EDITORIAL Tarifaço de Trump: discurso pró-soberania deve crescer em Rondônia enquanto as moscas e ratos aplaudem o veneno Publicada em 02/08/2025 às 10:05 Porto Velho, RO – Por muito tempo Rondônia manteve um ciclo eleitoral movido a fé ideológica na figura de Jair Bolsonaro (PL) e em seus símbolos, alinhando-se automaticamente aos desígnios do bolsonarismo em sua vertente mais rígida. Porém, o cenário começa a apresentar ruídos. O tarifaço imposto por Donald Trump ao Brasil, articulado com apoio público de Eduardo Bolsonaro, reacendeu o debate sobre os custos — políticos e econômicos — de uma adesão automática e acrítica ao bolsonarismo em sua face mais extremada. Em Rondônia, estado que exportou US$ 122,7 milhões para os Estados Unidos em 2024, os impactos começam a ser sentidos. E surgem questionamentos legítimos: ainda vale a pena, em 2026, ser puramente bolsonarista no estado? O custo da bajulação ideológica: aplausos a quem pune Enquanto o presidente norte-americano assinava a medida tarifária que elevará a 50% o imposto sobre produtos brasileiros, entre eles carne bovina, soja e café — carro-chefe das exportações rondonienses —, lideranças locais como o senador Marcos Rogério (PL) desfilavam orgulhosamente com bonés “Make America Great Again”. Um gesto de alinhamento que, em tempos de campanha, pode parecer eficaz, mas que hoje, diante de prejuízos concretos, beira o auto boicote político. A conta chegou: segundo estimativas da Confederação Nacional da Indústria (CNI), o impacto do tarifaço pode reduzir o Produto Interno Bruto (PIB) de Rondônia em até 0,20%, o que representa uma perda econômica de aproximadamente R$ 152 milhões. Quase 77% das exportações rondonienses para os EUA provêm da indústria de transformação — exatamente o setor mais atingido pelas novas tarifas. A carne bovina desossada e congelada, produto mais exportado por Rondônia para o mercado americano (US$ 43,9 milhões em 2024), lidera a lista dos afetados. Junto a Marcos Rogério e Chrisóstomo, Sofia fecha a tríade do bolsonarismo-raiz / Reprodução Ainda assim, a retórica entre os políticos bolsonaristas permanece presa à repetição de slogans e símbolos, mesmo diante do evidente choque de interesses entre as necessidades locais e a pauta ideológica defendida nacionalmente. Marcos Rogério, Coronel Chrisóstomo e Sofia Andrade — os principais nomes do bolsonarismo-raiz em Rondônia — ainda tentam emplacar discursos de guerra cultural e embates simbólicos como “fantasmas do comunismo”, sem qualquer lastro econômico tangível. O discurso beligerante, aliás, parece ter atingido novo estágio de exacerbação após a aplicação da Lei Magnitsky contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Desde então, parlamentares bolsonaristas entraram em verdadeiro cio político, acionando movimentos pelo impeachment do magistrado. A ironia, porém, está nos fatos: quando Marcos Rogério teve oportunidade concreta de enfrentar o STF “dentro das quatro linhas”, votou contra a CPI da Lava Toga, ajudando a enterrá-la no Congresso Nacional. Hoje, a indignação não se ancora na coerência institucional, mas em motivações personalíssimas. Com Bolsonaro acuado judicialmente, o radicalismo reacende, mas agora movido por urgência existencial — não por convicção programática. Enquanto isso, o país se divide. O tarifaço reacendeu o sentimento nacionalista em amplos setores. No campo progressista, o ataque de Trump foi percebido como um golpe direto à soberania nacional. Na direita mais moderada, que também sentiu o baque econômico — especialmente nas cadeias do agronegócio —, emergiu o reconhecimento de que Eduardo Bolsonaro, ao provocar a retaliação americana, deu um tiro no próprio pé. Esse rearranjo narrativo pode