Por DW
Publicada em 18/11/2021 às 15h45
A líder exilada da oposição belarussa, Svetlana Tikhanovskaya, sentou-se na galeria dos visitantes do Bundestag na semana passada, enquanto o Parlamento alemão debatia a deterioração da situação na fronteira externa da União Europeia (UE), entre a Polônia e Belarus.
O clima no Parlamento era de emoção. Muitos deputados fizeram questão de não esconder sua indignação, mas, ainda assim, as demandas apresentadas durante a sessão de uma hora não conseguiram esconder o atual nível de impotência política do governo alemão em relação à crise em Belarus.
A situação na região fronteiriça piorou dramaticamente nos últimos dias. O líder belarusso, Alexander Lukashenko, é acusado pela UE de organizar o transporte em massa de cada vez mais migrantes de regiões em crise para o país e levá-las para a fronteira. Agora, essas pessoas estão bloqueadas na área. Grandes grupos de migrantes tentaram em vão seguidas vezes romper a cerca de arame farpado que a Polônia está usando para tentar impedi-los de entrar no país e, portanto, na UE.
"Desastre humanitário"
"Pelo menos dez pessoas perderam suas vidas", afirmou no Bundestag a deputada do partido A Esquerda Gökay Akbulut, que não responsabiliza apenas Belarus pela situação, mas também a Polônia. "Rejeitar pessoas que fugiram sem verificar individualmente seus procedimentos de asilo é uma violação clara das Convenções de Genebra, da Convenção Europeia sobre Direitos Humanos e das atuais leis de asilo na UE", advertiu Akbulut.
A líder da bancada parlamentar dos verdes, Franziska Brantner, falou em um desastre humanitário. "Lukashenko está instrumentalizando as pessoas levando-as de Damasco, Dubai, Istambul ou Moscou. Apesar disso, essas pessoas não são armas. São não moeda de troca. Elas são seres humanos com sua dignidade própria."
Merkel e Lukashenko falam por telefone
A chanceler federal alemã, Angela Merkel, discutiu duas vezes a situação com Lukashenko esta semana. A primeira vez foi na segunda-feira (15/11). Foi o primeiro telefonema desse tipo com um líder ocidental desde que Lukashenko reprimiu protestos em massa contra seu governo no ano passado.
O líder de Belarus disse que ele e Merkel concordaram que o impasse deve ser solucionado, mas ressaltou que tem pontos de vista "divergentes" dos de Merkel sobre como os migrantes chegaram a Belarus, enquanto o Ocidente diz que Minsk os levou para lá como forma de retaliação contra as sanções europeias.
De acordo com a agência de notícias estatal belarussa Belta, Merkel e Lukashenko concordaram durante um segundo telefonema nesta quarta-feira que a crise na fronteira entre Belarus e Polônia precisa ser resolvida pelo diálogo entre a UE e representantes belarussos. A agência ainda acrescentou que autoridades "dos dois lados começarão as negociações imediatamente".
O porta-voz do governo alemão, Steffen Seibert, disse que, durante o telefonema, a chanceler sublinhou a necessidade de ajuda humanitária e da organização de recursos para repatriação pelas Nações Unidas e pela UE para auxiliar as pessoas afetadas pela crise.
Nova política em relação à Rússia
Merkel também conversou com o presidente russo na última semana, pedindo a Vladimir Putin que intervenha no impasse entre Belarus e Polônia. "Falei com o presidente russo, Vladimir Putin, hoje e pedi para ele apelar ao presidente Lukashenko. Porque as pessoas estão sendo usadas, elas são vítimas de uma política desumana, e algo deve ser feito a esse respeito", disse ela na última quarta-feira (10/11), acrescentando que os problemas precisam ser resolvidos de uma forma "que seja humana, que é o que infelizmente não está acontecendo atualmente".
O tempo de Merkel como chanceler está acabando – os social-democratas do SPD, o Partido Verde e os liberais do FDP estão atualmente em negociações para formar um governo após as eleições de setembro passado na Alemanha. A deputada verde Brantner disse no Bundestag que uma das "grandes tarefas" do próximo governo será reavaliar a política em relação à Rússia.
