenta o cardápio pelo lado direito do cliente, ele vai perguntando sobre os pratos e a gente vai explicando. Na hora de servir a comida é pelo lado esquerdo, a bebida pelo lado direito. Hoje poucos restaurantes trabalham com o a La Carte a maioria é no selve serve.

Zk – Como foi que você conseguiu entrar para o quadro de funcionário do governo de Rondônia?

Milton – Primeiro tenho que voltar pra falar sobre minha dispensa do Floresta Hotel. O gerente vendo que eu estava prestes a me tornar sócio da empresa por força da Lei me chamou no escritório e justificou: O senhor é um ótimo funcionário, mas, estamos lhe dispensando do nosso quadro e tal... Rapaz eu lagrimei. Sai do escritório e tomei uma decisão: Vou trabalhar por conta. Montei um bar com mercearia, sinuca, dominó, baralho. Isso lá na Embratel perto da câmara de vereadores. Quando terminei de montar tudo bacaninha, um colega meu me indicou para trabalhar no governo.

Zk – Detalhe esse convite?

Milton – O governador era o Jerônimo Santana e a esposa dele dona Palmira pediu a esse meu colega que arranjasse um garçom de confiança e ele me indicou. Um dia fui a Assembléia visitar os amigos e quando cheguei todo mundo veio me dizer: Milton a mulher do governador quer falar contigo. Eu não sabia nem quem era Palmira. Fui até a residência do governador e ela me recebeu e foi logo dizendo: o senhor venha amanhã, já está contratado e então passei a ser o garçom da residência oficial do governador ali perto do Mercado Central, teve uma época que a residência entrou em reforma e fomos para uma casa na rua Equador. Depois fomos para uma chácara que era do Chagas Neto na estrada da Penal onde ficamos até o final do mandato.

Zk – Dos governadores que você atendeu: Jerônimo, PIana, Raupp, Bianco, Cassol e agora o Confúcio. Qual foi o mais exigente?

Milton – Vou ser sincero, pra mim todos são igual. Pra mim todos foram e são bons. Depois que o Jerônimo saiu fui pro gabinete e até hoje sirvo o governador e suas visitas, além de atender nas solenidades que acontecem no palácio.

Zk – Casado?

Milton – Vivi 33 anos com a dona Raimunda e tivemos cinco filhos, três homens e duas mulheres. Nos separamos, deixei tudo pra ela e hoje vivo sozinho.

Zk – Sobre este ano de 2017?

Milton – Pra mim foi uma ano muito bom. Quanto ao Natal, só tenho a dizer que todos procurem fazer o bem ao seu próximo, não se é feliz sem amar o próximo. O que dizer: FELIZ NATAL E PRÓSPERO ANO NOVO!

Autor / Fonte: Zekatraca

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