levar a uma campanha eleitoral nacional mais focada na defesa do Brasil e menos em idolatrias personalistas. Em Rondônia, especialmente, será cada vez mais difícil sustentar a tese de que a obliteração da economia é um preço aceitável para salvar Jair Bolsonaro. Porto Velho, 2024: a primeira rachadura visível A derrota da candidatura apoiada diretamente por Jair Bolsonaro em Porto Velho nas eleições municipais de 2024 foi um sinal claro de que o uso isolado do capital simbólico bolsonarista já não basta. A candidata do PL levou Bolsonaro à Capital, promoveu um evento com palco e aparato de grande porte, contou com a presença de Michelle Bolsonaro — e, mesmo assim, perdeu por ampla margem para Léo Moraes (Podemos), cuja estratégia foi, basicamente, se manter alheio às guerras ideológicas e, agora, já eleito, demonstrar uma realização prática por dia. A simbologia desse resultado extrapola a Capital. A campanha bolsonarista aplicou o que antes era fórmula vitoriosa: presença física do ex-presidente, apelo emocional, imagens de palanque. Mas a aposta se revelou ultrapassada. No lugar do carisma pré-fabricado, venceu o gestor que entregou resultados concretos. E, mais importante, venceu quem evitou atrito direto com o espectro ideológico em disputa, priorizando a comunicação local e efetiva. Chrisóstomo chegou a falar em intervenção das Forças Armadas / Reprodução O bolsonarismo performático e o papel das caricaturas Se há algo que caracteriza a atual expressão política de figuras como Chrisóstomo e Sofia Andrade é a performatividade. O deputado federal, por exemplo, chegou a pedir “intervenção das Forças Armadas” em nome da “democracia”, um paradoxo semântico que, além de expor seu extremismo, desconecta-o de parte considerável do eleitorado. Andrade, vereadora da Capital, virou meme após tentar fiscalizar pessoalmente uma faixa política de esquerda (que já nem estava lá), em ato que não teve resultado prático algum. Essa bajulação desenfreada à pauta externa, que contribui para prejuízos internos, se aproxima da alegoria: “as moscas e mosquitos celebrando o inseticida; os ratos, a estricnina”. A celebração de quem golpeia a soberania nacional é, hoje, o retrato mais sincero da contradição do bolsonarismo rondoniense. Nem mesmo entre os bolsonaristas mais fiéis há unanimidade. Pesquisa PoderData de 31 de julho revela que 34% dos eleitores de Bolsonaro responsabilizam o ex-presidente e sua família pelo tarifaço imposto por Trump. Já os dados do Datafolha apontam que 57% dos brasileiros consideram que Trump errou ao pedir que a Justiça brasileira interrompesse o julgamento de Bolsonaro. Entre os próprios eleitores do ex-presidente, 28% concordam com essa crítica ao republicano. O bolsonarismo fora da bolha: as exceções pragmáticas Apesar do desgaste, não se pode ignorar que o apoio de Bolsonaro ainda movimenta algumas peças no tabuleiro. Em Ji-Paraná, o candidato do PL, Affonso Cândido, alavancou sua campanha com apoio explícito de Bolsonaro durante passagem pela cidade. No entanto, Cândido se distancia da ala fanática. Sua postura pública não adere às pautas exóticas e retóricas, preferindo apresentar resultados de gestão. É bolsonarista, mas pragmático. O mesmo se observa no governador Marcos Rocha (União Brasil). Embora amigo pessoal de Bolsonaro, preferiu manter discurso moderado, distanciando-se da radicalização promovida por Marcos Rogério em 2022 — fator determinante para sua reeleição. Sem se prender a discursos vazios, Rocha absorveu votos da centro-esquerda e até da esquerda, esvaziando o projeto do senador bolsonarista. Affonso Cândido e Sílvia Cristina representam a direita mais pragmática / Reprodução A construção de alternativas A deputada federal