Por Rondoniadinamica
Publicada em 06/02/2021 às 09h37
Porto Velho, RO – Quando o comediante Paulinho Serra ainda pertencia ao coletivo Deznecessários, e lá se vai mais de uma década, interpretava um personagem completamente avesso aos ditames da era do politicamente correto, mais conhecida como hoje: o traficante gay.
O traficante gay era uma composição de trejeitos jocosos onde o ator somava a malemolência da bandidagem com exageros vocais entoando gírias de malandro e acessos intermitentes de afetação afeminada.
Paulinho Serra como "O Traficante Gay" / Reprodução
Em Rondônia, a Operação Sniper, desencadeada no decorrer desta semana pela Polícia Federal (PF), encontrou outro arquétipo cômico que poderia servir de inspiração para uma nova formatação do personagem aposentado de Serra: o traficante burro.
Aliás, os traficantes, no plural.
Ou, melhor dizendo, como estamos falando de “meninos” ricos, de boa procedência, de berço, com as melhores relações na high society, alguns inclusive usados como exemplo de empreendedorismo nas capas das revistas jet-set, o termo correto seria: empresários. É, é o que são.
Empresários...
...do crime.
Com teias de comercialização, inclusive.
A galerinha do barulho tirou onda no celular falando abertamente no WhatsApp sobre compra e venda de entorpecentes.
A situação é tão avacalhada que o distribuidor atende às demandas já dizendo:
– Doce burgers, boa noite!
Sobre a expressão, a PF esclarece:
“Como já dissemos anteriormente, o uso de palavras como “doce”, “bala”, “balita” e outros”, pontua o inquérito, serve para designar as drogas de espectro sintético.
Traficante burro se "entrega" nas redes sociais e é interceptado pela PF / Reprodução
Um dos investigados conserva armamento tão pesado que, pelas fotos arroladas nos autos, o leitor da peça tem a nítida impressão de que o sujeito está se preparando para alguma guerra. Guerra nuclear.
E os playboys se deleitam com a inanição e a letargia do poder público quando a nata da gatunice promove a fanfarra cibernética, enchendo a lata de maconha, fazendo pose com drogas, espalhando as imagens para os amigos de balada e colegas de ofício obtuso.
Acusado tinha armamento pesado - e sem registro - segundo a PF / Reprodução
Geralmente, são filhos de alguém. Ou conhecem alguém que conhece alguém.
Por isso é muito difícil vê-los na cadeia. Cadeia pesada.
Em Pedras que Cantam, Fagner entoa: “Quem é rico mora na praia, mas quem trabalha nem tem onde morar”. Adaptando ao mundo jurídico, quem é rico chega ao Supremo Tribunal Federal (STF), mas quem trabalha mal vai ao Tribunal de Justiça (TJ/RO) e olhe lá.
Enfim, os pobres garotos festeiros são bastante ignorantes, não há dúvidas. A pior sentença que cada um deles poderia receber seria prisão perpétua ao assento da escola a fim de que no mínimo passem a conservar o domínio do vernáculo pátrio porque é doído de ler a troca de mensagens.
Tem até meme no inquérito: "Alguém pediu maconha?" / Reprodução
A redação, inclusive, se solidariza com os agentes que fizeram a confecção do ato investigatório oficial, porque para compreender e transcrever o dialeto paralelo da turba apedeuta, olha, haja paciência!
E é compreensível que eles, os “empresários”, vejam o Estado de Rondônia como um grande faroeste, terra sem lei, lugar onde mandam e desmandam. Há o exemplo do pederasta, condenado por armazenar pornografia infantil, filho de político, bem relacionado, que hoje, livre, leve e solto, posta opiniões políticas no Facebook como se a vida pregressa não valesse de nada.
A Internet o chamaria de alecrim dourado. Mas um alecrim dourado que gosta de crianças, diga-se de passagem.
Escorada na concepção desse tipo de impunidade, própria da burguesia contemporânea, a turma se jogou num tabuleiro violento e recheado de ilícitos imaginando que a patota jamais iria ao chão.
Foi.
Agora, para mantê-la na lona, a Justiça precisa voltar à cegueira teórica em vez de levantar a venda para dar uma espiadinha e aliviar, como tem ocorrido em casos semelhantes.
Sim, os traficantes são burros, porém privilegiados. E o que a grana não previne, pode, talvez, remediar.