Por ASCOM / TCE-RO
Publicada em 01/09/2021 às 13h52
Muito se tem falado nos últimos dias sobre uma possível sobrecarga do “rombo” da previdência sobre os servidores públicos, tentando-se fazer crer que a reforma da previdência é uma “tentativa de penalizar a classe trabalhadora pública” atribuindo a esta um ônus que não lhe cabe. Diante disso, escrevemos este texto para elucidar a questão do déficit previdenciário, da reforma da previdência e ainda para esclarecer quem paga a conta das aposentadorias e pensões dos servidores públicos de Rondônia.
O déficit da previdência dos servidores públicos de Rondônia
Previdência é uma espécie de seguro social, em que o servidor público participa por meio de contribuições mensais. O benefício dessa contribuição é garantir ao servidor segurado uma renda quando ele não puder mais trabalhar – ou seja, quando ele se aposentar.
A composição dos valores que são recolhidos para fazer uma “massa de recursos” que garanta ao servidor uma renda em sua aposentadoria ocorre por meio de contribuição patronal, contribuição do servidor, rendimentos das aplicações financeiras dos saldos financeiros que estes contribuirão e ainda uma espécie de transferência de recursos quando determinado trabalhador assume um novo cargo público e muda de regime previdenciário. Esta transferência é conhecida como compensação entre regimes.
Pois bem, por tudo que se identificou até aqui há que se esclarecer que os benefícios de aposentadoria e pensão não são uma continuidade do vínculo empregatício, mas sim uma soma de esforços, do ente empregador e do servidor, que resultam em uma massa de recursos que deveria ser suficiente para que não lhe faltasse uma renda quando ele não mais trabalhasse.
Ocorre que, em Rondônia, até meados de 2006 o que se tinha era uma composição entre contribuições dos servidores ativos e de seus respectivos órgãos que nunca foram suficientes para formar uma massa de recursos que garantisse tais rendas futuras.
Outro fator que agrava o déficit de um sistema de previdência é a relação entre ativos e inativos, ou seja, a relação dos que ainda contribuem para o sistema versus aqueles que apenas retiram do sistema valores como renda. No início do Estado, essa relação chegou a ser de 12 ativos para cada inativo, hoje não passa de 2,5.
Portanto, o primeiro ponto a ser esclarecido nesse debate é que os servidores mais antigos sequer contribuíram o suficiente para formar as reservas que lhes permitiriam obter renda quando de sua inatividade. Da mesma forma, o ente empregador também não contribuiu o suficiente. A resultante disso é que ambos devem se sujeitar hoje a ajustes para que essa conta feche.
No que tange aos números do déficit, precisamos pontuar que o patrimônio que paga os benefícios previdenciários fica “depositado” em dois fundos. Um é o Fundo Capitalizado, que tem características financeiras equilibradas de longo prazo. Outro é o Fundo Financeiro, que tem déficit financeiro por natureza, pois não ingressam nele novos servidores, apenas surgem novos inativos.
Por óbvio que o problema da insuficiência de recursos previdenciário recai sobre o Fundo Financeiro. De acordo com a última avaliação atuarial publicada no portal da transparência do IPERON, teríamos que acumular o montante de mais de R$ 15 bilhões. Por sua vez, o Fundo Capitalizado apresenta um superávit de mais de R$ 700 milhões.
Para realizar o projeto de recomposição do equilíbrio atuarial da previdência dos servidores públicos de Rondônia, os Poderes e Órgãos autônomos estão propondo a unificação dos fundos. Isso resultará em um déficit de aproximadamente R$ 14 bilhões, conforme relatório da RTM Consultores Associados, entidade técnica contratada pelo IPERON para realizar os estudos atuariais.
De onde vêm os recursos para o pagamento da previdência?
Conforme já explicitado, em um sistema em equilíbrio, as contribuições tanto do Ente quanto dos servidores se acumulam para realizar o pagamento das aposentadorias e pensões futuras. No caso de Rondônia, como o sistema é deficitário, a contribuição patronal (hoje em 17% sobre a remuneração do ativo) não é suficiente para, cumulada com a contribuição do servidor (14% atualmente), cobrir tais despesas.
Diante disso, os Poderes e Órgãos autônomos necessitam aportar valores maiores, pois foi consensual que não haveria majoração de alíquotas dos servidores, justamente para que não incidisse sobre eles um ônus financeiro.
Pelo plano de amortização apresentado pela RTM Consultores e ratificado pelos técnicos de todos os Poderes e Órgãos autônomos do Estado de Rondônia, o aporte que cada Poder e Órgão autônomo teria de fazer, a partir de 2022, sem reforma da previdência, seria de mais de R$ 900 milhões.
Com a reforma, tal aporte se acomodou no montante de aproximadamente R$ 609 milhões. Ou seja, com a reforma implementada, que apenas altera critérios de concessão de aposentadorias e pensões, novamente, não majorando em nenhum percentual a alíquota de contribuição dos servidores públicos, teríamos uma economia anual de aproximadamente 300 milhões de reais.
Esses são recursos que poderiam estar disponíveis (se existissem) ao Poder Público para aplicação em Saúde, Educação, Segurança, Infraestrutura, asfaltamento, investimentos diversos em benefício do cidadão que é quem paga os impostos que financiam toda a máquina pública.
Em verdade, ao fim e ao cabo, quem paga a conta do funcionamento da Administração Pública é o cidadão, por meio de seus impostos.
O peso “apenas” sobre o servidor público
Por tudo que foi exposto, não há que se falar em peso apenas sobre o servidor público da cobertura do déficit da previdência. Pelo plano que se pretende apresentar, além das contribuições patronais, os entes empregadores realizarão aportes milionários que, em verdade, tornam indisponíveis recursos que poderiam ser destinados em benefício da população. Ou seja, o peso pela inadequação dos critérios de concessão que estão sendo revistos pela reforma já recai sobre cada um dos mais de 1,7 milhão de rondonienses.
A título de exemplificação de como fica a repartição do déficit, tem-se que, dos R$ 14 bilhões que resultam da fusão dos fundos, o que, de plano, já representa um ganho de mais de R$ 1 bilhão, 35% virão da reforma da previdência, aproximadamente R$ 5 bilhões. Estes R$ 5 bilhões não representam nenhum centavo a mais de dispêndio financeiro por parte de qualquer servidor público, apenas significaria mudança nos critérios de concessão, para deixá-los mais alinhados inclusive às novas dinâmicas de expectativa de vida do brasileiro.
Os outros 65%, aproximadamente R$ 9 bilhões, correspondem a valores a serem pagos ao longo de 35 anos que, em verdade, representam perda para a população na oferta de serviços públicos dos quais tanto depende, e que está sendo onerado por meio de sua contribuição tributária.
Daniel Piedade de Oliveira Soler é Coordenador do Tesouro Estadual/RO.