Por France Presse
Publicada em 30/06/2020 às 16h24
Na Índia, um exército de agentes sociais da saúde enfrenta a desconfiança e o risco de contágio para identificar os casos de novo coronavírus entre os mais pobres. São quase um milhão de mulheres voluntárias, chamadas ASHA, pelas iniciais em inglês de "Accredited Social Health Activists".
São ativistas da saúde que atuam em cidades e vilarejos do país para fornecer cuidados básicos, como vacinas ou partos.
Estão agora na linha de frente na luta contra a Covid-19. A pandemia de coronavírus tem provocado estragos no segundo país mais populoso do planeta, que já contabiliza mais de meio milhão de casos.
"Nossos chefes nos dão ordens por telefone a partir do conforto de suas casas ou escritórios. Sacrificamos a vida de nossas famílias para educar e ajudar as pessoas", disse à AFP Alka, uma voluntária de 32 anos que pediu para ser identificada apenas pela seu primeiro nome.
Com outras "irmãs" deste programa governamental que existe há cerca de 15 anos, "somos as verdadeiras heroínas" da luta contra o coronavírus, afirma.
Assédio e agressões
Protegida apenas com um pano, Alka diz que frequentemente encontra residentes irritados com a gestão da crise pelo governo do primeiro-ministro Narendra Modi.
Durante uma recente visita a um vilarejo do estado de Uttar Pradesh, Alka e dois colegas acabaram cercadas por oito homens, que exigiam comida e equipamentos de proteção contra o vírus. "Nós não recebemos equipamentos. Onde vamos pegá-los para vocês?", ela respondeu, encerrando a situação.
Mas o assédio moral às vezes resulta em agressão. "Recentemente, os moradores rasgaram as roupas de uma mulher enquanto ela trabalhava", diz Alka.
Ela e suas colegas vão de casa em casa para pedir aos ocupantes que preencham um questionário sobre os possíveis sintomas do novo coronavírus e seu histórico de deslocamento. Se uma pessoa parece doente com Covid-19, será notificada às autoridades.
"Sou ASHA há 14 anos e nunca tive tanto medo de bater em uma porta com as mãos. Não temos luvas, nem mesmo máscaras", diz Alka.
Devido à falta de rastreamento de contatos na Índia, a ASHA é um dos "elementos vitais" para conter o coronavírus no país de 1,3 bilhão de habitantes, porque elas conhecem bem as comunidades onde operam, explica Anant Bhan, especialista em saúde pública.
Poucos recursos
O trabalho é duro e mal remunerado (de 23 a 70 euros por mês), apesar do "bônus coronavírus" de 12 euros. Com o salário, Alka cobre as despesas do marido, que desaprova o emprego e a insulta, e de seus três filhos.
Ela tem que pagar pelas viagens de e para as comunidades que ajuda. E às vezes trabalha com muito poucos recursos.
Durante uma viagem à vila de Bahadarpur, usou cola caseira feita de farinha para colar um cartaz em uma casa, explicando a importância da lavagem das mãos e recomendando gestos de barreira contra o vírus.
"A cola no cartaz não se sustenta bem", explica, "e se eu tiver que usar uma rúpia do meu salário para comprá-la, isso criará um buraco no meu orçamento".
Os conselhos da ASHA — usar máscara e isolar-se em caso de sintomas — tendem a ser mal recebidos, especialmente em comunidades pobres.
"Ficarei em casa se você garantir que meus filhos não vão morrer de fome", disse um homem durante uma visita recente acompanhada por uma equipe da AFP.