Ela afirmou que Putin está encobrindo a "tentativa pérfida de chantagem" de Lukashenko e mantendo vivo o regime belarusso. "Devemos reduzir nossas vulnerabilidades e avançar uma nova política de diálogo e dureza", acrescentou.
Sanções também contra países de trânsito
Brantner pediu mais sanções – visando a indústria de potássio belarussa e também líderes políticos. "O Natal é o momento favorito para fazer compras em Munique e outras cidades alemãs, especialmente para a poderosa elite belarussa."
Também deve haver consequências para as companhias aéreas que transportam migrantes do Oriente Médio para Belarus. Brantner argumentou que esperava que o atual governo da Alemanha fizesse algo sobre isso o mais rápido possível.
O ainda ministro alemão do Exterior, Heiko Maas, prometeu exatamente isso, bem como consequências para os países de trânsito envolvidos. "Ninguém deveria poder participar das atividades desumanas de Lukashenko impunemente", disse ele.
Segundo Maas, não é simples sancionar as companhias aéreas, porque, tecnicamente, elas não estão infringindo nenhuma lei. "Mas informamos a todos que os Estados-membros da UE estão considerando seriamente a responsabilização daqueles que são cúmplices de um contrabandista", disse Maas. "Afinal, os direitos de aterrissagem são concedidos em cada país-membro individualmente."
Conservadores contra acolhida de migrantes
"O atendimento humanitário às pessoas na área da fronteira com Belarus tem prioridade", disse Maas. "Os valores fundamentais da União Europeia e de seus Estados-membros dizem que não devemos deixar as pessoas necessitadas sozinhas, e devemos também defender esses valores compartilhados em nossas fronteiras externas."
Falando em nome do grupo parlamentar conservador da União Democrata Cristã (CDU) e seu partido irmão bávaro, a União Social Cristã (CSU), o deputado Thorsten Frei pediu ao governo que apoie a Polônia na proteção da fronteira externa da UE.
Como último recurso, disse Frei, os controles de fronteira poderiam ser restabelecidos na região limítrofe entre a Alemanha e a Polônia, incluindo o envio de migrantes de volta para a Polônia, de acordo com o Regulamento de Dublin, que estabelece que as pessoas devem solicitar asilo no primeiro Estado membro da UE em que entrarem.
Frei defendeu que sob nenhuma circunstância os migrantes na região de fronteira devem ser distribuídos pela Europa. "É com isso que Lukashenko está contando. Isso aumentaria a pressão na fronteira polonesa e abriria uma fresta para a União Europeia. Essa é a coisa mais estúpida que se poderia exigir neste momento", disse Frei.
O partido ultradireitista Alternativa para a Alemanha (AfD) também vê dessa forma, usando o debate no Bundestag para divulgar sua mensagem antimigração mais uma vez. "A imigração não é um direito humano. A travessia ilegal da fronteira é um ato criminoso", disse o deputado da AfD Gottfried Curio, acrescentando: "A Polônia está protegendo a si mesma, a Alemanha e toda a UE".
A AfD apresentou uma moção parlamentar pedindo ao governo da Alemanha que apoie as medidas de Polônia, Hungria e outros Estados da UE "para evitar movimentos migratórios desestabilizadores". Segundo o partido, isso inclui o apoio à construção, ampliação e manutenção de cercas na fronteira.
Cortes possíveis no gás para a Europa?
No entanto, antes dos telefonemas com Merkel, Lukashenko chegou a ameaçar interromper o fornecimento de gás pelo gasoduto Yamal-Europa em resposta às mais recentes sanções da UE.
"Se eles impuserem sanções adicionais a nós... teremos de responder", disse Lukashenko, de acordo com a agência Belta. "Nós aquecemos a Europa, e eles estão nos ameaçando", afirmou, destacando que o gasoduto Yamal-Europa da Rússia passa por Belarus com destino à Polônia. "E se interrompermos o fornecimento de gás natural?", indagou.