Por RFI
Publicada em 31/08/2021 às 15h34
A União Europeia (UE) quer contar com os países vizinhos do Afeganistão para acolher as pessoas que deixem o país fugindo dos talibãs. Representantes dos 27 países do bloco, reunidos nesta terça-feira (31) em Bruxelas, tentam entrar em acordo sobre critérios comuns para acolher migrantes no continente europeu. O objetivo é evitar uma crise migratória como a de 2015, quando chegaram à Europa mais de uma milhão de pessoas fugindo da guerra da Síria.
“Temos que trabalhar em escala mundial para manter as pessoas perto de suas casas e de sua cultura”, declarou o ministro alemão do Interior Horst Seehofer, afirmando que somente os “cidadãos especialmente perseguidos” deveriam poder migrar para a Europa.
Em 2015, a Alemanha de Angela Merkel acolheu mais de um milhão de sírios que fugiam da guerra, durante uma onda migratória que surpreendeu a Europa.
Os afegãos “não devem vir para a Europa, eles devem ficar em sua região. Nossa tarefa é estabilizar a região e garantir que as organizações internacionais sejam financiadas e capazes de ajudar as pessoas que precisam de proteção”, disse o ministro dinamarquês Mattias Tesfaye, ao lado dos representantes austríaco e tcheco que mostraram a mesma convicção.
A França insistiu sobre a “coerência entre acolher refugiados e a firmeza dos controles”, através de seu ministro do Interior Gérald Darmanin. O objetivo é ajudar todos os que nos ajudaram, que são perseguidos pelos talibãs, mas não aceitar uma imigração sem controle”, disse. Ele precisou que o fluxo não aconteceu ainda, mas “pode acontecer nas próximas semanas ou meses”.
Orçamento
Para controlar suas fronteiras exteriores, a UE poderia se inspirar no acordo assinado, em 2016, com Ancara, que previa o envio de migrantes em situação irregular das ilhas gregas para a Turquia e uma ajuda financeira para receber os refugiados. A Turquia acolhe atualmente mais de quatro milhões de migrantes, a maioria sírios.
“É importante que estejamos em posição de evitar uma crise humanitária, uma crise migratória e ameaças à segurança provenientes do Afeganistão”, destacou a comissária europeia Ylva Johansson. “Nós devemos agir agora e não esperar ver fluxos de pessoas em nossas fronteiras ou organizações terroristas ganharem força”.
Nenhum orçamento para acolher refugiados afegãos da parte dos Estados-Membros deve ser abordado nesta terça-feira, precisou o ministro alemão de Assuntos Interiores Horst Seehofer. “Os números incitam e não queremos isso”, disse.
Promessas de “instalação” de refugiados, independentemente da nacionalidade, devem, no entanto, ser apresentadas aos 27 países até meados de setembro, dentro de um processo anual.
Tema sensível
O acolhimento de imigrantes é um tema sensível na UE, que não consegue chegar a um acordo para reformar seu sistema de asilo.
Mas em um projeto de declaração conjunta sobre o assunto, que deve ser publicado no final da reunião e teve partes do texto previamente liberadas para a imprensa, os Estados-Membros se dizem “determinados a agir conjuntamente para impedir o retorno de movimentos migratórios ilegais e descontrolados em grande escala”.
No documento, a UE se compromete a “reforçar seu apoio” aos países vizinhos do Afeganistão “acolhendo migrantes e refugiados para aumentar sua capacidade de fornecer uma proteção das condições de acolhimento dignas e seguras e de meios de subsistência duráveis”. O financiamento viria de um envelope orçamentário de € 80 bilhões entre 2021 e 2027. Entre os países vizinhos estariam Paquistão e Tadjiquistão.
Os países do bloco prometem, também, “fazer o máximo para garantir que a situação no Afeganistão não leve a novos riscos para os cidadãos da UE”, sublinhando a “execução de controles de segurança das pessoas evacuadas”.
O ministro de Luxemburgo, Jean Asselborn, lamentou que a política migratória europeia vá “na direção errada”, pedindo que “estabeleçam programas de instalação (de refugiados) para dar esperança às pessoas que são perseguidas, que não podem viver normalmente no Afeganistão”.
A ong Oxfam acusou os governos europeus de “lavar as mãos de sua obrigação internacional de oferecer refúgio aos que procuram segurança” e encarregarem outros países pela função.
A Anistia Internacional também pediu à Europa que não “passe a responsabilidade da proteção dos refugiados a outros países”.
Catástrofe humanitária
A ONU, que espera que o número de refugiados afegãos aumente em meio milhão no mundo, alertou nesta terça-feira para uma catástrofe humanitária no Afeganistão, pedindo fundos para o país, após a retirada das tropas americanas.
“Uma catástrofe humanitária se aproxima”, sublinhou em um comunicado o secretário geral da organização Antonio Guterres, citando “o agravamento da crise humanitária e econômica” e “a ameaça de um colapso total dos serviços básicos”.
Guterres pede também aos Estados membros da ONU para que “forneçam um financiamento adequado, flexível e completo” para a população afegã que está, segundo ele, “em seu momento mais difícil” com relação às suas necessidades vitais.