Por O Eco
Publicada em 22/12/2020 às 09h54
O Ministério do Meio Ambiente (MMA) omitiu do comitê gestor do Fundo Clima a informação sobre o impedimento fiscal do governo de Rondônia para receber recursos não reembolsáveis para o projeto Lixão Zero, que visa eliminar 11 lixões no estado. O custo total do projeto, R$ 12 milhões, será dividido meio a meio entre o Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA) e o Fundo Clima.
Sem a informação sobre as pendências fiscais do governo de Rondônia com a União, os representantes das quatro confederações empresariais no colegiado do Fundo Clima juntaram-se aos membros do governo, aprovando por dez votos a um a liberação de R$ 6,2 milhões (orçamento total do fundo em 2020) para o projeto. Apenas um integrante votou contra a proposta – a representante titular do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas (FBMC) no colegiado, a advogada Flávia Frangetto, consultora em direito ambiental e clima.
No dia 15 de dezembro, o MMA aceitou o Consórcio Intermunicipal da Região Centro Leste do Estado de Rondônia (Cimcero) como substituto do governo estadual na execução do projeto Lixão Zero, que visa eliminar 11 lixões que recebem resíduos de 15 cidades rondonienses.
Para ratificar a escolha, o MMA convocou reunião virtual extraordinária do comitê gestor do Fundo Clima para esta terça-feira, 22 de dezembro, às 10h30. O encontro terá duração de meia hora e apenas um ponto de pauta: aprovar a sugestão do governo de Rondônia para ser substituído como executor da proposta pelo Cimcero, formado por 44 cidades, incluindo quatro que tiveram seus prefeitos presos na operação Reciclagem, deflagrada em 25 de setembro passado. Um deles é a prefeita de São Francisco do Guaporé, Gislaine Clemente (MDB), conhecida como Lebrinha, que estava no segundo mandato como presidente do Cimcero quando foi presa.
O MMA também omitiu a informação sobre a presidente do Cimcero dos membros do colegiado do Fundo Clima. A operação Reciclagem foi realizada conjuntamente entre Ministério Público do estado (MP-RO) e a Polícia Federal (PF). Durante dez meses, foi investigado um esquema em que os prefeitos de Ji-Paraná, Rolim de Moura, Cacoal e São Francisco do Guaporé foram filmados recebendo grande volume de dinheiro ilícito de um dos principais empresários do setor de resíduos sólidos no estado. Um dos quatro prefeitos presos, Luiz Ademir Schock (PSDB), prefeito de Rolim de Moura, foi o segundo vice-presidente na diretoria do Cimcero no mandato 2017-2018, também liderado por Lebrinha.
As gravações foram previamente combinadas entre a PF e o empresário, que se tornou delator do esquema. Segundo o MP-RO, os prefeitos cobravam do empresário o pagamento de propina para liberar o acerto de dívidas referentes ao serviço de coleta e destinação do lixo. Com a prisão de Lebrinha, Luiz Brito (MDB), prefeito de Parecis, foi escolhido como presidente do consórcio. A sentença judicial que autorizou as prisões foi obtida pelo jornal em tempo real Rondônia Agora e pode ser consultada aqui. O desembargador Roosevelt Queiroz Costa, do Tribunal de Justiça de Rondônia (TJ-RO) concedeu em 25 de novembro prisão domiciliar aos quatro prefeitos presos.
Revelações
Em reunião virtual promovida na última sexta-feira pelo Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas (FBMC), Rafael Torino, diretor do departamento de fundos de meio ambiente (DFMA/MMA), revelou detalhes sobre a troca do executor do projeto que eram desconhecidos pelo FBMC e os representantes no colegiado das Confederações Nacionais do Comércio (CNC) e do Transporte (CNT). O esclarecimento literal de Torino foi o seguinte:
“Queria só fazer um adendo para não parecer que a gente se aventurou em algo que não foi pensado. Nós já sabíamos que o estado de Rondônia estava com problema no CAUC. Já havíamos enviado para eles um ofício em setembro informando que essa situação seria um impeditivo. Porém, o estado já obteve uma liminar no Supremo Tribunal Federal no ano retrasado, se não estou enganado, que lhe permitiu assinar convênios com a União. Eles insistiram que poderiam repetir essa fórmula, que iriam entrar de novo com essa ação e que o projeto não seria comprometido. Então, demos a eles uma oportunidade de poder seguir esse prazo até concluirmos que isso não seria possível. Mas, em tempo hábil, estamos trazendo uma alternativa.”
Os membros do MMA no colegiado do Fundo Clima não informaram os demais integrantes do comitê sobre a situação impeditiva de Rondônia para receber os recursos do mecanismo. Pelo menos não há nenhuma menção a esta situação na ata da reunião de 22 de outubro. Também não houve pré-análise das pendências fiscais do estado com a União antes da reunião do conselho deliberativo do FNMA ocorrida em 15 de julho passado, quando foi aprovada a liberação da primeira metade do valor total do projeto, R$ 6,2 milhões.
Aliás, o plano original de alocação de recursos para o projeto de Rondônia não previa o repasse de dinheiro do Fundo Clima, conforme atesta a ata do encontro, obtida pelo ((o))eco por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI). Veja relato sobre esse encontro no box.
Outro procedimento suspeito foi a substituição do proponente do projeto sem que tivesse havido análise da capacidade técnica e econômica do Cimcero para executá-lo, nem anuência dos colegiados do FNMC e do Fundo Clima. Nem foi incluída na Plataforma +Brasil uma nota de esclarecimento sobre a relação entre o Cimcero e a operação Reciclagem do MP-RO e da PF. Para tentar tranquilizar os participantes da reunião do FBMC, Torino contou que o consórcio não possui débitos inscritos na dívida ativa da União nem no Cadin (cadastro de débitos não quitados com a administração pública federal).