Por RFI
Publicada em 30/09/2021 às 16h01
O líder norte-coreano, Kim Jong Un, qualificou as ofertas de diálogo feitas pelos Estados Unidos de "truque mesquinho" e acusou o governo do presidente Joe Biden de manter as políticas hostis contra o seu país.
Os contatos entre os dois países, iniciados durante o mandato de Donald Trump, foram interrompidos em 2019 após o fracasso da segunda cúpula entre o então presidente republicano e o norte-coreano em Hanói, Vietnã.
Desde que chegou à Casa Branca, o governo de Joe Biden tem tentado retomar o diálogo com Pyongyang, sem condições prévias. Kim chamou essas propostas de "nada além de um truque mesquinho para enganar a comunidade internacional e mascarar seus atos hostis", de acordo com a agência estatal KCNA.
Com a chegada de Biden, "a ameaça militar americana e a política hostil não mudaram mas se tornaram mais maliciosas", disse Kim durante um longo discurso à Assembleia Suprema do Povo, o Parlamento de partido único norte-coreano, nesta quinta-feira (30).
A Coreia do Norte, que mantém um polêmico programa nuclear, deixou passar o tempo nos últimos meses, estudando os movimentos da nova administração americana ao mesmo tempo em que se concentrou em assuntos internos.
O país se impôs um bloqueio no começo de 2020 para se proteger da pandemia do coronavírus, o que castigou ainda mais sua economia, reduzindo o comércio com a China, seu principal parceiro.
Testes militares
Na quarta-feira (28), Pyongyang assegurou que tinha testado com êxito um míssil hipersônico, mais rápido do que os convencionais e mais difícil de ser interceptado pelos sistemas de defesa. A Coreia do Sul, por sua vez, também está destinando grande parte de seu orçamento para melhorar suas capacidades militares para se proteger das ameaças do vizinho.
Neste mês, Seul anunciou o primeiro teste bem sucedido de mísseis lançados de um submarino (SLBM), uma tecnologia disponível apenas em um punhado de países, e apresentou seu terceiro submarino capaz de carregar estes projéteis.
Resoluções tomadas pelo Conselho de Segurança da ONU proibiram o programa de armamento nuclear e mísseis balísticos impulsionado por Kim Jong Un na Coreia do Norte.
Os Estados Unidos condenaram os recentes lançamentos de Pyongyang, mas seguem abertos ao diálogo. "Estamos dispostos a nos reunir com a Coreia do Norte sem condições prévias. Esperamos que aquele país responda positivamente à nossa aproximação", declarou o porta-voz da diplomacia americana.
"Os Estados Unidos não têm nenhuma intenção hostil", afirmou um porta-voz do Departamento de Estado. "Nossa política exige um enfoque prático, que busque uma diplomacia séria e permanente com a Coreia do Norte, a fim de obter um progresso tangível, que aumente a segurança dos Estados Unidos, dos nossos aliados e das nossas forças em campo", acrescentou o porta-voz, ressaltando que Washington apoia a "cooperação intercoreana" como ajuda à estabilidade na península.
Linhas de comunicação com Seul
O Conselho de Segurança das Nações Unidas vai se reunir nesta quinta-feira para analisar a situação da Coreia do Norte a pedido de Estados Unidos, França e Reino Unido. Pyongyang não dá sinais de querer se desvincular do seu arsenal, que considera necessário para se defender dos americanos.
O discurso de Kim sugere que o regime continuará desenvolvendo seu programa militar, a menos que Washington mude de postura, indicou Hong Min, pesquisador do Instituto Coreano para a Reunificação Nacional, em Seul. "Ele chegou à conclusão de que não tem escolha a não ser preparar uma estratégia de longo prazo com os Estados Unidos, o que implica continuar a desenvolver armas estratégicas, enquanto mantém uma atitude de paz estável com o Sul."
O dirigente norte-coreano mostrou-se mais moderado ao responder à proposta do presidente sul-coreano, Moon Jae-in, que sugeriu, neste mês, colocar um fim oficial à guerra entre os dois países (1950-1953), encerrada com uma trégua e não um tratado de paz.
Kim lamentou que Seul siga "a serviço dos Estados Unidos" e destacou que somente se poderia declarar encerrada a guerra com "respeito mútuo" e o fim da "atitude injusta e com padrões duplos" do país vizinho. Ainda assim, disse que pretende restabelecer as linhas de comunicação entre Seul e Pyongyang no começo de outubro.
O restabelecimento dessa linha entre os dois países seria um avanço simbólico, lembra o correspondente da RFI em Seul, Nicolas Rocca. Desde janeiro de 2020, a linha telefônica funcionou apenas 15 dias, durante o verão no hemisfério norte.