Por Rondoniadinamica
Publicada em 17/09/2021 às 08h08
Porto Velho, RO – O juiz de Direito Pedro Sillas Carvalho, da Vara Única de Costa Marques, condenou a ex-prefeita da cidade, Jacqueline Ferreira Gois, por improbidade administrativa.
Além dela, também foi sentenciado o empresário Geovane Silva Peixoto.
Cabe recurso da decisão. Enquanto o processo tramita, os envolvidos têm direito ao contraditório e à ampla defesa.
Em suma, ex-prefeita é acusada de doar um terreno público pertencente a Costa Marques para Peixoto, isto num ato administrativo travestido de interesse público.
O empresário, portanto, terá de promover o ressarcimento do dano ao erário municipal “ por meio da restituição do imóvel localizado na Av. Chianca no setor 03, Quadra 25, Lote 05-A, nesta cidade e comarca, ao Município de Costa Marques, mediante instrumento público necessário para a transferência, junto ao Cartório de Registro de Imóveis, arcando com todas as despesas, custas e emolumentos”. Ele também deve renunciar a qualquer direito sobre obras/construções realizadas no imóvel.
Já Jacqueline Ferreira Gois, ex-mandatária, pagará multa civil no valor de R$ 5 mil e renunciará aos seus direitos políticos pelo prazo de 4 (quatro) anos.
CONFIRA A DECISÃO:
"PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA
Tribunal de Justiça de Rondônia Costa Marques - Vara Única
Rua Chianca, nº 1061, Bairro Centro, CEP 76937-000, Costa Marques
Processo: 7000225-97.2019.8.22.0016
Classe: Ação Civil de Improbidade Administrativa
AUTORES: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE RONDONIA, MUNICIPIO DE COSTA MARQUES
ADVOGADOS DOS AUTORES: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE RONDÔNIA, PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO DE COSTA MARQUES RÉUS: ROSIMEIRE DA SILVA SOUZA PEIXOTO, GEOVANE SILVA PEIXOTO, JACQUELINE FERREIRA GOIS ADVOGADOS DOS RÉUS: LUCIANO DA SILVEIRA VIEIRA, OAB nº RO1643, GLENDA ESTELA SILVA DE ARAUJO, OAB nº RO7487, FABIO PEREIRA MESQUITA MUNIZ, OAB nº RO5904 Valor da causa: R$ 15.953,38 SENTENÇA
I – RELATÓRIO Trata-se de Ação Civil Pública pela prática de atos de Improbidade Administrativa cumulada com anulação de ato jurídico em defesa do Patrimônio Público, proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE RONDÔNIA, por seu representante legal, em desfavor de JACQUELINE FERREIRA GOIS, GEOVANE SILVA PEIXOTO e ROSIMEIRE DA SILVA SOUZA PEIXOTO, todos qualificados nos autos, aduzindo, em síntese, que, em razão de uma denúncia anônima relatando que a então prefeita, Jacqueline Ferreira Gois, procedeu a doação de imóvel denominado Lote 05-A, Quadra 25, medindo 745,00 m², situado na Avenida Chianca, s/n, Setor 3, pertencente ao município de Costa Marques. Apurou-se que a doação do bem público acima descrito, imóvel pertencente ao município de Costa Marques, estava mascarada pela aparente necessidade e interesse público, quando, em verdade, o fim era eminentemente particular. Aduz, que após diligências realizadas, verificou-se que o empresário, Sr. Geovane Silva Peixoto, beneficiado com a doação ilegal, havia sido contratado pela Administração Pública (Processo Licitatório nº. 229/2011), para construir um posto de saúde no terreno em questão, contudo, ao serem encontradas falhas durante a primeira medição da obra, o mencionado empresário foi orientado a paralisá-la e iniciar outra no mesmo terreno.
