Por ASCOM
Publicada em 06/05/2021 às 09h21
“Retratar as personagens Renato, Caio Fernando, Nêgo, Belx, Diamond e Flávio, inspirando-me em depoimentos das vidas de cinco atores de Porto Velho, bem como em minha própria história, mexeu muito com as minhas emoções. Eu chorei muito, pois, de certa forma, vivenciei e experimentei, na pele e na alma, enquanto homossexual, muitos dos preconceitos e das violências narradas por cada artista”, define Luciano Oliveira, autor do texto teatral Fegues que será lançado na noite deste sábado (08/05), às 19h, em transmissão pelo Youtube: https://youtu.be/in5yi4XxJ8s
Fegues está sendo disponibilizado gratuitamente em formato e-book. Os leitores poderão baixar o texto teatral no site da Editora Scienza (https://editorascienza.com.br/) e no blog (www.lucianodiretor.com). Uma leitura dramatizada de trechos da obra dramatúrgica e conversas com convidados especiais compõem o restante da programação.
O projeto de criação, publicação e lançamento da dramaturgia foi contemplado no Edital nº 83/2020/SEJUCEL-CODEC - 1° Edição Alejandro Bedotti do Edital de Chamamento Público de Fomento à Cultura para Pesquisa e Desenvolvimento de Expressões Culturais da Superintendência Estadual da Juventude, Cultura, Esporte e Lazer (SEJUCEL) do Governo de Estado de Rondônia. O evento é voltado para interessados (as) nas temáticas LGBTQIA+, tem classificação indicativa de 16 anos e contará com interpretação/tradução em LIBRAS.
O texto Fegues (aportuguesamento da palavra inglesa fags, traduzido como bichas), segue a linha dramatúrgica que o pesquisador Daniel Furtado, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), chama de ‘dramaturgias do real e depoimento autobiográfico: compartilhamento do eu’. A trama se passa em Porto Velho (RO), em 2021, trazendo, em síntese, texto-denúncia sobre homofobia e complexidades amorosas homoafetivas.
Do que fala Fegues?
Na trama, um grupo de seis artistas “fegues” (bichas) – Renato, Caio Fernando, Nêgo, Belx, Diamond e Flávio – tenta criar, sem muito sucesso, uma dramaturgia coletiva de um espetáculo teatral realista contemporâneo, de temática LGBTQIA+. Entre cenas descontraídas e coloridas, canções, danças, lembranças tristes e improvisações, um jogo polêmico, proposto pelo ator e diretor Flávio, cria tensões entre o elenco, fazendo surgir fantasmas do passado, recordações desagradáveis e ciúmes; colocando em xeque um grupo de teatro com poética e estética já em vias de consolidação. Até que ponto o profissionalismo, a confiança e o respeito resistem?
Processo de escrita de Fegues
Luciano explica que todos os depoimentos individuais transcritos e ficcionalizados em Fegues o comoveram de alguma forma, porque são emocionantes e humanamente dolorosos. “Porém, particularmente, os meus depoimentos me fizeram chorar muitas vezes. Isso pelo fato de ter mergulhado em minhas ‘memórias afetivas’, recorrendo ao termo do encenador russo Stanislávski. Fiz um mergulho nas violências familiares, principalmente as cometidas pelos meus irmãos, bem como na violência sexual que padeci no passado. Sofri, de certo modo, um processo catártico, purgando os meus sentimentos, referindo-me agora à Poética de Aristóteles. Finalmente, concluí que passei por tudo isso simplesmente por ter sido quem eu era e do jeito que era e ainda sou: uma fegue”, analisa acrescentando que a escrita de Fegues também rendeu momentos divertidos: “Eu também ri bastante, haja vista terem algumas histórias bem engraçadas, principalmente de Belx. Tentar transcrever os diálogos e depoimentos de Nêgo em pajubá, usando dicionários on-line desse linguajar, me fez gargalhar em alto e bom som. Os meus parentes de João Monlevade, com quem eu estava passando as férias de janeiro, ficavam sem entender os motivos das minhas risadas e das minhas lágrimas”.