Sílvia Cristina (PP) é outro exemplo de liderança que se consolidou fora da bolha ideológica, embora amiga do ex-presidente e da ex-primeira-dama. Ao longo de dois mandatos, optou por focar na entrega de resultados. Evita polêmicas públicas e prioriza números — emendas liberadas, equipamentos entregues, convênios firmados. Sua postura educada e firme, mesmo diante de desgastes como a disputa interna com Ivo Cassol pela liderança do Progressistas, lhe garantiu apoio suficiente para sustentar sua pré-candidatura ao Senado. Esse comportamento político, centrado na entrega e no diálogo, tem potencial para encontrar eco num eleitorado que começa a priorizar soberania econômica e equilíbrio institucional, acima das guerras ideológicas intermináveis. Nesse ambiente, nomes como o senador Confúcio Moura (MDB), que conta com apoio do presidente Lula, também ganham fôlego. Sem ruídos, sem ataques, apenas com o peso da institucionalidade e da estabilidade, Confúcio pode se tornar figura central numa frente moderada e pró-soberania. No dia 26, já no pós-anúncio do Tarifaço contra o Brasil, Marcos Rogério postou foto com boné da campanha de Trump / Reprodução Rondônia e o custo da lealdade cega O tarifaço de Trump, articulado em carta onde o ex-presidente dos EUA relaciona a taxação à situação judicial de Bolsonaro, impôs a Rondônia um ônus direto. Com 4,7% de suas exportações direcionadas aos Estados Unidos, o estado figura entre os mais vulneráveis a esse novo cenário. A Confederação Nacional da Indústria aponta que o impacto direto no PIB pode atingir R$ 152 milhões. O produto mais atingido será a carne bovina congelada e desossada, seguido de soja, café, carne fresca e sebo. Entre 76,6% das exportações rondonienses destinadas aos EUA em 2024, a maior parte veio da indústria de transformação — setor com maior potencial de perda. Enquanto isso, alguns parlamentares locais continuam promovendo discursos de confronto simbólico, sem qualquer defesa objetiva dos setores produtivos atingidos. Bruno Scheid aposta no mais "puro suco do bolsonarismo" para ser senador por Rondônia / Reprodução Em 2026, o bolsonarismo nu diante do espelho Com a aproximação das eleições de 2026, a questão que se impõe é: haverá espaço para candidaturas que não ofereçam nada além da repetição vazia de slogans e gestos? Em Rondônia, os sinais de exaustão são visíveis. Até entre os próprios bolsonaristas, cresce o incômodo. Dados do Datafolha indicam que 89% dos brasileiros acreditam que o tarifaço prejudicará a economia. A percepção de que Bolsonaro é alvo de perseguição também está dividida: 50% acham que não há injustiça alguma. E, no mais importante, 39% dos brasileiros acreditam que Eduardo Bolsonaro teve forte influência na decisão de Trump. Em resumo, a lealdade automática a uma retórica que já não entrega nada — nem votos, nem crescimento, nem desenvolvimento — pode custar caro. A aposta exclusiva no bolsonarismo puro, sem projetos, sem pautas locais, sem defesa da soberania, pode deixar os candidatos de Rondônia sozinhos. Ainda vociferando contra o “fantasma do comunismo”, mas já sem plateia. Fonte: Redação | Rondônia Dinâmica Leia Também Com apoio de Sílvia Cristina, produtores recebem certificados de operador de trator e máquinas agrícolas em Nova Brasilândia do Oeste Tarifaço de Trump: discurso pró-soberania deve crescer em Rondônia enquanto as moscas e ratos aplaudem o veneno Luizinho Goebel parabeniza Cerejeiras pelos 42 anos de emancipação e destaca força do povo Assentamento em Nova Mamoré, terá ambulância após compromisso firmado pelo deputado Ezequiel Neiva Deputado Eyder Brasil participa do lançamento do 1º Impostômetro da Região Norte em Porto Velho Twitter Facebook instagram pinterest