Assim, sob a justificativa de não ficar prejudicado financeiramente, devido à falha ocorrida, solicitou à então Prefeita do Município, Sra. Jacqueline Ferreira Gois, que lhe doasse a parte do terreno onde estava iniciada a primeira obra. Tece comentários a respeito das condutas dos requeridos. Ao final, requer seja deferida liminarmente a indisponibilidade do bem, e sejam os requeridos JACQUELINE FERREIRA GOIS, GEOVANE SILVA PEIXOTO e ROSIMEIRE DA SILVA SOUZA PEIXOTO condenados pela prática de ato de improbidade administrativa, por prejuízo ao erário, por afronta aos princípios da legalidade, eficiência e moralidade, bem como por praticar ato que ensejou dano ao erário e enriquecimento ilícito, devendo ser-lhes aplicadas as “penas” previstas nos arts. 12, I, II e III da Lei 8.429/92, em virtude da configuração dos atos previstos nos art. 9º, 10 e 11 da Lei 8.429/92; em especial: I) a declaração de nulidade do ato de doação do imóvel localizado na Avenida Chianca, Lote 05-A, Quadra 25, Setor 03, cancelando-se a escritura pública e registro na matrícula, no Cartório de Registro de Imóveis desta comarca, declarando-se, incidentalmente, a inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 594/2012, de 17/12/2012, revertendose o imóvel ao Município de Costa Marques, a fim de promover a imprescritível reparação ao patrimônio público, na forma do artigo 12, II, da Lei 8.429/92; II) a condenação dos requeridos ao pagamento das custas processuais devidas pelo princípio da sucumbência.
Com a inicial juntou documentos e relatórios.
Em DECISÃO foi deferida a liminar e determinado a indisponibilidade do imóvel indicado na inicial (id. 25231662) recebimento da inicial e notificação dos requeridos para apresentar defesa preliminar bem como intimar o Município de Costa Marques/RO, para querendo, integrar a lide como litisconsorte ativo. Em seguida, o Município de Costa Marques manifestou interesse em integrar a lide (id. 25553893). Os requeridos Geovane Silva Peixoto e Rosimeire da Silva Souza Peixoto apresentaram Defesa Preliminar ao (id. 26019441) alegaram falta de interesse de agir e impossibilidade jurídica do pedido na conduta narrada na inicial, logo não restando caracterizado ato de improbidade administrativo. Adiante, a requerida Jaqueline Ferreira Gois (id. 27275422) arguiu ausência de justa causa, ausência de ilegalidade no ato combatido e ausência de dolo ou má-fé, porquanto, não sendo ato de improbidade o caso em tela.
Sobreveio manifestação Ministerial pela rejeição da preliminar aventada em sede de defesa preliminar (id. 28239083). E, DECISÃO lançada ao (id. 28342003), foi rejeitado a preliminar e recebida a inicial determinando a citação dos requeridos para contestarem a inicial. Os requeridos Geovane Silva Peixoto e Rosimeire da Silva Souza Peixoto apresentaram contestação (id. 28642573) ratificaram a defesa preliminar apresentada. Já a requerida Jacqueline Ferreira Gois (id. 29107030) sustentou que não há elementos que caracterizam a improbidade administrativa, bem como ocorrência da inviabilidade ou inadequação de Ação Civil Pública por ato de improbidade administrativa em substituição a ação direta de inconstitucionalidade para combater lei municipal considerada inconstitucional visando de forma indireta a anulação de ato jurídico em defesa do patrimônio público, por fim pugnou pela improcedência da ação. Réplica ao id. 30879453. Interpeladas, as partes, acerca das provas que pretendiam produzir, todas requereram a produção de prova oral, enquanto o Município de Costa Marques postulou pelo julgamento antecipado do MÉRITO. Realizada audiência de instrução (id. 54500769), procedeu-se com a oitiva das pessoas indicadas, homologado as desistências das oitivas das testemunhas Carmelo Vaca Ramos e Agnaldo Simões Prudêncio, conforme requerido. Suspendido o prazo processual por 30 dias para eventual apresentação de proposta de acordo entre as partes.
