Por Rondoniadinamica
Publicada em 15/01/2020 às 09h24
Médico disse ter encaminhado 12 solicitações à SESAU/RO, hoje sob gestão de Fernando Máximo (foto). Nenhuma delas teria sido atendida / Reprodução
Porto Velho, RO — O professor universitário e advogado Vinícius Miguel encaminhou ao Ministério Público do Estado (MP/RO) e também à Corte de Contas (TCE/RO) uma denúncia formulada a partir de relatos traçados pelo médico urologista Alessandro Prudente, depoimentos de outros profissionais da área, além de pacientes da Capital e do interior.
Os relatos, na realidade, compuseram memorando enviado diretamente em nome do atual secretário de Saúde, Fernando Rodrigues Máximo, nomeado pelo governador Coronel Marcos Rocha (PSL) no início do mandato, logo em janeiro de 2019 quando o militar assumiu sua nova função no Palácio Rio Madeira como mandatário-mor do Executivo estadual.
O Rondônia Dinâmica obteve com exclusividade o teor da denúncia e do memorando na íntegra, e os disponibiliza aos leitores ao final da reportagem.
Transplantes renais
Os dados apresentados por Prudente e ressoados através da denúncia de Miguel contrastam sobremaneira com a propaganda institucional otimista saída especialmente do setor de Comunicação do Estado de Rondônia quando o assunto são os transplantes renais.
No começo desta semana, por exemplo, exatamente na segunda-feira (13), a página oficial da Secretaria de Estado da Saúde (SESAU/RO) veiculou a seguinte reportagem:
Transplante de rins e córneas avançam na saúde pública de Rondônia em 2019
No texto é informado, entre outras coisas, o seguinte:
" Dos 109 transplantes, 18 foram de rins, um percentual maior do que em 2018, que foram 12 transplantes renais".
Demissão via memorando
Embora os números sejam reais, de fato, a insatisfação do profissional até então responsável pela Coordenação do Programa de Transplante Renal, também incumbido tecnicamente, fez com que entregasse o cargo no começo de 2020.
Por que Prudente pediu para sair? Antes de dizer, ele elencou série de problemas relacionados aos transplantes renais, quais sejam:
"[...] No entanto, deve-se destacar que algumas dificuldades vêm nos acompanhando ao longo de, praticamente, toda essa jornada:
1. Enfermaria com estrutura e dimensionamento inapropriado para o cuidado de paciente imunossuprimido;
2. Irregularidade recorrente na oferta de exames complementares específicos e estratégicos: PCR de CMV, dosagem de tacrolimo, biópsia renal, USG doppler, sorologia para Epstein barr, entre outros.
3. Irregularidade recorrente no fornecimento de insumos e medicamentos: saco plástico estéril, soro com invólucro, kits para máquina de perfusão, solução de preservação de órgãos, alguns imunossupressores, valganciclovir (medicamento para tratamento de infecção por CMV), rituximab (medicamento para rejeição) e, eventualmente, até medicamentos de rotina do hospital como alguns analgésicos e antibióticos.
4. Quadro de recursos humanos insuficiente: destacam-se insuficiente número de médico nefrologista/clínico, enfermeiro, técnico de enfermagem, entre outros.
5. Materiais e equipamentos inadequados, insuficientes ou desgastados no centro cirúrgico: como exemplo pode-se citar os afastadores cirúrgicos, caixa de instrumental cirúrgico, os fios de sutura, os materiais descartáveis e permanentes da laparoscopia, entre outros. [...]".
Em seguida, na parte mais séria da documentação, Prudente relaciona 12 solicitações encaminhadas à atual gestão, deixando claro que todas elas não foram atendidas e, por conta disso, entregou o cargo na Coordenação de Transplantes Renais.
O médico deixou claro que a maioria dessas solicitações "está protocolada no sistema SEI" e se colocou à disposição da pasta responsável para passar os números dos processos para conferência de dados.
Vinícius Miguel diz em denúncia que representantes da SESAU/RO mentem sobre dados / Foto: Rondônia Dinâmica
Risco
Já na comunicação de Vinícius Miguel aos órgãos de fiscalização e controle, as considerações são mais enfáticas:
"A situação vem se agravando e a SESAU/RO vem aumentando seu estoque de inverdades. Alega, por exemplo, "irregularidades" em aquisições. Não diz quais as irregularidades, nem em quais aquisições. Não adota medidas emergenciais, uma vez que há risco de vida de pacientes".
Em seguida, o advogado anotou:
"Não apresenta qualquer documento/ato administrativo hábil a comprovar a suspensão de processos ou a instauração de sindicância para apurar as ditas irregularidades. Marque-se que o sistema de transplantes gera recursos diretos do SUS ao Estado e a interrupção implicará na perda de tais valores".
A redação tentou contato com a SESAU/RO, mas não obteve êxito. O espaço está aberto para eventuais esclarecimentos.
Confira os pedidos de Vinícius Miguel e, logo abaixo, a íntegra do memorando de demissão do médico Alessandro Prudente e o conteúdo completo da denúncia do professor ao MP/RO e ao TCE/RO.
" Em caráter de urgência, considerando os fatos trazidos e a precária condição de saúde dos usuários, solicita a apuração e determinação de medidas para que o Estado não interrompa os transplantes.
Ainda:
Isso exposto, requer, com urgência, a adoção de medidas com vistas à obrigar o Estado de Rondônia à proceder com melhorias no sistema de transplantes renais,
Que sejam adotadas formas de obrigar o Estado de Rondônia, sob pena de multas diárias, à impedir a interrupção do funcionamento da unidade de transplantes renais,
Que seja estruturado um grupo de trabalho interdisciplinar e interinstitucional com vistas ao permanente monitoramento da efetividade e da eficiência da política pública de transplantes renais, contando com Universidade, usuários e familiares.
Que, ao final da regularização dos serviços públicos de saúde atinentes aos transplantes renais, que sejam apuradas as responsabilidades do desmonte negatório de direitos pela Gestão da Pasta Estadual de Saúde.
Vinicius Valentin Raduan Miguel".
MEMORANDO
DENÚNCIA