Por RFI
Publicada em 26/04/2021 às 15h13
A situação da saúde está piorando na Índia: a pandemia vive uma dinâmica exponencial em um país cuja população chega a 1,3 bilhão de pessoas. No domingo, as autoridades indianas anunciaram cerca de 350 mil novos casos, o que representa o quarto recorde consecutivo de infecções. No entanto, o primeiro-ministro Narendra Modi tem apenas uma prioridade em mente: vencer as eleições, estima Jean-Joseph Boillot, economista e especialista em Índia. Ele compara o premiê indiano ao presidente Jair Bolsonaro, ambos com péssimos resultados durante a pandemia.
A Índia soma 17 milhões de casos, quase 200.000 mortes, além de colapso em hospitais em várias cidades. Vários países se mobilizam para ajudar os indianos: Alemanha, Reino Unido, França, Estados Unidos. Londres e Paris prometeram "respiradores" artificiais. A União Europeia, através do Mecanismo Europeu de Proteção Civil, enviará equipas nos próximos dias ao país. Washington não prometeu o envio de vacinas diretamente, mas disse que enviará "componentes" para a sua produção.
Em meio a essa situação crítica, o país está no meio do ciclo eleitoral, quando serão eleitos governadores de cinco regiões, onde vivem 187,2 milhões de pessoas. Dada a dimensão do país, a votação é feita por etapas, por distritos, em dias distintos, concentrando-se em áreas limitadas tanto as forças de segurança como as autoridades eleitorais.
Segundo o economista e especialista em Índia, Jean-Joseph Boillot, a principal preocupação do primeiro-ministro, Narendra Modi, é a vitória de seu partido, o BJP, nessas eleições. "Desde o retorno à 'normalidade', Narendra Modi pensa em apenas uma coisa: eleições, eleições, eleições. Portanto, não houve preparação. Mesmo em termos de vacinação, estou muito surpreso ao descobrir que menos de 5% da população indiana recebeu as duas doses", diz Boillot.
"Para quem vem falando da 'diplomacia de vacinas' desde junho passado, isso é nojento para os indianos. Muitos dos meus amigos estão morrendo. Há pânico, há uma catástrofe cuja principal responsabilidade, como no Brasil de Jair Bolsonaro, está ligada, na Índia, a Narendra Modi e aos fundamentalistas nacionalistas hindus", avalia o economista francês.
Boillot afirma não saber se o regime hindu estaria à deriva. "De qualquer forma, é surpreendente que continuemos a considerar as estimativas oficiais, pois sabemos que o número de casos deve ser multiplicado por 30 para conhecermos os números reais. Em outras palavras, vários milhões de indianos, todos os dias, são atingidos por essa nova onda da pandemia. Sim, existe má gestão", calcula Boillot.
"Indignação nas redes sociais não significa descrédito eleitoral"
A região de Bengala ocidental foi gravemente afetada pela Covid-19. No entanto, o primeiro-ministro Narendra Modi insiste em organizar gigantescos comícios eleitorais para obter a vitória nas eleições regionais, cruciais para seu partido. Mas Jean-Joseph Boillot afirma não acreditar que o premiê indiano corra o risco de que essa negligência se volte contra ele nas urnas.
"O fato de haver um fenômeno de revolta e indignação nas redes sociais não significa necessariamente que haverá descrédito eleitoral. Duas condições são necessárias para isso. A primeira é que exista uma alternativa política. No entanto, a provável vitória do partido hindu BJP em Bengala Ocidental é explicada pela divisão dos partidos de oposição. E é o mesmo no resto da Índia: não há alternativa real e nenhuma capacidade para os partidos da oposição se unirem sob seu comando", analisa.
Para que isso acontecesse, segundo o economista francês, seria necessário um grande movimento de revolta da juventude indiana. "Poderia funcionar, essa ideia de sanção através das urnas, se realmente houvesse uma energia, uma força, principalmente entre os jovens indianos. Porém, há sim um fenômeno de desespero, que vem acompanhado de outro fenômeno, conhecido nas tomadas de poder por regimes neofascistas: você tem um líder carismático que te faz crer que vai te salvar do naufrágio. Receio que seja esse o papel que Narendra Modi esteja desempenhando", analisa.
Se a Índia se orgulhava de ser a "fábrica mundial" de vacinas, agora os centros de vacinação indianos estão fechando devido à escassez. Não seria uma perda significativa de prestígio para o país, que se apresenta como uma grande potência regional moderna? "Não sei se é uma perda de prestígio. Mas é claro que essa situação levanta uma visão mais realista da retórica da "diplomacia da vacina" indiana e da capacidade da Índia de enfrentar a China", conclui Boillot.