Os requeridos Geovane Silva e Rosimeire da Silva apresentaram alegações finais, por memoriais, conforme manifestações de (id. 57216063), oportunidade em que sustentam, com base no conjunto probatório angariado, as teses defendidas. Intimada a requerida Jacqueline Ferreira manteve-se silente. A parte autora pede a absolvição da requerida ROSIMEIRE DA SILVA SOUZA PEIXOTO, ante ausência de provas que demonstrem a efetiva participação na conduta ímproba, bem como a condenação dos requeridos JACQUELINE FERREIRA GOIS e GEOVANE SILVA PEIXOTO, enquanto este, de outro modo, pugna pela improcedência do pedido autoral. Vieram-me os autos conclusos. Relatei sucintamente. Decido. Cuida-se de ação civil pública por ato de improbidade administrativa proposta em desfavor dos requeridos Jacqueline Ferreira Gois, Geovane Silva Peixoto e Rosimeire da Silva Souza Peixoto.
Preambularmente: De proêmio registro que as preliminares arguidas já foram objeto de apreciação judicial, restando rejeitadas por ocasião da DECISÃO (id. 28342003), sendo certo que no decorrer da ação nenhum fato ou elemento novo surgiu capaz de modificar a DECISÃO anteriormente proferida. No MÉRITO, a ação é procedente. a) Dos Efeitos Concretos da Lei Municipal n. 594/2012. Do Controle Incidental de Constitucionalidade da Lei Municipal em questão mediante Ação Civil Pública. A Lei Municipal n. 594/2012, todavia, é formalmente uma lei de efeitos concretos e, substancialmente, um verdadeiro ato administrativo, já que não apresenta nenhuma das características de norma jurídica a não ser sua devida promulgação por órgão competente e as devidas etapas legislativas. A lei prevê, apenas, em seu objeto a construção de uma clínica médica num imóvel desapropriado pertencente ao Município de Costa Marques. Portanto, não possui o caráter de generalidade e de abstração comum à maior parte das leis existentes. É evidente que a Lei Municipal n. 594/2012 que autorizou a doação de um imóvel urbano (id. 25045591) ao senhor Geovane Silva Peixoto é ato normativo de efeito concreto, que favoreceu apenas a referida pessoa.
Desta forma, sendo, tão somente, lei de efeito concreto, com o correspondente resultado previamente determinado (doação de determinada área), contendo deliberação individual, e que se materializa em mero ato administrativo revestido das formalidade inerentes à Lei Municipal, eis que carece de generalidade e abstração comum a maior parte das leis existentes, inquestionável é a possibilidade de sua invalidação pelo PODER JUDICIÁRIO através da presente Ação Civil Pública. Sobre a questão, forçoso mencionar as sábias lições do mestre José dos Santos Carvalho Filho: “Em consequência, diversa é a hipótese das denominadas leis de efeitos concretos, aquelas que só são consideradas leis pelo seu aspecto formal, embora materialmente sejam meros atos administrativos. Tais atos não apresentam normas gerais, mas, ao contrário, normas dotadas de concretude e singularidade, que repercutem diretamente na esfera jurídica do indivíduo.
