Por Notícia ao Minuto - Portugal
Publicada em 11/02/2021 às 16h25
Ao encerrar dois dias de interpelação ao Governo sobre a situação da segurança, o Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV, oposição) chamou o "caso" de Alex Saab à sessão parlamentar, aproveitando a presença do ministro da Administração Interna, Paulo Rocha, face às denúncias da defesa, que critica as condições de detenção, na ilha do Sal, do empresário e 'enviado especial' da Venezuela.
"Qual é o estado da avaliação deste caso? Que garantia está a ser dada a esta figura", questionou Rui Semedo, líder parlamentar do PAICV, interrogando ainda o Governo sobre se Alex Saab está a ter "acesso livre" aos advogados de defesa, comunicação com a família e cuidados de saúde, por se tratar de um doente oncológico, detido desde junho de 2020 e em prisão preventiva desde final de janeiro.
"Deixo este questionamento porque se o senhor Alex Saab tiver um contratempo por falta de cuidados do Estado de Cabo Verde, poderemos vir a ter problemas muito graves", afirmou Rui Semedo.
O ministro da Administração Interna respondeu tratar-se de um caso da alçada dos tribunais.
"Não sei porque é que não perguntaram aos tribunais. É um indivíduo que está preso, isto não tem nada a ver com o Governo. Saiu da prisão foi posto em prisão domiciliária, está sob a guarda da Polícia, que cumpre com todas as determinações da Justiça", afirmou Paulo Rocha.
Num período de forte crispação política, com o aproximar de eleições legislativas em Cabo Verde, convocadas para 18 de abril, o governante devolveu as acusações.
"Pergunta-se, se fosse o PAICV no Governo, se se tomaria uma atitude diferente, se neutralizaria os tribunais e se assumiria o caso. A que troco de quê esta defesa, senhor deputado", acusou.
A defesa de Alex Saab denunciou em 04 de fevereiro que o empresário colombiano está em "condições ultrajantes" em prisão domiciliária e que a sua equipa de segurança é detida diariamente pela polícia cabo-verdiana.
Em comunicado enviado à Lusa, a defesa do empresário, liderada pelo antigo juiz espanhol Baltasar Garzón, recordava que Alex Saab, foi transferido do estabelecimento prisional do Sal, onde se encontrava detido desde junho, para um local onde foi colocado em prisão domiciliária, na mesma ilha, mas em condições "completamente irregulares" que "continuam a afetar diretamente a sua saúde e o seu direito à defesa".
"São significativamente piores do que as anteriormente concedidas a traficantes de droga condenados em Cabo Verde. O embaixador está cercado por soldados e agentes da polícia que vivem ao lado e o vigiam 24 horas por dia, sete dias por semana. Estes soldados transportam metralhadoras mesmo quando entregam as suas refeições", denunciou a defesa.
A nota acrescentou, sobre a comunicação com os seus advogados e familiares, que "as condições são mais restritas do que as que Cabo Verde historicamente disponibilizou a criminosos condenados".
Alex Saab, de 49 anos, foi detido em 12 de junho pela Interpol e pelas autoridades cabo-verdianas, durante uma escala técnica no Aeroporto Internacional Amílcar Cabral, na ilha do Sal, com base num mandado de captura internacional emitido pelos Estados Unidos da América (EUA), quando regressava de uma viagem ao Irão em representação da Venezuela.
O Tribunal da Relação do Barlavento já decidiu por duas vezes -- a última das quais em janeiro, ambas com recurso da defesa -- pela extradição de Alex Saab para os EUA.
O Governo da Venezuela exige a libertação de Alex Saab, garantindo que aquando da detenção no Sal possuía imunidade diplomática, pelo que Cabo Verde não podia ter permitido este processo.
Na lista das "irregularidades" apontadas, a defesa sublinhou o facto de os advogados não poderem ter "comunicações privilegiadas" com o cliente e que os "membros da equipa de segurança do embaixador Saab", que "está a monitorizar a atividade dos soldados e da polícia", são "detidos todos os dias com base na premissa de verificação da identidade".
"O único telefone que ele pode usar é o da polícia, que deve estar presente durante as duas horas de uso permitido, para monitorizar as conversas do embaixador", acrescentou a defesa, recordando que até hoje todos os pedidos para seja visto por médicos especialistas da "sua escolha" ficaram "sem resposta", apesar de ser doente oncológico.
Condições que a defesa não tem dúvidas em classificar como "ultrajantes": "Tudo isto não é apenas um desafio direto à ordem unânime vinculativa de 02 de dezembro de 2020 do Tribunal de Justiça da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), é também contrário a todos os padrões aceites de prisão domiciliária por uma pessoa não condenada e, certamente, inaceitável para um agente diplomático".
Neste processo, os EUA, que pedem a extradição do colombiano, acusam Alex Saab de ter branqueado 350 milhões de dólares (295 milhões de euros) para pagar atos de corrupção do Presidente venezuelano, Nicolás Maduro, através do sistema financeiro norte-americano.
Em entrevista por escrito à Lusa, a partir da cadeia, em 08 de janeiro, o colombiano afirmou que é "inocente" das acusações dos EUA, classificando como "ridículo" que seja apontado como testa-de-ferro de Nicolás Maduro.
"Posso dizer categoricamente: sim, sou inocente", afirmou Alex Saab.