Por Rondoniadinamica
Publicada em 17/06/2019 às 09h48
Porto Velho, RO – Na quinta-feira passada (13), a juíza de Direito Inês Moreira da Costa, da 1ª Vara da Fazenda Pública de Porto Velho, condenou o ex-deputado estadual Airton Pedro Gurgacz, à época diretor do Departamento Estadual de Trânsito de Rondônia (Detran/RO).
Além dele, foram sentenciados também Dionizio Rodrigues Lopes, então diretor executivo do Departamento Administrativo e Financeiro da mesma autarquia; e José Miguel Morheb, o empresário conhecido pela célebre frase: “Propina não é gasto, é investimento”.
Os três foram condenados pela prática de improbidade administrativa.
Por outro lado, a magistrada julgou a ação improcedente em relação a Mário André Calixto e João Maria Sobral de Carvalho (diretor-geral adjunto à ocasião dos fatos narrados), absolvendo a ambos das acusações imputadas pelo Ministério Público (MP/RO).
Cabe recurso.
O MP/RO alegou, a fim de obter a condenação dos envolvidos, que nos meses de outubro e novembro de 2011, na sede do Detran/RO, Airton Gurgacz (diretor-geral), João Maria Sobral de Carvalho (adjunto) e Dionizio Rodrigues Lopes (diretor executivo), agindo em comum acordo mediante a intercedência direta de Mário André Calixto e valendo-se da condição de servidores públicos, patrocinaram interesse privado e ilegítimo do empresário José Miguel Saud Morheb.
A intenção, ainda segundo a acusação, seria conseguir a exoneração do servidor Altamires Teles Monteiro do cargo comissionado de chefe da Divisão de Serviços Gerais.
O motivo da exoneração seria a insatisfação de Morheb com a atuação funcional de Altamires como gestor de contratos de prestação de serviços de conservação, limpeza e manutenção predial então vigentes entre o Detran/RO e as sociedades empresárias Maq-Service Serviços Contínuos Ltda e Contrat Serviços Especializados Ltda.
José Miguel Morheb seria proprietário de fato e de direito da primeira, e proprietário apenas de fato do segundo empreendimento.
Como dito acima, segundo o MP, a arbitrariedade estaria na influência exercida por José Miguel Saud sobre a gestão administrativa, na condição de sócio de empresas que possuíam contratos com a Autarquia.
TERMOS DA DECISÃO
Para a juíza Inês Moreira, os fatos são confirmados mediante provas documental e testemunhal. “A má-fé é inquestionável e está comprovada”, pontuou.
Na visão da magistrada, não é razoável nem proporcional que um servidor público seja exonerado apenas com base em interesses de um particular.
“A alegação de que o cargo é de livre exoneração/nomeação não serve como excludente da má-fé, sendo as provas suficientes para condenar o requerido às sanções previstas em lei”, complementou.
Por isso, na visão dela, o ato praticado pelos requeridos ofendem os princípios da Administração Pública, notadamente os princípios da legalidade, impessoalidade e, sobretudo, moralidade, “uma vez que atender a interesses particulares de empresário certamente viola preceitos éticos que regem a Administração”.
“Por tudo quanto posto, julgam-se parcialmente procedentes os pedidos formulados para condenar AIRTON PEDRO GURGACZ, DIONÍZIO RODRIGUES LOPES e JOSÉ MIGUEL SAUD MORHEB por ato doloso de violação aos princípios da administração pública (art. 11 da Lei 8.429/92) e, consequentemente, imputar-lhes as seguintes sanções previstas no art. 12, III da Lei 8429/92:
a) AIRTON PEDRO GURGACZ e DIONÍZIO RODRIGUES LOPES: cada um deverá realizar o pagamento de multa civil no valor correspondente a 10 vezes a remuneração que percebiam quando ocupavam os cargos de Diretor Geral do DETRAN/RO e Diretor Executivo do Departamento Administrativo e Financeiro do DETRAN, respectivamente, atualização a partir do arbitramento e juros de mora de 0,5% ao mês pelo IPCA-E;
b) JOSÉ MIGUEL SAUD MORHEB: a suspensão de seus direitos políticos pelo prazo de três anos, a proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.
Julga-se improcedente o pedido em relação a Mário André Calixto e João Maria Sobral de Carvalho”, sacramentou.