No que tange a esse tipo de atos concretos, a ação civil pública é inteiramente cabível para permitir que o autor postule a condenação do réu ao cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, e isso não somente quando a ofensa decorre de algum ato praticado com base na lei errônea, mas também quando provém diretamente da própria lei, sem qualquer ato nela fundado. O ato que se quer invalidar (Lei Municipal n. 594/2012), porque eivado de vício irreparável, viola os ditames legais e acarreta indubitável prejuizo aos cofres públicos, legitimando e exigindo o exercício do controle judicial do ato administrativo de forma a fazer prevalecer os princípios jurídicos expressamente consagrados na Constituição Federal, sobretudo da Legalidade, Moralidade, Supremacia do Interesse Público e Impessoalidade. E, sendo lei de efeito concreto, pode e deve ser declarada nula pelo PODER JUDICIÁRIO, com fundamento no art. 2º, da Lei de Ação Popular: Art. 2º - São nulos os atos lesivos ao patrimônio público das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de: a) incompetência; b) vício de forma; c) ilegalidade do objeto;
d) inexistência dos motivos; e) desvio de FINALIDADE.” (grifos nossos) Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observa-se-ão as seguintes normas: c) a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo: d) a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido; e) o desvio de FINALIDADE se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explicita ou implicitamente, na regra de competência”. (grifos nossos) Assim, tem-se que a declaração de invalidade de um ato administrativo ilegítimo e ilegal, tal como se constata com a Lei Municipal mencionada, pode ser feita, o quanto antes, pela própria Administração, desde que reconheça que praticou um ato contrário ao direito vigente, ou se não fizer, poderá ser pleiteado ao PODER JUDICIÁRIO que verifique a ilegalidade do ato e declare a sua invalidade, através de anulação. Resumindo, se a própria Administração não anula por seus próprios meios os atos ilegais (Súmula STF n. 473), cabe ao Judiciário o controle da legalidade substancial do ato administrativo, desde que traga em si a possibilidade de lesão a direito individual ou ao patrimônio público, tal como se constata.
Ademais, cabe salientar que o objeto dessa Ação não é, de maneira alguma, pura e simplesmente a declaração de inconstitucionalidade da lei mencionada. Muito pelo contrário, a declaração incidental de inconstitucionalidade da Lei 594/2012 apresenta-se como antecedente necessário, ou melhor, CAUSA DE PEDIR, da apreciação da pretensão final: declaração da invalidade da autorização da doação realizada pelo Município de Costa Marques em favor do senhor Geovane Silva Peixoto, possibilitando o retorno ao patrimônio público municipal da área catalogada. Nesse sentido, esgotando eventual controvérsia quanto ao cabimento do controle incidental de constitucionalidade através da Ação Civil Pública, ressoa a jurisprudência do STJ, senão vejamos: “É possível a declaração incidental de inconstitucionalidade, na Ação Civil Pública, de quaisquer leis ou atos normativos do Poder Público, desde que a controvérsia constitucional não figure como pedido, mas sim como causa de pedir, fundamento ou simples questão prejudicial, indispensável à resolução do litígio principal, em torno da tutela do interesse público”.
No caso dos autos, verifica-se que, o Projeto de lei, de iniciativa da ex-Prefeita Municipal/requerida, foi sancionada e aprovado (id. 25045591), dando origem à inconstitucional e ilegal Lei Municipal n. 594/2012, que autorizou a doação de um imóvel urbano para a construção de uma clínica médica. Necessário, pois, a atuação do Ministério Público para coibir tamanha violação aos interesses coletivos e difusos em questão. E, ainda, do ponto de vista jurídico, o que se admite apenas ad argumentandum tantum, jamais a área poderia ser objeto de autorização de doação sem licitação, tal como o fez a Lei Municipal n. 594/2012, em total ofensa ao art. 37, inc. XXI, da CF/88. Ademais, a obrigação de realização de licitação, sob a modalidade concorrência, está definida em lei federal, mais precisamente, no art. 17, I, da Lei 8.666/93: “Art. 17 - A alienação de bens da administração pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas: I - Quando imóveis, dependerá de autorização legislativa para órgãos da administração direta e entidades autárquicas e fundacionais e, para todos, inclusive as entidades paraestatais, dependerá de avaliação prévia e licitação, na modalidade de concorrência” (grifos nosso). A lei é clara em impor a obrigação de licitar ao Poder público no caso de alienação a particulares de bens de domínio público. Mais ainda, deveria ser justificado o interesse público em efetuar tal transação, o que em nenhum momento ocorreu, e haver avaliação prévia do imóvel, que também não ocorreu. Trata-se, interesse público, da impessoalidade, da legalidade e da moralidade.