Homofobia em pauta
O autor destaca que atualmente, apesar de todos os avanços sociais conquistados pela comunidade LGBTQIA+ no Brasil, “[...] ainda não podemos viver uma vida completamente ‘normal’, como vivem os heterossexuais, em especial os homens brancos. Questões diversas, principalmente sócio-político-culturais, nos vulnerabilizam psicologicamente e nos impõem medo e insegurança. Isso não é por menos, pois o nosso país é um dos campeões mundiais em assassinatos de LGBTQIA+. Precisamos continuar a falar sobre essa terrível estatística, bem como alertar toda a sociedade sobre a homofobia corporativa; sobre o duplo preconceito contra os gays negros; sobre a dúplice discriminação contra homossexuais deficientes, afeminados, transgêneros, doentes crônicos e migrantes; etc”, elenca concluindo que: “Por esse motivo, apresentei o projeto Criação, publicação e lançamento do texto teatral Fegues para celebrar, de forma cômica e dramática, a partir de referências do real e de depoimentos autobiográficos, a vida das fegues. Assim, dizer também para as novas gerações, de modo especial àquelas que estão perdidas nos labirintos da incerteza, que não há nada de errado em ser feliz e em amar uma pessoa do mesmo sexo e constituir com ela uma família sólida e feliz”.
Oficina de Escrita Dramática
O projeto de criação, publicação e lançamento de Fegues vai contar ainda a realização de uma oficina de escrita dramática contemporânea, que acontecerá entre os dias 10 e 12 de maio de 2021, das 14h às 18h, com carga horária de 12h/a. A “Oficina de Introdução à Escrita Dramática Contemporânea: narrativas do real e depoimentos autobiográficos” ocorrerá no Google Meet, e serão ofertadas 20 vagas aos interessados, maiores de 16 anos. As inscrições deverão ser feitas, a partir do preenchimeno de um formulário disponível no seguinte link: https://docs.google.com/forms/d/1wzOIOyIesT-G-UVIYDaFVM-7W-EWfBU0jGPCymWGNFQ/edit. Todos os participantes da oficina receberão certificados.
Sobre o autor
Luciano Oliveira é professor do Curso Licenciatura em Teatro da UNIR e coordena o Programa de Extensão DArtes [Em]Cena: Teatro, Política & Sociedade. É membro pesquisador do PAKY’Op - Laboratório de Pesquisa em Teatro e Transculturalidade: práxis, reflexões e poéticas pedagógicas. É Doutor e Mestre em Teatro pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), Especialista em História da Cultura e da Arte pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Bacharel em Artes Cênicas − com habilitação em Direção Teatral − pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). Em 2021 completa 25 anos de carreira na área teatral, tendo produzido e dirigido diversos espetáculos em Minas Gerais e em Rondônia. É autor dos livros Eid Ribeiro e o Armatrux em Processo: o objeto flutuante entre a poética e a estética teatral (Editora Scienza, 2017) e Representações Culturais no Giramundo Teatro de Bonecos (Novas Edições Acadêmicas, 2017). Academicamente, escreveu e publicou inúmeros artigos científicos. Na área dramatúrgica, foi autor de Moinho Remoçante (2004), de O Casamento de Mané com Encalhada ou A Encalhada e o Covardão (2002); foi dramaturgista em Até tu, Bruta? (2013), Cidade Maldita (2011) e Uai, pode? (2011); foi membro da equipe de adaptação do texto Inimigos do Povo (2017); e adaptador de Menina Bonita do Laço de Fita & Outras Histórias (2012), de O Despertar da Primavera (2004), de As Mãos de Eurídice (2003), de A Ida ao Teatro (2002) e de O Boi e o Burro a Caminho de Belém (2002), dentre outros. Também escreve críticas teatrais e crônicas em seu blog (www.lucianodiretor.com). Na área de audiovisual, escreveu o roteiro do filme/documentário “Rondônia: um estado de delícias culinárias”.
Legenda da imagem: Texto teatral Fegues, escrito por Luciano Oliveira, será lançado neste sábado (08/05) - Crédito da imagem: Mario Roberto Venere