Por RFI
Publicada em 18/07/2020 às 09h30
Para saber os impactos econômicos da crise sanitária na vida dos estudantes de Coimbra, por exemplo, a Associação de Pesquisadores e Estudantes Brasileiros (APEB) da conhecida cidade universitária portuguesa fez, em abril, uma pesquisa com 206 pessoas. O conjunto dos resultados “nos assustou”, revela Rafael Firpo, presidente da entidade.
Do total de brasileiros que participaram da pesquisa da APEB, 59,2% falaram que a desvalorização do real face ao euro poderia fazer com que eles abandonassem a universidade. Já 26,2% disseram que talvez deixassem a universidade por causa disso. Somente 14,6% responderam que a variação cambial não lhes causaria impacto financeiro, não sendo, portanto, empecilho para continuarem com a vida acadêmica. No começo de janeiro, o euro valia R$ 4,50. Em maio, chegou a R$ 6,38.
De acordo com o último relatório de Indicadores de Integração de Imigrantes do Observatório das Migrações, publicado em dezembro passado, os brasileiros são maioria entre os estudantes estrangeiros matriculados nas universidades portuguesas. Somam 16.125, o que corresponde a 38,4% do total de alunos internacionais no ensino superior português.
Muitos desses alunos, que costumavam trabalhar para conseguir pagar as mensalidades, o aluguel, a alimentação e outras despesas, sentiram o impacto da pandemia do novo coronavírus. Thiago Melo, por exemplo, perdeu o emprego. Para poder se manter em Portugal, trabalhava como ajudante de cozinha num restaurante de um shopping center, fechado assim que o governo português decretou estado de emergência no país.
“Naquele momento, o meu sentimento era de pânico, de medo mesmo, de preocupação porque o dinheiro que eu tinha era suficiente, apenas, para o próximo mês de abril. E eu não teria outra opção senão voltar para o Brasil”, conta
Melo havia chegado de Brasília ano passado para fazer mestrado em Ciências da Comunicação na Universidade do Minho, localizada na cidade de Braga. A decisão de tomar o caminho de volta também foi motivada pelo câmbio. “Eu sabia que mesmo que eu tivesse ajuda dos meus pais, da minha família daqui do Brasil, quando esse dinheiro chegasse em Portugal não seria muito”, explica.
Em Brasília desde meados de abril, Thiago não parou de estudar, graças à universidade que manteve os cursos em regime de ensino à distância até o final de junho. Também não perdeu a esperança de retomar a vida acadêmica em Portugal.
“Eu estou fazendo alguns freelas na minha área de formação, eu tenho escrito para alguns blogs, feito alguns artigos, e tentado juntar um dinheiro, economizar para, em setembro, retornar a Portugal e continuar o meu mestrado”, diz com otimismo.
'Eu pensei muito em desistir'
A brasileira Camila Dutra sempre quis morar e estudar fora do Brasil. Também cursa o mestrado em Ciências da Comunicação da Universidade do Minho. Para não gastar as economias que trouxe do Brasil, ela fazia trabalhos de meio período em restaurantes, além de um estágio remunerado na Biblioteca Pública de Braga, onde integrava a equipe responsável por cuidar do acervo. A mineira de Belo Horizonte, contudo, logo sentiu o impacto da pandemia de Covid - 19 quando ficou sem trabalho.
“Foram três meses sem entrar um euro na conta. Só sai, não entra. Eu tinha essas economias, o que me manteve, mas, inicialmente, foi muito assustador. Eu fiquei com medo dos recursos acabarem. Eu pensei muito, muito, muito em desistir”, lembra.
Camila não desistiu e conseguiu permanecer em Portugal. Com o fim do confinamento, voltou a trabalhar na Biblioteca Pública de Braga. “Então, a ideia é manter este sonho, ficar aqui”.
Resposta aos apelos
Diferentemente dos brasileiros que moram, estudam e trabalham em cidades como Braga, Lisboa ou Porto para se manter, muitos dos estudantes de Coimbra contam financeiramente com a família, explica Rafael Firpo, presidente da Associação de Pesquisadores e Estudantes Brasileiros (APEB) em Coimbra. A desvalorização do real face ao euro gerou, portanto, um impacto negativo na vida de muitos alunos, principalmente no que diz respeito ao pagamento das mensalidades, chamadas de propinas aqui em Portugal.
Segundo Firpo, a Associação recebeu muitos pedidos das famílias de estudantes “implorando para que nós pudéssemos intervir juntamente com a universidade”. Procurada pela APEB, a Universidade de Coimbra, onde estudam quase 3 mil brasileiros, deu respostas.
“No ato de inscrição da matrícula, a partir do segundo ano do estudante internacional, [haverá] a eliminação do pagamento de três propinas”. Pelas contas de Rafael Firpo, a alternativa proposta representa uma economia de € 2.100. “Uma sobrevida aos estudantes internacionais, que já pensavam em desistir”, ressalta.