Por estes motivos, reconheço a inconstitucionalidade/nulidade incidental da Lei Municipal n. 594/2012 por meio da presente Ação Civil Pública, para tornar inválida a doação da área em favor de Geovane Silva Peixoto, em face do evidente desvio de poder legislativo levado a efeito. b) Dos atos de improbidade administrativa e das sanções aplicáveis ao requeridos A Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa – LIA), que dispôs sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos, contempla, basicamente, três categorias de atos de improbidade administrativa, a saber: em seu artigo 9º, os atos de improbidade administrativa que importam enriquecimento ilícito do agente ou de terceiros; em seu artigo 10, os atos de improbidade administrativa que causam prejuízo ao erário; e no artigo 11, os atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da administração pública.
De antemão, verifica-se que a aprovação da inconstitucional e ilegal Lei Municipal 594/2012 mediante projeto de Lei que partiu da ex-Prefeita Municipal/requerida, sob o fim de beneficiar particular, causando considerável prejuízo ao erário, amolda-se claramente à modalidade de atos de improbidade administrativa previstos no art. 10, incisos I, III, VIII e X da Lei de Improbidade Administrativa, senão vejamos: “Art. 10 - Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens integrantes do acervo patrimonial do Município; (…) III - doar à pessoa física ou jurídica, ainda que de fins educativos ou assistenciais, bens do patrimônio público, sem a observância das formalidades legais e regulamentares aplicáveis à espécie: (…) VIII - dispensar indevidamente processo licitatório; (…) X - agir negligentemente no que diz respeito à conservação do patrimônio público; In casu, o ato administrativo (Lei Municipal 594/2012) foi editado com a exclusiva FINALIDADE de dar calço a uma doação (imóvel urbano) a uma determinada pessoa, sem critério objetivo, estudo jurídico/social, motivação, interesse publico e prévia licitação sob a modalidade concorrência, ou seja, tudo em total dissonância com o texto constitucional e infraconstitucional, acarretando prejuízo ao erário municipal e à coletividade, em nítido desvio de FINALIDADE quanto à destinação do imóvel urbano. Comentando o tema dos atos de improbidade lesivos ao erário, previstos no artigo 10 da Lei 8.429/92, temos a lição de Marino Pazzaglini Filho, Márcio Fernando Elias Rosa e Waldo Fazio Júnior:
“Em todas as espécies do art. 10, o agente público realiza condutas que ensejam o enriquecimento indevido de terceiro, pessoa física ou jurídica. Não é preocupação do legislador, neste DISPOSITIVO, o eventual proveito obtido pelo agente público direta ou indiretamente, mas tão somente seu agir ou não agir em benefício de outrem, contra o erário. É da subversão da atividade funcional que trata, quer dizer, do agente público que inobservado o dever de zelar e proteger o erário, assiste ou colabora para que terceiro se beneficie, a dano dos cofres públicos.” (grifos nossos). Também, com base nos fatos narrados, tem-se que o requerido realizou diversos comportamentos ilícitos, atentando, assim, contra os princípios da administração pública, violando os deveres de honestidade, moralidade, legalidade, imparcialidade e lealdade às instituições, ferindo, por conseguinte, as disposições contidas no artigo 11, caput, e inciso I, da Lei n. 8.429/92. “Art. 11 - Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições, e notadamente: I – praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência; (…) O princípio da legalidade, como um dos alicerces do Estado Democrático de Direito, impõe aos agentes públicos a completa submissão às leis. Infere-se, portanto, que administrar um ente público é nada mais nada menos do que realizar atos que atendam o interesse público assim caracterizado em lei, fazendo-o na conformidade dos meios e formas estabelecidos na legislação, ou particularizados segundo suas disposições. Houve absurda ofensa aos ditames da lei de Licitações (Lei n. 8.666/93), da Constituição Federal, do Código Civil, dentre outros DISPOSITIVO s legais retro mencionados.
