Publicada em 30/03/2022 às 13h42
À ‘toque de caixa, de forma precipitada, o prefeito Hildon Chaves atua para leiloar o fornecimento de água tratada e a coleta/tratamento do esgoto sanitário da Capital, atualmente sob a responsabilidade da CAERD.
Com todo o respeito ao nosso alcaide, mas parece que ele está querendo “criar uma jabuticaba”, aquela fruta que só existe no Brasil; ou seja, está conduzindo um processo de licitação diferente do que foi ou está sendo feito em todas as capitais e grandes cidades do Brasil.
É importante esclarecer que no contexto atual, lamentavelmente, estaria inviabilizado a continuidade do sistema de saneamento básico sob o comando da CAERD, tendo em vista os estragos causados pelas diretorias que comandaram a companhia, com raríssimas exceções, desde a sua fundação.
Portanto, o que se analisa no presente artigo não é se o saneamento básico vai sair ou não do controle da CAERD, mas sim qual o modelo de concessão vai ser adotado para transferir para iniciativa privada, o que resultará numa privatização.
Outro ponto fundamental é a situação dos empregados da CAERD, que é da responsabilidade do Estado, os quais deveriam entrar num sistema de Plano de Demissão Incentivada (PDV), como aconteceu com o extinto BERON, e/ou serem incorporados por uma nova autarquia estadual, como foi feito em tempos recentes no Piauí.
Um outro aspecto que causa muitas dúvidas são os papéis do município e da CAERD em relação ao saneamento básico, onde a prefeitura é dona da concessão, que atualmente encontra-se cedida à CAERD, e será retomada, esta que apenas administra o sistema, como o fará uma futura empresa privada que vença o leilão.
Entretanto, as estações de tratamento, canalizações, reservatórios, sedes administrativas e inúmero bens móveis e imóveis utilizados pela CAERD constituem patrimônio da Companhia, portanto do Estado. Ao retomar a concessão a prefeitura não se torna dona deste patrimônio, que precisará ser indenizado.
Por esta dualidade: município dono da concessão e CAERD dona de todo o patrimônio que trata e distribui água tratada, situação que se repete em todos municípios do Brasil, o caminho mais viável é uma parceria Estado, Prefeitura e BNDES.
O novo marco regulatório instituído pela Lei nº 14.026/2020 estabelece como meta do Governo Federal é alcançar a universalização dos serviços de saneamento básico até 2033, garantindo que 99% da população brasileira tenha acesso à água potável e 90%, ao tratamento e à coleta de esgoto.
A partir deste novo marco regulatório o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) passou a investir nos processos de concessão/privatização, coordenando estudos e disponibilizando financiamentos.
Rio de Janeiro, Alagoa e Amapá são exemplos recentes de privatização sob a coordenação do BNDES, com parceria dos estados e municípios. Este modelo poderá contar com financiamentos de instituições financeiras do Governo Federal, como Banco do Brasil, Caixa Econômica e, principalmente, do próprio BNDES.
Este modelo resolve um dos principais gargalos do processo: o patrimônio das companhias estaduais, como a CAERD, pois o Estado de Rondônia realizaria uma parceria com a prefeitura e o BNDES. Já “jabuticaba” do prefeito e seus burocratas mirabolantes, está excluindo o Estado e o BNDES.
Tudo isso gera duas consequências que, a médio e longo prazos, levarão o sistema à falência: a prefeitura e/ou a empresa vencedora do leilão terão que indenizar o patrimônio da CAERD encarecendo o custo final do serviço e, por outro lado, Porto Velho não terá acesso à financiamentos de bancos públicos no saneamento básico.
A “jabuticaba” do prefeito Hildon é semelhante à situação de Manaus, que em 2000 privatizou o saneamento básico, o qual, devido a ausência de financiamentos, está completamente falido e só funciona com a ajuda do Governo do Estado, que construiu com financiamento da Caixa Econômica uma estação de tratamento.
A prefeitura alardeia que entrar na parceria com o Governo de Rondônia e o BNDES poderia atrasar em uns dois anos a nova concessão/privatização; entretanto, como aconteceu em Manaus, nas próximas décadas a falência do sistema causará um prejuízo imensamente maior, e praticamente irreversível.
Para concluir: ou o prefeito Hildon e seus burocratas estão certos e todas as demais capitais e grandes cidades do Brasil estão erradas, ou teremos uma imensa jabuticaba, falida, que só existirá aqui em Porto Velho.
* Itamar Ferreira é advogado.