A noite é mais escura pouco antes do amanhecer

A noite é mais escura pouco antes do amanhecer

Porto Velho, RO – Qualquer fã do Universo DC Comics reconhecerá de pronto a frase título deste artigo. Se é admirador de Christopher Nolan, então, nem se fala! Foi um colega fictício da antiga profissão do prefeito Dr. Hildon Chaves (PSDB), promotor de Justiça aposentado, que a proferiu: Harvey Dent (foto), eleito salvador de Gotham.

Dent seria, caso os planos de Bruce Wayne, o Batman, se concretizassem, o herói de carne e osso que a cidade tanto necessitava – alguém com rosto, palpável, acessível e completamente irresignável aos crimes e às intempéries de quaisquer espécies.

Por isso, uma cena bem marcante do memorável e já antológico longa Batman: O Cavaleiro das Trevas (2008) é exatamente aquela em que o ator Aaron Eckhart caminha à tribuna para assumir identidade que jamais lhe pertencera, a de Homem Morcego.

– A noite é mais escura pouco antes do amanhecer – disse aos espectadores do discurso a fim de aplacar a angústia diante do caos, das mortes e da infinidade de horrores apresentada pela morbidez imperativa do inescrupuloso e anárquico Coringa, brilhantemente emulado por Heath Ledger, que Deus o tenha.

Em suma, as coisas teriam de piorar muito antes de melhorar alguma coisa em meio à barafunda.  

Com o tempo, a hombridade e honradez do promotor foram colocadas à prova, fazendo o ser humano sucumbir quando, lá pelas tantas, o vilão tira sua amada de circulação [não é spoiler dez anos depois!]: a gota d’água para extrair dele a vilania sempre existente, mas que dormira até então. Surge o tirano e desvairado Duas Caras, uma aberração existencial que lida com todas as situações no cara e coroa, à base da sorte... Ou do azar.


Na vida real, por muito menos, as qualidades costumam fugir às mãos de seus detentores de maneira muito mais rápida dando vazão à sordidez intrínseca às nossas sombras. O que define o cerceamento desse ânimo bestial é a própria vontade: há quem consiga freá-lo.

Como Dent, Hildon sentiu o sopro do furor popular a exaltá-lo como paladino; cresceu politicamente esquivando-se das máculas inerentes ao carreirismo eletivo; brindou alianças e angariou gente tanto do bem e do mal, como é praxe dizer hoje em dia, a compor sua administração. Tirou férias, licença, pediu “tempo”, enfim, chame como quiser, mas teve o período (mais que) necessário para espairecer em sua expedição familiar – convalidada pela Câmara de Vereadores – pelos Estados Unidos da América e na própria Europa.

Algumas coisas pioraram bastante, como a história do pagamento de licença-prêmio “numa lapada só” ao procurador José Luiz Storer: bolada de R$ 126.693,15, de acordo com o site Painel Político. Edgar do Boi, do PSDC, chefiou Porto Velho às penumbras, pouco se ouviu falar dele ou de suas ações e isso não é o que se espera de uma gestão que propõe transparência.

Sobre Storer e o pagamento do benefício, podem surgir cinquenta milhões de teses jurídicas dizendo: é legal! Eu, ainda assim, contestaria: mas é imoral pra cacete, vamos e viemos... E cá pra nós, imagine a fila de gente querendo o mesmo e, ao obtê-lo, observando a remuneração a mais diluída em doses homeopáticas e chorosas parcelas miúdas nas contas bancárias já combalidas.

Isso me remete a outra frase tão importante quanto a primeira:

–  Ou você morre herói ou vive o bastante pra ver você mesmo virar vilão 
– ressalta Harvey, antes de tornar-se Duas Caras.

A arte imita a vida, não imita? Mas o desfecho é autônomo, não roteirizado e é bom que haja logo uma postura diferente para que possamos sair da escura madrugada e adentrar ao nascer do sol longe dessa letargia administrativa. 

Autor / Fonte: Vinicius Canova

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