Corolário disso é a afronta ao princípio constitucional da moralidade, que obriga os gestores do interesse público e demais agentes públicos a somente praticar atos que possuam o indispensável elemento moral e segundo a ordem ética harmonizada com o interesse público e social e, obviamente com a Lei (há que tudo que é ilegal é imoral). A Lei Municipal n. 594/2012, traz em seu âmago inegável imoralidade, eis que foi editada para atender fins estranhos ao interesse público e para, sobretudo, referendar a posse ilegítima da área em questão pelo senhor Geovane Silva Peixoto. Outro princípio frontalmente violado pela requerida é o da FINALIDADE pública, ou da supremacia do interesse público, que estabelece que os interesses públicos têm prevalência sobre os individuais. Ou seja, as pessaos administrativas não têm disponibilidade sobre os interesses públicos confiados à sua guarda e realização.
A inversão de tal supremacia, ou ao menos a sua equiparação ao interesse particular não autorizada por lei, implica em ilegalidade, por desvio de poder ou desvio de FINALIDADE, tal como se constata com destinação de bem público como se privado o fosse. Restou também patenteado no caso vertente que o interesse público não foi o ponto de referência para a doação de um bem público, mas sim, interesses privados. Houve violação ao princípio da impessoalidade. Ainda: “Por outro lado, para que haja verdadeira impessoalidade, deve a Administração votar-se exclusivamente para o interesse público, e não para o privado, vedando-se, em consequência, sejam favorecidos alguns indivíduos em detrimento de outros e prejudicados alguns para favorecimento de outros. Aqui, reflete a aplicação do conhecido princípio da FINALIDADE ”. O Administrador ou quem está encarregado de gerir dinheiro público não pode deixar de atender a FINALIDADE legal pretendida pela lei. Não tem ele a disponibilidade sobre os interesses públicos confiados à sua guarda. Todavia, a maior violação que se apresenta com a conduta corrupta da requerida é sem dúvida ao princípio basilar da Constituição Federal, também erigido à Administração Pública e a sustentação finalística de todo o processo licitatório: o princípio da igualdade.
É primário o conhecimento de que todo trato da Administração Pública com particulares é orientado pelo sentido de paridade em relação àqueles, considerados entre si, sob pena de personificar-se a atuação do Estado. O privilégio concedido ao senhor Geovane Silva Peixoto/requerido em detrimento de todos os demais cidadãos, da natureza laica do Estado Brasileiro e do interesse público, consubstanciado na ausência de prévio procedimento licitatório sob a modalidade licitação, demonstra, ainda mais, a ofensa ao princípio da igualdade.
A doação autorizada pela Lei Municipal 594/2012, além de afrontar os Princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade, supremacia do interesse público, igualdade, também se mostrou ineficiente para o bom desempenho da Administração Pública. Se o agente desvia do interesse público, também a eficiência que deve ser resguardada na condução dos interesses das instituições, resta prejudicada.
Ante tais expedientes, constata-se que a requerida, além de ter dado causa a danos ao erário municipal, violou os princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade, da igualdade, da supremacia do interesse público, da competividade, da eficiência, e da probidade administrativa. Imperativo, dessarte, que o PODER JUDICIÁRIO, última barreira capaz de conter a sangria dos cofres públicos executada por atos ilegais do administrador e legisladores, atue com rigorosidade, identificando os abusos e responsabilizando os defraudadores do patrimônio da coletividade ou aqueles indevidamente favorecidos por tais atos ilegais e ilegítimos, principalmente para servir de exemplo.
