Por G1
Publicada em 07/06/2021 às 09h30
A candidata de direita Keiko Fujimori lidera a eleição presidencial no Peru na manhã desta segunda-feira (7), mas vê sua vantagem para o candidato de esquerda Pedro Castillo cair nas últimas horas, com a apuração dos votos no interior do país.
Com mais de 90% das urnas apuradas, Keiko tem 50,203% dos votos, contra 49,797% de Pedro Castillo, segundo o Escritório Nacional de Processos Eleitorais (ONPE, na sigla em espanhol). Com 42% das urnas apuradas, a vantagem de Keiko era de 52,91% a 47,09%.
Pesquisa de boca de urna divulgada no domingo (6) havia indicado vitória apertada de Keiko, com 50,3% dos votos válidos (contra 49,7% de Castillo). Depois, o mesmo instituto de pesquisa passou a falar em "empate técnico" e apontou uma inversão do resultado, com 50,2% para o professor de escola rural e 49,8% para a filha do ex-presidente Alberto Fujimori, após fazer uma contagem rápida dos votos.
Castillo, de 51 anos, havia pedido calma após os primeiros resultados parciais, advertindo que "ainda falta contar os nossos votos, da zona rural". Keiko, 46 anos, afirmou no domingo que a boca de urna deveria ser considerada com "prudência" porque a margem de diferença era "pequena".
Ambos os candidatos prometeram respeitar o resultado de uma das eleições presidenciais mais disputadas da história do Peru, um país devastado pela pandemia e por uma grave crise política.
"Vamos ser respeitosos assim que houver um resultado oficial", afirmou o candidato de esquerda após votar com um paletó marrom e chapéu branco, traje típico dos camponeses de Cajamarca.
"A partir de agora, posso dizer que, seja qual for o resultado, respeitarei a vontade popular, como deve ser", prometeu a candidata de direita, que tenta pela terceira vez se tornar a primeira presidente mulher do Peru. Em 2016, Keiko não reconheceu a derrota para o banqueiro Pedro Pablo Kuczynski.
País em crise
Com projetos antagônicos, o professor de escola rural e a filha de Fujimori chegaram ao segundo turno praticamente empatados nas pesquisas, após uma campanha marcada por incertezas e exacerbação de temores, o que elevou a cotação do dólar na sexta-feira (4) a um recorde de 3,9 soles.
Keiko pode ser a primeira presidente peruana, meta para a qual trabalha há 15 anos, desde que assumiu a missão de reconstruir praticamente das cinzas o movimento político de direita fundado por seu pai em 1990.
Já Castillo concentra o apoio nas áreas rurais do "Peru profundo", mas ele caiu nas pesquisas de opinião devido ao temor de peruanos que o país se transforme "em uma nova Venezuela" devido a posições extremas do candidato.
O país, que chegou a ter três presidentes em uma semana em novembro de 2020, atravessa grave crise política. O atual presidente é Francisco Rafael Sagasti, que assumiu interinamente após Martín Vizcarra sofrer um impeachment e seu sucessor, Manuel Merino, renunciar após cinco dias.
Quem vencer tomará posse em 28 de julho, dia em que o Peru comemora o bicentenário de sua independência. O presidente interino, Francisco Sagasti, pediu a seus compatriotas "que respeitem escrupulosamente a vontade expressa nas urnas".
Em 31 de maio, o governo peruano revisou os números da pandemia e anunciou que mais de 180 mil pessoas haviam morrido de Covid-19 no país, mais do que o dobro dos números oficiais.
Com a mudança, o Peru se tornou o país com o maior número de mortes por Covid-19 do mundo em relação à população.
São 5,6 mil óbitos a cada 1 milhão de habitantes, quase o dobro do segundo colocado (a Hungria, que tem 3 mil). O Brasil é o 10º pior, com 2,2 mil mortes por milhão, segundo dados do "Our World in Data".
Keiko Fujimori
Keiko se coloca como representante da democracia e promete respeito à Constituição, mas o sobrenome Fujimori faz com que ela tenha muita rejeição — sobretudo porque ela ainda elogia o pai, Alberto Fujimori, que governou o Peru em um regime autoritário na década de 1990.
Fujimori está preso por desrespeito aos direitos humanos. A herdeira do fujimorismo ficou presa entre 2018 e 2020, com intervalos em liberdade, acusada de corrupção envolvendo a empreiteira brasileira Odebrecht, em um escândalo que atingiu políticos de diferentes partidos.
