Publicada em 17/03/2022 às 14h15
Segundo revelações exclusivas do site investigativo francês Mediapart, nada menos do que 10 Estados europeus exportaram armas para a Rússia, após o embargo de 2014, incluindo mísseis, aviões, foguetes, torpedos e bombas. Estes países, incluindo a França no topo da lista, exportaram € 346 milhões em equipamentos militares, de acordo com dados públicos analisados pela organização Investigate Europe. Algumas dessas armas poderiam estar sendo utilizadas no front ucraniano neste exato momento.
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O site investigativo francês Mediapart abre as revelações do relatório da Investigate Europe em tom de ironia, lembrando que se há uma semana Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, celebrava a "união europeia" contra a "ameaça de Vladimir Putin", há pouco menos de um ano "Putin e seu exército não eram o inimigo número 1".
"Um terço dos Estados membros da União Europeia (UE) exportou armas para a Federação Russa entre 2015 e 2020, segundo dados do COARM, analisados pelo [grupo de jornalistas independentes] Investigate Europe (IE)", lembra Mediapart. O COARM é o poderoso grupo de trabalho do Conselho Europeu sobre exportação de armas convencionais. A cada ano, os 27 países da UE têm que comunicar seus números de exportação ao organismo", diz o site francês, que afirma basear sua análise nesses dados oficiais.
O relatório informa que, entre 2015 e 2020, França, Alemanha, Itália, Áustria, Bulgária, República Tcheca, Croácia, Finlândia, Eslováquia e Espanha exportaram € 346 milhões em "equipamento militar" para a Rússia de Putin. No entanto, desde julho de 2014, um embargo do bloco proíbe a venda de armas à Rússia, causado pela anexação da Crimea e ao estabelecimento das duas repúblicas separatistas de Donbass, cerca de seis meses antes. No entanto, o comércio de armas continuou ativo durante os cinco anos que se seguiram, lembra a mídia francesa.
A França no topo da lista
Mediapart ressalta que, como revelado pela mídia francesa especializada em investigações Disclose na segunda-feira (14), a França vendeu € 152 milhões de equipamentos militares para a Rússia. Este número é confirmado pela análise da organização Investigate Europe, que posiciona a França muito à frente de seus vizinhos europeus com 44% das armas europeias enviadas para a Rússia.
De acordo com a investigação do Mediapart, as autoridades francesas deram seu acordo já em 2015 para a exportação de equipamentos como "bombas, foguetes, torpedos, mísseis e cargas para explosivos", mas também "equipamentos de imagem e aeronaves".
De acordo com a investigação da Disclose, as exportações francesas também incluem "câmeras de imagem térmica para equipar mais de 1.000 tanques russos, bem como sistemas de navegação e detectores infravermelhos para caças e helicópteros de combate".
A contradição dos líderes da UE com a foto de família "Todos contra Putin" é "evidente", segundo Mediapart: os equipamentos vendidos para a Rússia poderiam estar a bordo dos veículos blindados, caças e helicópteros no front ucraniano. "Os mesmos que atualmente aterrorizam civis e combatentes de Lviv a Mariupol", diz o site francês.
Alemanha em segundo lugar, seguida da Itália
A Alemanha também não fica para trás nas exportações para a Rússia, segundo Mediapart. De acordo com informações coletadas pelo Investigate Europe, o país exportou € 121,8 milhões para a Rússia, ou seja, 35% do total das exportações européias, colocando-a em segundo lugar logo atrás da França.
Atualmente um dos países mais solidários com a Ucrânia na Europa - "com enormes manifestações e vontade de acolher refugiados por seus cidadãos", lembra o site - a Alemanha autorizou o envio de navios quebra-gelos e veículos "com proteção especial" para a Rússia. As exportações alemãs, no entanto, poderiam entrar na categoria de "dupla utilização" (militar e civil), o que explicaria o porquê de não constituírem uma violação do embargo, segundo políticos e especialistas contatados pelo IE.
Em terceiro lugar, atrás da França e da Alemanha, vem a Itália com € 22,5 milhões em equipamentos militares para a Rússia, "de acordo com o banco de dados COARM, entre 2015 e 2020". Segundo a investigação doMediapart, este número corresponde a um único contrato com o fabricante Iveco para veículos terrestres.
O Investigate Europe teve acesso à "autorização final" emitida pelo Ministério das Relações Exteriores da Itália, (na época, Paolo Gentiloni, atual Comissário Europeu). "Seis anos depois, estes veículos de guerra, produzidos nas três fábricas da Iveco na Rússia, mas com todas as peças italianas, estão na frente ucraniana. Segundo o canal de televisão italiano LA7, estes veículos Lince foram vistos na Ucrânia no início de março", publica o site francês.