No caso dos autos, considerando a infringência dos princípios da legalidade e moralidade, conclui-se pela procedência do pedido do Ministério Público. Por fim, imperioso, consignar que, de acordo com o Ministério Público, não vislumbro caracterizado a prática do ato ímprobo praticado pela requerida Rosimeire da Silva Peixoto motivo pelo qual sua absolvição é medida que se impõe.
III- DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido inicial formulado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE RONDÔNIA em desfavor de JACQUELINE FERREIRA GOIS, GEOVANE SILVA PEIXOTO e ROSIMEIRE DA SILVA SOUZA PEIXOTO, com resolução de MÉRITO, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC e, por consequência: I- DECLARO a NULIDADE da Lei Municipal 594/2012 consistente na doação do imóvel urbano localizado na Av. Chianca no setor 03, Quadra 25, Lote 05-A, bem como DETERMINO a reversão do imóvel ao patrimônio municipal. II- com fundamento no art. 12, I, II, III da 8.429/1992,
CONDENAR os requeridos JACQUELINE FERREIRA GOIS e GEOVANE SILVA PEIXOTO;
1) GEOVANE SILVA PEIXOTO: 1.a) promoverá o ressarcimento do dano ao erário municipal, por meio da restituição do imóvel localizado na Av. Chianca no setor 03, Quadra 25, Lote 05-A, nesta cidade e comarca, ao Município de Costa Marques, mediante instrumento público necessário para a transferência, junto ao Cartório de Registro de Imóveis, arcando com todas as despesas, custas e emolumentos; 1.b) renúncia a qualquer direito sobre obras/construções realizadas no imóvel;
2) JACQUELINE FERREIRA GOIS: 2.a) pagará multa civil no valor de de R$ 5.000,00 (cinco mil reais); 2.b) renunciará aos seus direitos políticos pelo prazo de 4 (quatro) anos.
III- ABSOLVO a requerida ROSIMEIRE DA SILVA SOUZA PEIXOTO, quanto aos fatos apurados nestes autos. Condeno os requeridos ao pagamentos das custas processuais. Sem condenação em honorários, haja vista que não são devidos ao Ministério Público, de acordo com o art. 18 da Lei 7.347/85.
Havendo Interposição de recurso de apelação, após cumpridas das formalidades previstas nos §§ 1º e 2º do art. 1.010 do Novo Código de Processo Civil, DETERMINO remessa dos autos ao Tribunal. Após o trânsito em julgado, expeça-se ofício ao Tribunal Regional Eleitoral, informando quanto à suspensão dos direitos políticos aplicada aos requeridos e proceda inclusão dos condenados no Cadastro Nacional de Condenados por ato de Improbidade Administrativa. Com o trânsito em julgado, arquive-se. Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
SERVE, DEVIDAMENTE INSTRUÍDO, DE MANDADO /CARTA AR/CARTA PRECATÓRIA DE CITAÇÃO, INTIMAÇÃO, PENHORA, AVALIAÇÃO, REMOÇÃO, DE ALVARÁ E DE OFÍCIO - CASO ENTENDA CONVENIENTE A ESCRIVANIA: AUTORES: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE RONDONIA, RUA JAMARY 1555, RUA JAMARY 1555 OLARIA - 76801-917 - PORTO VELHO - RONDÔNIA, MUNICIPIO DE COSTA MARQUES RÉUS: ROSIMEIRE DA SILVA SOUZA PEIXOTO, AVENIDA CHIANCA 2070 CENTRO - 76937-000 - COSTA MARQUES - RONDÔNIA, GEOVANE SILVA PEIXOTO, AVENIDA CHIANCA 2070 CENTRO - 76937-000 - COSTA MARQUES - RONDÔNIA, JACQUELINE FERREIRA GOIS, AVENIDA DEMÉTRIO MELLAS 1562 SETOR 02 - 76937-000 - COSTA MARQUES - RONDÔNIA
Costa Marques, quarta-feira, 15 de setembro de 2021.
Pedro Sillas Carvalho Juiz(a) de Direito".