Ueliton Bayer Brizon foi executado a tiros no dia 16 de janeiro de 2018 em plena luz do dia no município de Cacoal.
Porto Velho, RO – Quem se importa com a memória de um jornalista de Rondônia assassinado em plena luz do dia? Colegas de imprensa dão de ombros; o governo do Estado finge que o caso não existe – e os organismos criados para defender tanto profissionais do eixo quanto a categoria em si fecham os olhos à barbárie.
A sentença de morte do repórter Ueliton Bayer Brizon, de 38 anos à época, proprietário do site Jornal Rondônia e suplente de vereador em Cacoal, fora aplicada pelo Tribunal de Exceção do Crime no já longínquo 16 de janeiro de 2018.
De lá para cá o tempo voou para nós, pessoas alheias à situação. No entanto, familiares e amigos observam a areia escorregar devagar na ampulheta, de farelo em farelo, compenetrados e ansiosos durante um ano, dois meses e doze dias. O ponteiro no relógio deles se aproxima, atualmente, da marca insustentável das dez mil horas de injustiça.
Brizon deixou esposa e três filhos. Alguém pensa neles? A resposta é sim, por incrível que pareça.
Vinicius Valentin Raduan Miguel, o professor universitário que concorreu ao Governo do Estado em 2018, abraçou a causa desde o início. Vinicius Miguel, como ficou conhecido, também é advogado e, assim que soube do final trágico do jornalista, se movimentou a fim de promover justiça à memória do profissional.
A partir do seu envolvimento não demorou para que o Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) encaminhasse solicitação oficial ao ex-governador Confúcio Moura (MDB) exigindo informações sobre o assassinato de Ueliton Brizon. O documento assinado no dia 20 de fevereiro do ano passado aportou às dependências do Palácio Rio Madeira no dia 05 de março, logo em seguida. Veja o documento.
Já no dia 17 de março deste ano, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) publicou o Informe Anual da Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão 2018, um relatório de 408 páginas em versões apresentadas tanto em inglês quanto espanhol, apontando, especificamente sobre o Brasil, situações em que jornalistas foram assassinados por possíveis motivos relacionados ao exercício da profissão. O caso Brizon é um deles.
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"[...] A Relatoria Especial recebeu informações sobre o assassinato de Ueliton Brizon em 16 de janeiro e de Jefferson Pureza, da Beira Rio FM, em 17 de janeiro . Segundo relatos, os dois jornalistas haviam recebido ameaças antes de seus assassinatos. Além disso, a estação de rádio onde Pureza trabalhou teve um incêndio em novembro de 2017, sob circunstâncias que permanecem incertas. O Relatoria também recebeu informações sobre os assassinatos de Jairo Souza, da Pérola FM, no município de Bragança, no Estado do Pará, no dia 21 de junho e de Marlon de Carvalho Araújo, na cidade de Chapada, zona rural fora da cidade de Riachão do Jacuípe, Bahia, Araújo, no dia 16 de agosto.* [...]"
*Página 66 do Informe Anual da Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão 2018
A intervenção de Vinicius Miguel fez com que a execução do profissional fosse registrada no relatório, compelindo o órgão internacional a preservar a memória do jornalista; por outro lado, a injustiça, seja corrigida ou não, já está marcada na história para sempre, anexada à lista vergonhosa de casos regionais ainda irresolutos e jogados para debaixo do tapete, como os de Moisés Rodrigues e do bebê Nicolas Naitz.
A despeito do trabalho excepcional desempenhado pela Polícia Civil de Rondônia (PC/RO) em termos de efetividade na elucidação de homicídios (63% contra a média nacional que varia de 9 a 16%) há, justamente por conta do êxito comprovado pelos índices, a necessidade de impor termo às investigações sem respostas, lembrando ainda que, em regra, a cobrança sempre é maior em cima das instituições mais competentes
Se aqui lavamos as mãos, lá fora, inegavelmente, aqueles que sequer nos conhecem romperam as fronteiras rondonienses gritando o nome da vítima a todos os rincões do Planeta Terra. Além disso, fazem questão de emprestar o mínimo de dignidade à trajetória do ser humano exterminado em nosso quintal.
Vinicius Miguel levou caso de Ueliton Brizon à Corte Interamericana de Direitos Humanos / Divulgação
Na visão de Vinicius Miguel, o relatório, embora simbólico, traz consigo a preocupação com todos os aspectos da vida e também visa defender as características mais comezinhas do exercício jornalístico:
“A publicação é um gesto de respeito aos mortos, mas, ao mesmo tempo, expõe a necessidade de alertar as pessoas que, no Brasil, o jornalismo tem sido julgado e condenado por criminosos. E essas penas capitais quando executadas levam para a cova junto com o profissional os princípios constitucionais que garantem as liberdades de imprensa e de expressão”, concluiu.
Portanto, imprescindível que se jogue a pá de cal na negligência do ex-chefe do Executivo Confúcio Moura e passemos a conversar com o homem que se elegeu sob a égide do discurso voltado à segurança pública: o atual governador Coronel Marcos Rocha (PSL).
Além dele, o assunto deve ser analisado por José Hélio Cysneiros Pachá, titular da pasta responsável pelo setor.
Lembrando aos coronéis que, enquanto redigia este artigo, desceu outro farelo do enorme deserto represado na ampulheta da impunidade. E aproveitando o ensejo, inclusive, faço questão de pedir com toda a gentileza à grandiosa Sara Xavier, presidente do Sindicato dos Jornalistas de Rondônia (SINJOR), encarregada da difícil missão de reerguer a entidade outrora quase falida, que, através da instituição, faça o possível para contribuir com o deslinde desse caso levando pessoalmente a demanda ao governador.
Autor / Fonte: Vinicius Canova
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