ARTIGO Carta aberta à deputada federal de Rondônia Cristiane Lopes; por Vinicius Miguel Publicada em 13/03/2023 às 08:43 Prezada Deputada, Espero que esteja bem. Escrevo esta carta porque vi uma notícia em que a senhora anunciava uma "frente parlamentar em favor das mães atípicas". Bom. Sua manifestação parece eivada de boa vontade. Mas não posso deixar de fazer algumas ponderações. Quando a Prefeitura de Porto Velho ajuizou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a "Política pública para garantia, proteção e ampliação dos direitos das pessoas com Transtornos do Espectro Autismo, e dá outras providências" (Lei Municipal 2.782, de 2020), a senhora se pronunciou? A senhora sabe, por acaso, que a Prefeitura de Porto Velho, vem negando o desconto de IPTU às famílias neurodivergentes (e de demais deficiências), afastando a vigência de lei municipal por também ter ajuizado medida para declarar sua (suposta) inconstitucionalidade? Mas, tudo bem, a senhora não é mais vereadora... Ocupou por algum tempo a cadeira de gestora da Secretaria Estadual de Educação (Seduc/RO), certo? Na posição de ex-Secretária Estadual de Educação, a senhora consegue se recordar quantos acompanhantes especializados foram contratados para auxiliar crianças e adolescentes autistas e, assim, dar eficácia à Lei Berenice Piana (art. 3o, Parágrafo Único)? Conseguiria rememorar quantas campanhas, eventos ou atividades foram realizadas pela Seduc/RO, na sua gestão, para trazer a participação da comunidade na formulação de políticas públicas educacionais? Não vou alongar no tema da Educação, um direito por demais sonegado às crianças autistas e suas famílias. Vou perguntar sobre a identificação, no Registro Geral, expedido pela Secretaria Estadual de Segurança, Defesa e Cidadania (Sesdec/RO). A senhora sabe que o órgão não possui condições de registrar dados indispensáveis a "dimensionar a magnitude e as características do problema relativo ao transtorno do espectro autista" no Brasil, negando efetividade ao comando legal (art. 2o, VIII, da mesma legislação)? Não saber não é ruim. Como profissional da Educação, eu gosto de pensar que sempre é tempo de aprender. Não vou também me apegar ao seu passado, como legisladora municipal ou como gestora, que pouco contribuiu para a pauta de autismos, deficiências e outros. Vou olhar para o futuro. A senhora tem um futuro promissor na política rondoniense. Sua trajetória demonstra suas capacidades de comunicadora. Use isso para, de fato, aprender sobre a temática. Use sua empatia de mãe, como a senhora insistiu em trazer em seu anúncio, para fiscalizar a péssima execução de políticas de diversidade e inclusão. Use sua sapiência e conhecimentos bíblicos, para, somados ao seu cargo de Deputada, denunciar a política de assassinato intelectual e de incapacitação do desenvolvimento das crianças autistas, com deficiências e doenças raras. Denuncie a necropolítica, esta implantada pelo Governo Estadual, que sonega mesmo atendimento médico que possibilite mesmo o diagnóstico e atualização de laudos (como quem cita Mateus, 19:14, "Jesus, porém, disse: Deixai as crianças e não as impeçais de virem a mim, porque de tais é o reino dos céus"). Não se recusa uma aliada. E a pauta de autismos, deficiências e doenças raras precisa de cada aliado ou parceria possível. Nessa condição, o meu desabafo é que estamos cansados das retóricas, dos populismos que exploram o sofrimento das famílias e suas crianças e, por fim, das demagogias midiáticas que tentam se beneficiar das vulnerabilidades de pessoas com deficiências, sem ações concretas e palpáveis. Aqui, indicaria três linhas imediatas que pedem ação. A primeira é o papel fiscalizatório. Como indicado, há um profundo déficit na efetivação de leis já consolidadas. A execução orçamentária e política é inadequada. Garantir direitos básicos tem sido um ponto de fracasso do Governo Estadual. Acessar consultas médicas, tratamentos e medicamentos tem sido uma tarefa impossível. A segunda linha é inserir na discussão política o investimento em Pesquisa e Desenvolvimento e a valorização da Ciência e Tecnologia. Este pode ser um caminho para novas terapêuticas, descobertas de fármacos e mudanças institucionais e atitudinais. É um caminho que merece um olhar atento. Conhecer e apoiar as iniciativas nas universidades e institutos federais é algo necessário também. Por fim e não menos importante, é essencial olhar para as condições de privação e pobreza que afetam as pessoas com autismo, deficiências e doenças raras. Assegurar uma renda básica mínima às famílias, pessoas com deficiências e doenças raras é outro aspecto negligenciado. Não ignore a intersecção entre pobreza e exclusão nesse público. Temos uma longa distância a percorrer em busca de sociedade inclusiva. Fraternalmente, Vinicius Valentin Raduan Miguel É especialista em Administração Pública (CIPAD-FGV). Doutor em Ciência Política (UFRGS). Integrou a coordenação-geral da Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente. Professor da Universidade Federal de Rondônia, onde, atualmente, pesquisa e coordena projetos na temática de Saúde Mental e Direitos Humanos, com foco em autismo, deficiências e neurodiversidades. Fonte: Vinicius Valentin Raduan Miguel Leia Também Cristiane Lopes visita Vale do Jamari e estabelece planejamento para conquistar investimentos para a região Deputado Edevaldo Neves vota favorável a lei que beneficia agentes socioeducadores Deputado Alan Queiroz faz balanço de viagem à Brasília com visitas aos ministérios Deputado Ribeiro do Sinpol faz visita nas delegacias do interior do Estado Vereador Fogaça comemora revogação da lei que aumentou preço do IPTU em Porto Velho Twitter Facebook instagram pinterest