Por RFI
Publicada em 15/09/2021 às 15h19
Um mês após a tomada de poder no Afeganistão pelo Talibã, a situação ainda é bastante tensa para jornalistas e ativistas de direitos humanos no país. Nesta quarta-feira (15), a RFI recebeu a denúncia do desaparecimento do jornalista e ativista Dawood Tapan, que teria sido levado pelos talibãs há três dias e teria sido liberado hoje. Apesar da sua liberação, o jornalista permanece incomunicável, mas já estaria com sua família na província de Paktia (sudeste).
A reportagem da RFI recebeu a denúncia do desaparecimento do jornalista Dawood Tapan, de 32 anos, nesta quarta-feira (15). Segundo todas as fontes entrevistadas, na Europa e no Afeganistão, o jornalista, que trabalhou na Radio Free Europe entre 2012 e 2018 e já colaborou com a Al Jazeera, teria sido levado pelos talibãs no domingo (12) e desde então sua família teria ficado sem informações sobre o seu paradeiro e tampouco conseguia falar com ele. A reportagem tentou entrar em contato com o jornalista pelo whatsapp e a última vez que ele esteve online foi no domingo pela manhã, o que coincide com os relatos de seu desparecimento.
Horas depois, outro jornalista afegão, Sayed A. Nizami, postou no seu Facebook, em farsi, que Tapan teria sido liberado da prisão pelo Talibã no meio da tarde desta quarta-feira (hora de Londres) e que ele estaria de volta à sua casa, em família. Nenhum detalhe adicional foi revelado.
Segundo o também jornalista e amigo próximo de Tapan, Nazir Ahmed, que mora há nove anos com a família na Holanda e foi entrevistado pela RFI, Tapan constava da lista de 26 pessoas em perigo, que deveriam ter prioridade para serem retiradas do Afeganistão, enviada por ativistas afegãos aos governos francês e holandês. Mas os governos de ambos os países ainda não teriam respondido.
Tapan trabalhou para o governo deposto
Nazir acha que uma das possíveis razões para a prisão de Tapan é que ele teria trabalhado, antes da tomada de poder pelo Talibã, como trabalha como assessor de Informação e Cultura do Ministro da Defesa de seu país, além de ser conhecido nas redes sociais.
As ligações telefônicas de outros países para o Afeganistão estão sendo controladas, mas, surpreendentemente, as redes sociais estão liberadas. E era por meio delas que Dawood Tapan se comunicava com amigos e ativistas afegãos que se encontram em solo europeu e que denunciaram a sua situação à reportagem da RFI. A reportagem conseguiu entrevistar dois amigos e um conhecido de Tapan, que é ativo nas redes sociais há cerca de 15 anos.
"Faz uns dez anos que eu conheço Dawood Tapan pelas redes sociais e há sete anos nos conhecemos pessoalmente", diz o jornalista e também ativista R.S., que, apesar de escrever contra os Talibãs e a favor da democracia, continua livre e ativo no Twitter, mas teve sua conta no Facebook derrubada.
A entrevista com este jornalista, que está em Cabul, foi feita inteiramente por whatsapp. Quando tentava contactá-lo diretamente por telefone, a reportagem ouvia uma gravação de um homem que repetia, em um inglês pouco fluente, a mesma história sobre Dawood Tapan sem responder diretamente a nenhuma das perguntas. Depois, quando a entrevista finalmente foi feita por whatsapp, foi informado à reportagem que o ISI, o serviço secreto do Paquistão, controla todas as ligações telefônicas no país desde a tomada de poder pelos talibãs, e que o jornalista não pode mais usar o telefone.
A mesma recomendação foi feita para contatar qualquer pessoa ligada a Tapan no Afeganistão: jamais por telefone.
Jornalistas na mira
A história de Tapan, que, ao que indica, teve um desfecho favorável, preocupa os ativistas, porque aparentemente jornalistas que trabalham para veículos com difusão no exterior são ainda mais visados. E assassinatos de jornalistas no país vêm sendo relatados mesmo antes do Talibã tomar o poder no país.
"Como um defensor dos direitos humanos, da democracia, e com uma mentalidade antiTalibã, nós lidamos com muitos desafios e somos ameaçados de morte", diz R.S., sobre ele e seus colegas que continuam no país, quando perguntado se não tinha medo de falar em seu nome sobre a prisão de seu colega. Ele diz que prefere denunciar, apesar do medo. Ainda assim, a reportagem optou por não reproduzir seus tuítes de denúncia nem revelar seu nome.
No ano passado, um outro jornalista da Radio Free Europe Afghanistan foi brutalmente assassinado. Mohammad Ilyas Dayee trabalhava no sul do Afeganistão em pachtô, um dos idiomas da rádio no país.
Também no ano passado, a jornalista e ativista Malala Maiwand foi morta em Jalalabad, no Afeganistão. O assassinato foi reivindicado pelo grupo terrorista Estado Islâmico, o qual o Talibã combate.
Contatada pela RFI, a Radio Free Europe não se pronunciou sobre o caso de Dawood Tapan. A reportagem contatou também o Ministério das Relações Exteriores francês e o Comitê para a Proteção de Jornalistas, com sede em Nova York, mas não obteve respostas até o momento da publicação desta matéria.