DIÁLOGOS DA CORRUPÇÃO
“Analisando o conjunto fático probatório é possível concluir que houve a prática de ato de improbidade administrativa (art. 11) pelos seguintes requeridos: JOSÉ MIGUEL SAUD MORHEB, AIRTON PEDRO GURGACZ, e DIONÍZIO RODRIGUES LOPES.
O primeiro ponto que revela a ilegalidade na exoneração de Altamires é o fato de que tanto nas provas documentais quanto nas provas testemunhais não ficou configurada a desídia de Altamires no desempenho de suas funções como servidor público.
Houve justificativas por parte dos réus, no sentido de esclarecer que a exoneração do servidor ocorreu em razão de uma suposta má conduta durante a implantação do novo sistema RENAVAM, em que foi necessário a utilização de geradores, e supostamente Altamires teria deixado de abastecer as máquinas, comprometendo a boa realização do trabalho.
Este fato não é confirmado documentalmente. Pelo contrário. Este fato é negado por CARLOS ANTONIO TRAJANO BORGES, que participou das atividades mencionadas. Ele nega a desídia de Altamires tanto na declaração dada ao MPRO (p. 68, VOL III, mídia digital), quanto em audiência. Afirma que não só não houve falha no funcionamento de gerador, como Altamires teria comprado do próprio bolso o combustível durante final de semana de trabalho. Disse ainda que Altamires nunca teve problema com outros servidores e que não sabe o motivo pelo qual o servidor deixou o cargo, pois sempre desempenhou de maneira satisfatória suas funções.
O segundo ponto que revela a ilegalidade na exoneração é o fato de que Altamires realizou fiscalizações em unidades do DETRAN no interior e constatou a má realização do serviço pela MAQ-SERVICE, de modo que sua atuação foi sentida por parte de Miguel Saud que, insatisfeito, tanto com as exigências do servidor, quanto com a demora na liberação dos contratos, utilizou do seu poder de influência na autarquia.
Este fato é verificado nas transcrições das interceptações telefônicas feitas pela Polícia Federal durante a investigação na Operação Termópilas:
MÁRIO e MIGUEL travam diálogo, no qual este Informa àquele que três processos já estariam prontos para pagamento e dois estariam com o contador.
MIGUEL afirma que os três que estariam "lá em cima" seriam os menores.
MÁRIO diz que está indo para o DETRAN pra ver isso, pois ALTAMIRES estaria mentindo para o pessoal.
MIGUEL sugere a troca do servidor por MNI, que seria competente para o serviço.
MÁRIO afirma que já vai falar com DIONÍZIO
MARIO: Já falei com... Já falei com o nosso amigo, ele falou que vai trocar ele, entendeu? MIGUEL: Bota aquela menina lá de volta, cara.
MARIO: Não, eu vou falar com o Dionísio agora, e isto to terminando de resolve)
MIGUEL: N.A. e outra coisa, ela precisa e ela é boa.
MARIO: ÉJ né?
MIGUEL: Uhum. Faz coisa errada não, ela é do jeito que precisa ser. Beleza?
MARIO: Não, beleza, pode deixar que eu vou falar com pessoal...
MIGUEL: Eu vou... Eu vou pra São Paulo. (...)
Ainda naquela manhã, MIGUEL conta a sua esposa que ALTAMIRES estaria mandando seus últimos e-mails, pois já teria sido realizada reunião que decidira retirar o servidor de seu cargo.
MIGUEL acrescenta que a reunião teria ocorrido com a presença de DIONÍZIO e do "velho", apelido normalmente utilizado para se referirem ao Diretor Geral do DETRAN, AÍRTON GURGACZ. MIGUEL comenta, ainda, sobre mulher que seria colocada no lugar de ALTAMIRES.
DIÁLOGO TEKELINE:
MIGUEL: Alô!
TEKELINE: Oi!
MIGUEL: Amorzinho, o ALTAMIRES está mandando os últimos e-mails dele amor.
TEKELINE: É? ^^
MIGUEL: Já foi feita a reunião agorinha lá. Já era.
TEKELINE: Cara chato né MIGUEL.
MIGUEL: Já era. Se chegar mais algum amor daqui pra de tarde, tu nem responde. TEKELINE: Ta bom.
MIGUEL: (risos)
TEKELINE: (risos) É mesmo, já teve reunião é?
