Por AFP
Publicada em 21/10/2021 às 10h26
Milhares de pessoas saíram às ruas do Sudão nesta quinta-feira (21) em defesa do poder civil, em um clima de forte tensão, em resposta aos manifestantes que há seis dias pedem um governo militar para tirar o país da crise política.
Desde quarta-feira, os apelos à calma se multiplicaram, devido a temores de possíveis confrontos entre os dois lados.
"O povo escolheu os civis", proclamavam os manifestantes anti-exército, que se reuniram em diferentes distritos de Cartum e cujo número era estimado em milhares.
Por sua vez, os manifestantes a favor do exército atravessavam a ponte que liga o centro de Cartum com o distrito de Bahri, do outro lado do Nilo, e erguiam retratos do primeiro-ministro Abdullah Hamdok riscados com uma cruz vermelha.
Na véspera, os líderes de ambos os lados pediram aos simpatizantes que respeitem as opiniões dos outros e o direito de protestar, enquanto as autoridades sudanesas, assim como os líderes internacionais, alertaram sobre uma escalada no país - já abalado em 21 de setembro por uma tentativa fracassada de golpe de Estado.
Apesar dos apelos pacíficos, blocos de concreto e soldados armados bloqueavam o tráfego nas estradas que levam ao quartel general do exército no centro de Cartum.
- De uma "revolução" anti-exército para outra -
Muitas lojas fecharam pela manhã. Na noite anterior, jovens ativistas marcharam pelas ruas da capital e apelaram para a mobilização para pedirem uma transferência do poder para a população civil, esperando reunir ao menos um milhão de pessoas.
Para esses militantes da "revolução" de 2019, que encerrou os 30 anos de ditadura de Omar al-Bashir, a manifestação desta quinta-feira é uma evidência. Seu objetivo é lembrar às autoridades de seu peso na sociedade e mostrar que continuam nas ruas, dois anos depois.
Os defensores do exército - acusados de serem nostálgicos do antigo governo, islâmicos ou grupos manipulados pelos militares - querem mostrar que são mais numerosos do que os defensores pró-civis.
E pretendem provar ao governo liderado pelo tecnocrata e ex-economista da ONU que o Executivo deve fazer mais por uma população asfixiada pela austeridade imposta pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) em troca de eliminar a dívida do Sudão.
Os militantes a favor de um poder civil escolheram uma data simbólica, a do 57º aniversário da primeira "revolução" que derrubou uma potência militar no Sudão, um país com uma história marcada por golpes de Estado.
Para muitos deles, a mobilização a favor do exército, que reúne milhares de manifestantes, principalmente de províncias pobres e rurais do país, é um golpe em andamento.
- "Nosso árbitro é a rua" -
"Não há volta", gritavam como lema os manifestantes anti-exército, referindo-se a um período político recente dominado por islâmicos e militares.
"Eles têm o direito de expressar sua opinião", declarou Hamada Abderrahman, de 37 anos, um comerciante que se deslocou de uma província ao sul de Cartum para se unir à manifestação a favor das forças armadas.
"Mas, para nós, que somos quem têm razão, este governo não fez nada pelos sudaneses em dois anos", insiste Abderrahman.
"Nosso árbitro é a rua. Ela nunca mente", afirmou Al-Sadeq Jaafar, de 41 anos. "Se querem que os preços disparem e pessoas corruptas no poder, essa é sua escolha, nós não queremos", afirmou o manifestante pró-exército.