Todo ano de eleições a ladainha se repete e as esperanças sempre se renovam na atrasada província de Cu-do-Mundo. Com menos de 0,8 por cento do total de eleitores do país inteiro, o insólito lugar sequer teve a presença dos dois principais candidatos a presidente do país durante a campanha. O ex-presidiário corrupto e o miliciano genocida não perderam seu precioso tempo para visitar paragens de gente tão atrasada e selvagem como muitas das que habitam o grotão subdesenvolvido. Mas na capital e principais cidades do atípico sertão, a campanha está de vento em popa. Dizem algumas pesquisas que a extrema-direita reacionária tem quase 60 por cento das intenções de voto enquanto os esquerdistas ladrões patinam com menos de metade disto. Ainda assim, nenhum resultado eleitoral saído do insalubre rincão terá qualquer consequência para o pleito final.
Quase todos os candidatos fizeram suas costumeiras promessas para tirar Cu-do-Mundo do eterno atraso em que sempre se encontrou. A duplicação da principal estrada da província, por exemplo, constou obviamente nas falas da maioria das futuras autoridades. Mas passado o pleito, todos se esquecem e a criminosa estrada continua com a sua triste sina de matar gente diariamente. Todas essas autoridades, no entanto, falaram entusiasmadas do agronegócio e das riquezas naturais que abundam naquelas bandas. Mas ninguém deu um pio sequer sobre as criminosas queimadas que todos os anos enchem de fumaça e fuligem o outrora “céu azul” cantado em verso e prosa no horroroso hino local. Cu-do-Mundo faz parte do “arco do fogo” e juntamente com outras províncias vizinhas envergonham o país inteiro com tanto fogo na única e última floresta tropical do mundo.
A capital de Cu-do-Mundo é uma nojeira só. A seboseira sempre foi a marca registrada do imundo lodaçal. Sem água tratada nem rede de esgotos, o lugar é muito pior do que as cidades da África Subsaariana ou de Porto Príncipe no Haiti. Nem mobilidade urbana existe na podre e fedorenta urbe. Porém, a felicidade parece ser uma constante entre os muitos pobres e despolitizados habitantes locais. Uma capital de província que não tem uma rodoviária decente seria algo surreal em qualquer lugar do mundo. Menos no grotão inóspito e inabitável. E claro, há promessas de que em pouco tempo vão ter um lugar “menos ruim” para receber os ônibus do país inteiro. Óbvio que também não existe um só hospital de pronto-socorro na currutela inteira. Há um imprestável e nojento “açougue”, que parece um campo de concentração, e que recebe os pacientes mais pobres.
Também já há promessas, só as promessas mesmo, de se construir um outro “açougue” mais moderno para os tolos e idiotas eleitores da capital e de toda a província de Cu-do-Mundo. Não se sabe onde nem quando isso acontecerá. E os que fazem esses compromissos sempre saem na frente em todas as eleições e geralmente se reelegem sem maiores problemas devido à estupidez e ao conformismo de seus acomodados cidadãos. Dessa forma, a infeliz província é enterrada a cada dois anos. E em igual período de tempo, sempre renasce para ouvir e ainda acreditar nas promessas vazias que nunca serão cumpridas. Fala-se que a província é um lugar sem futuro, pois os candidatos de lá brigam entre si para apoiar qualquer um. Daqui a poucas horas muitos vão às urnas para sacramentar mais outro enterro. Não só desta província obsoleta e distante, mas do país inteiro. Haverá, claro, os candidatos vitoriosos, mas Cu-do-Mundo sempre será derrotada.
*Foi Professor em Porto Velho.