MIGUEL: Já. Chamaram o DIONÍSIO, chamaram todo mundo lá. O VELHO [Airton Gurgacz] mesmo, o cascavel.
TEKELINE: Sim.
MIGUEL: "Eu quero esse cara fora".
TEKELINE: Hã?
MIGUEL: "Ja chama ele e é a fulana, segunda-feira eu quero ela lá sentada na sala".
TEKELINE: Ha...
MIGUEL: Beleza.
Em seguida, MIGUEL entra em contato com mulher usuária de terminal cadastrado em nome de EDICLÉIA, CPF [...], que, de acordo com a PORTARIA N. 1782/GAB/DETRAN-RO, foi dispensada da chefia interina da Seção de Serviços Gerais da Gerência Administrativa do DETRAN, cargo atualmente ocupado por ALTAMIRES.
No diálogo, MIGUEL conta a EDICLÉIA que ela voltaria ao seu cargo anterior na segunda-feira. EDICLÉIA pergunta se foi DIONÍZIO ou Coronel CARVALHO quem determinou sua volta.
MIGUEL responde que foi determinada a saída de ALTAMIRES e o retorno de EDICLÉIA.
DIÁLOGO
EDICLÉIA: Oi!
MIGUEL: Hello!
EDICLÉIA: Oi!
MIGUEL: Segunda-feira a senhora ta lá viu?
EDICLÉIA: Hã?
MIGUEL: No mesmo cantinho.
EDICLÉIA: Pára MIGUEL.
MIGUEL: No mesmo cantinho úmido.
EDICLÉIA: Quem falou pra ti isso? Sr. DIONÍZIO?
MIGUEL: Quem falou?
EDICLÉIA: Coronel CARVALHO?
MIGUEL: Quem falou? Eu fiz foi uma reunião agora cedo lá, acabei com a festa do GORDINHO.
EDICLÉIA: (risos)
MIGUEL: Ele mandou chamar o DIONÍZIO na hora e falou: - Oh, eu quero esse cara fora de lá e a menina segunda-feira de volta.
EDICLÉIA: Falou que me quer de volta?
MIGUEL: Você.
EDICLÉIA: É?
MIGUEL: Uhum.
EDICLÉIA: Meu Deus do céu. Então tá, segunda-feira eu to lá.
MIGUEL: Não comenta com ninguém tá?
EDICLÉIA: Tá eu até fora do DETRAN agora
MIGUEL: Não comenta com ninguém não, porque eu acho que a RENATINHA é meio traíra viu?
EDICLÉIA: Ela é o que?
MIGUEL: Meio traíra
EDICLÉIA: Traíra, tu acha?
MIGUEL: Só um pouquinho, só pouquinho.
EDICLÉIA: É?
MIGUEL: Uhum. Quando tu chegar lá, tu observa tá?
EDICLÉIA: Ta bom, vou observar.
MIGUEL: Quando tu voltar, tu observa.
EDICLÉIA: Ta certo, vou observar. (...)
A reunião e a decisão de exoneração de Altamires é confirmada por Edicleia Bezerra na declaração dada ao MPRO (p. 7, VOL. III, mídia digital):
“Um pouco antes de ser nomeada pela segunda vez para o referido cargo comissionado, eu recebi um telefonema de JOSÉ MIGUEL, no qual ele me informou que havia tido uma reunião com a diretoria do DETRAN e o meu nome havia sido citado para chefiar o setor de Serviços Gerais. Essa ligação que eu me refiro é uma que foi interceptada pela Polícia Federal durante a “Operação Termópilas”.
Quem me deu a notícia de que eu retornaria para a chefia do setor de Serviços Gerais foi o próprio diretor do departamento, o senhor DIONÍZIO. O senhor DIONÍZIO era o diretor do Departamento Administrativo Financeiro do DETRAN, portanto o setor de Serviços Gerais estava subordinado a ele.
A única vez que JOSÉ MIGUEL conversou comigo sobre esse assunto de nomeação para o referido cargo comissionado foi por meio do referido telefonema. No mesmo dia em que o senhor DIONÍZIO me deu a notícia de que eu seria nomeada novamente para a chefia dos Serviços Gerais, antes ele perguntou se eu tinha interesse e eu respondi que sim, porque estava sem receber nenhuma gratificação”.