Por EL País
Publicada em 22/11/2021 às 15h46
A Alemanha olha com preocupação sua vizinha Áustria, que nesta segunda-feira tornou-se o primeiro país europeu a confinar novamente sua população ante o intenso aumento dos contágios de coronavírus. A chanceler (primeira-ministra) interina alemã, Angela Merkel, advertiu nesta segunda-feira que a situação é “dramática” e acredita que será necessário impor restrições mais rigorosas que as atuais. As autoridades acordaram, semana passada, sobre a proibição da entrada dos não vacinados a restaurantes e estabelecimentos de lazer nas regiões onde a pressão sobre o sistema de saúde é mais elevada.
“As medidas atuais não serão suficientes”, afirmou Merkel numa reunião interna da liderança de seu partido, a União Democrata Cristã (CDU), segundo publicaram diversos jornais alemães. A evolução da pandemia “pode superar tudo o que vivemos até agora”, advertiu a chanceler.
A Alemanha tem uma das piores taxas de vacinação da Europa ocidental, com 68% de sua população completamente imunizada, em comparação com 80% da Espanha. Esse é um dos motivos do crescimento explosivo dos contágios ocorrido em meados de outubro. O sistema de saúde alemão, com fama de eficiente e bem equipado, já sofre as consequências de uma incidência exagerada. A falta de funcionários nas UTIs obrigou inclusive a transferência de pacientes a outros países. As cifras de ocupação hospitalar ainda não igualam as do inverno passado, mas há mais leitos fechados devido à escassez de enfermeiros.
As autoridades alemãs tentam convencer as pessoas que ainda não se vacinaram da importância de fazê-lo, por sua segurança e pela de toda a sociedade, enquanto o país continua registrando números recordes de novas infecções —nesta segunda-feira, a incidência semanal alcançou 386,5 casos por 100.000 habitantes—, e a saturação dos hospitais é percebida nos Estados do sul, como a Baviera (com vários distritos sem um único leito de UTI desocupado), e do leste, como a Saxônia. Essas duas regiões já adotaram medidas mais drásticas que os demais, como o fechamento dos lugares de lazer noturno e dos típicos mercados de Natal, que normalmente abrem nesta época.
Vacinado, recuperado ou morto
“Provavelmente, no final do inverno todo mundo na Alemanha estará vacinado, recuperado ou morto”, alertou também nesta segunda-feira o ministro interino da Saúde, Jens Spahn, num discurso muito mais dramático que os anteriores. “Existe um dever de solidariedade com a vacinação”, ressaltou Spahn numa coletiva sombria em Berlim, após qualificar a situação como “muito grave”.
Spahn, acompanhado pelo imunologista do hospital berlinense Charité Leif Erik Sander e pelo presidente do Instituto Paul Ehrlich, Klaus Cichutek, pediu que toda a população tome a terceira dose da vacina. A campanha para a aplicação dessa nova injeção está muito lenta porque diversos centros foram fechados após o verão em muitas regiões, e agora são os médicos de família que devem vacinar em suas consultas.
O debate sobre a obrigatoriedade geral da vacina está quente num país que até semanas atrás era quase unanimemente contra, apesar da baixa taxa de vacinação. O presidente da Baviera, o conservador Markus Söder, é a favor de impor a inoculação a toda a população. Spahn, por sua vez, afirma que a discussão pode ser adiada, pois o mais urgente agora é romper as cadeias de transmissão —e uma vacina obrigatória não conseguirá isso. A solução é reduzir os contatos, disse ele.
A frase sobre os “vacinados, recuperados ou mortos” é uma versão que circulou nos últimos dias nas redes sociais da chamada “regra 3G”, aplicada no interior de bares e restaurantes. Apenas aqueles que demonstrem que foram vacinados (geimpft, em alemão), curados (genesene) ou com teste negativo (gestestet) podem participar da vida social sem restrições. Nos últimos dias, tem sido usada uma versão modificada da frase —”geimpft, genesene, gestorben (morto)”— para alertar sobre as consequências de não se vacinar. A “regra 3G” será aplicada em breve também no transporte público, e já há Estados, como Berlim e Saxônia, onde funciona a “regra 2G”, ou seja, somente vacinados ou curados podem entrar nos lugares públicos.
Confinamento na Áustria
Na Áustria, o confinamento entrou em vigor nesta segunda-feira entre a surpresa de muitos e a insatisfação de outros, que durante o fim de semana saíram às ruas para protestar contra a decisão do Governo. As escolas estão abertas, mas quase tudo está fechado: lojas não essenciais, restaurantes, bares, mercados de Natal, salões de beleza e centros de estética. O confinamento no centro da Europa não significa o mesmo que na Espanha. Os austríacos, como os alemães no inverno passado, podem sair para ir ao trabalho ou ao médico, praticar esportes ou passear, mas as autoridades insistem que é preciso ficar em casa e fazer teletrabalho na medida do possível.
Nenhum país europeu precisou recorrer ao confinamento —embora restaurantes e lojas tenham sido fechados, como ocorreu na Eslováquia dias atrás— desde as campanhas de vacinação maciça. Para a Áustria, que nesta segunda registrou 13.806 novos contágios (a cifra mais alta numa segunda-feira desde o início da pandemia), este é o quarto confinamento. Durará previsivelmente 20 dias, embora esteja prevista uma avaliação na metade do período.
Nas regiões de Alta Áustria e Salzburgo, os profissionais de saúde alertaram durante várias semanas sobre a saturação das UTIs, que ficaram sem leitos disponíveis. O Governo austríaco atribui a situação à baixa taxa de vacinação do país. Dos 8,9 milhões de habitantes, cerca de dois milhões não tomaram imunizante mesmo tendo acesso. A incidência semanal na Áustria aumentou para 1.107 casos por 100.000 habitantes, três vezes mais que a média alemã. O Governo anunciou uma lei que tornará obrigatória a vacinação em fevereiro.