Keiko ficou muito perto de não passar para o segundo turno da eleição, após uma primeira votação bastante fragmentada. No campo da direita, os votos ficaram divididos principalmente entre ela e os candidatos Rafael López Aliaga e Hernando de Soto.
Com o segundo turno definido, ela afiou o discurso contra o temor de que o Peru caísse em um governo de extrema esquerda, próximo de regimes autoritários como a Venezuela, com Pedro Castillo. O discurso teve muito eco nas cidades mais ricas, principalmente a capital Lima.
Keiko conseguiu o apoio até do escritor Mario Vargas Llosa, que concorreu contra Alberto Fujimori em 1990 e é um dos maiores opositores ao fujimorismo.
O vencedor do Nobel de Literatura defendeu que uma vitória de Keiko seria a chance de o Peru continuar sendo um país democrático, contra o que classificou como risco de arroubos autoritários das propostas de Castillo.
Durante a campanha, a candidata do partido Força Popular priorizou o discurso de moralização na política e de combate ao crime, mesmo envolvida em escândalos de corrupção e tendo sido presa.
Ao longo do segundo turno, Keiko Fujimori fez aceno a outros grupos para tentar diminuir a rejeição a fujimorismo e prometeu respeitar a democracia e as instituições públicas peruanas.
Conservadora, ela se posicionou contra flexibilizar a legislação sobre o aborto, mas admitiu aceitar uniões civis entre pessoas do mesmo sexo.
Veja algumas das propostas e promessas de Keiko Fujimori:
Manter a Constituição de 1993, promulgada no governo de Alberto Fujimori
Promover uma "verdadeira economia de mercado"
Fomentar turismo com a vacinação prioritária a profissionais desse setor e incentivos fiscais
Criar o Ministério da Pesca
Acelerar a formalização dos pequenos empresários peruanos
Firmar acordos entre os setores ambiental, agrário e da mineração; comumente em conflito político no país.
Pedro Castillo espera virada
O resultado muito apertado da boca de urna indicava alguma esperança para o esquerdista Pedro Castillo, que liderou as pesquisas na maior parte da campanha, e ela cresceu com a contagem rápida dos votos, que o colocou numericamente à frente na disputa.
Aos 51 anos, Castillo surpreendeu no primeiro turno das eleições ao conseguir o maior número de votos em uma eleição bastante fragmentada (com sucessivas crises políticas e quedas de presidentes, o Peru vive uma onda de descrédito em relação às principais forças do país).
Castillo se tornou nacionalmente conhecido em 2017, após liderar uma greve de professores de quase três meses que exigia aumento nos salários dos professores — uma das bandeiras que ele manteve ao longo da campanha.
O lápis inclusive se tornou o símbolo de sua candidatura e do partido Perú Libre. O dirigente sindical também promete garantir "acesso livre às universidades".
O candidato nasceu na pequena cidade andina de Puña, na província de Chota, onde os moradores costumam usar chapéu de aba larga, que Castillo adotou durante a campanha e até no único debate presidencial. No domingo, ele foi votar a cavalo na região andina de Cajamarca, onde reside.
A votação de Castillo no primeiro turno foi muito forte no interior do país, em províncias pobres e majoritariamente agrárias do Peru, o que se repetiu no segundo turno. A dúvida era se ele conseguiria reverter a rejeição nas maiores cidades do país e na capital Lima.
Castillo chegou a prometer no início da campanha desativar o Tribunal Constitucional, a Suprema Corte do país, e dizia que ela defendia a "grande corrupção". Ele ameaçou também fechar o Congresso se os parlamentares não aceitarem seus planos.
Ao longo da corrida presidencial, no entanto, Castillo mudou de tom. Ele prometeu seguir a Constituição "enquanto ela estiver em vigor", mas disse que buscará uma nova Assembleia Constituinte caso seja eleito.
Em relação aos costumes, Castillo adota postura mais conservadora: ele se recusa a legalizar o aborto, é contra o "enfoque de gênero" na educação e tem relutado em reconhecer os direitos das minorias sexuais.
Veja algumas das promessas e propostas de Pedro Castillo:
Descentralização do governo
Reforço à Polícia Nacional
Ampliar o acesso às refeições nas escolas
Criar o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação
Apoio às micro e pequenas empresas
Acesso livre e gratuito à internet
Prioridade à produção nacional