Por Rondoniadinamica
Publicada em 02/11/2019 às 10h33
Porto Velho, RO – O assunto precisa ser tratado com a seriedade que merece, mas, ao mesmo tempo, conservando a responsabilidade ético-jornalística voltada a conceitos basilares do direito, a exemplo do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal.
As cartas expostas à mesa até agora denotam, sim, que ao menos um delegado da Polícia Civil de Rondônia (PC/RO), supostamente Júlio César de Souza Ferreira, confessara a colegas eventuais falhas graves no âmbito da Operação Pau Oco. Falhas estas que teriam atingindo um ex-governador sem a mínima necessidade. Falhas, conscientes ou não, que teriam levado o Judiciário a erro.
O delegado-geral da instituição Samir Fouad Abboud disse à SIC TV, afiliada da Rede Record, que é preciso contextualizar as falas a fim de chegar à realidade dos fatos. Antes, obviamente, as declarações proferidas na seara cibernética precisam passar por perícia técnica para que a autoria seja definida de maneira indubitável.
Porém, e isso é inegável, é preciso desde já levantar todos os questionamentos possíveis acerca do tema reverberado irremediavelmente nos meandros da sociedade rondoniense.
O primeiro deles é simples: o povo está sujeito a abusos reiterados conflagrados por determinadas células do Estado que deveriam cumprir à risca os dispositivos legais pátrios? Vale tudo para comemorar prisões e apreensões deliberadas empunhando como troféu a subsequente destruição da reputação de pessoas possivelmente inocentes?
É importante frisar que o ex-delegado-geral Eliseu Muller identificou a voz nos áudios circulados pelas redes sociais e através da imprensa: “É a voz do Júlio César”.
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‘‘É a voz do Júlio César’’, diz ex-delegado-geral da Polícia Civil sobre áudios vazados da Pau Oco
Se isso ficar comprovado, e a declaração de Muller é bastante sintomática, será a primeira vez na história de Rondônia em que um delegado é flagrado ameaçando o presidente do Tribunal de Justiça (TJ/RO), ofendendo um colega de profissão, ou seja, o próprio Muller, acusado pelo autor do áudio de embolsar dinheiro de rifa, e, ainda, apresentando dados contundentes acerca de diligências ilegais eventualmente patrocinadas pela própria equipe.
Em decorrência dessas questões, ainda há trecho específico na nota pública expedida pela PC/RO em nome do delegado-geral.
“A Polícia Judiciária Civil do Estado de Rondônia não é um órgão político [...]”.
De fato não é, mas foi tratado como se fosse – e de dentro para fora: endógeno, como diria o possível delegado desnudado pelos vazamentos.
Ainda sobre o presidente do TJ/RO, ouve-se claramente que o hipotético membro da instituição detinha nítidas intenções de engessar os poderes de Walter Waltenberg Silva Junior, embora não tenha descrito quais seriam esses poderes, usando o delegado-geral, uma “emenda diabólica” e o Legislativo como trampolins para cumprir a finalidade aventada – e isso é política.
Exatamente por esses e outros pontos é que a nota de esclarecimento soa muito mais como de pesar. É de se lamentar a postura beligerante, especialmente porquanto não se identificam pontos de autocrítica nas justificativas expostas à população, à exceção de parágrafo solitário onde Abboud discorre acerca das possíveis sanções ao fim da apuração interna relacionada às denúncias.
O Rondônia Dinâmica também discorda veementemente sobre a utilização da assertiva “exposição desnecessária colocando em dúvida a moralidade da instituição e de qualquer de seus integrantes”.
As instituições são do tamanho de seus representantes, vez que não corpóreas e completamente inanimadas: quem dá vida e respeitabilidade a elas são justamente aqueles que trabalham e desempenham suas funções de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro, sem firulas, sem excessos e sem segundas ou terceiras intenções. A grande maioria age assim; entretanto as ervas daninhas criam fissuras incalculáveis no todo.
A crítica bem fundamentada é salutar à democracia e os expoentes de quaisquer cadeias institucionais conseguem reconhecê-las e aplicá-las no cotidiano.
Pode-se culpar a imprensa. Pode-se culpar a sociedade. Pode-se culpar quem quer que seja. Mas o resvalo da Pau Oco e as sequelas absorvidas pela PC/RO, pelo que se sabe até agora, tratam-se de implosão, não de explosão.
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