Publicada em 09/05/2022 às 15h13
A possibilidade de a eleição de outubro ser decidida no primeiro turno e a busca de criação de uma frente antibolsonarista fizeram com que Lula, em seu discurso de sábado (7), adotasse temas, abordagens e cores mais compatíveis com os que o PT costuma usar na disputa da rodada final.
O verde e amarelo ocupou o lugar tradicionalmente ocupado pelo vermelho nessa fase da campanha; o gosto do chuchu alckimista amenizou o sabor forte e característico do molusco petista. A palavra amor foi citada duas vezes – o ódio, seu contraponto, também foi lembrado, numa associação com o governo Jair Bolsonaro. Em 2002, Lula dizia que a esperança venceria o medo; agora prega que o amor vai derrotar o ódio.
Ainda com referências a temas tradicionais da esquerda – defesa de estatais, de aumentos reais de salários, críticas a mudanças na legislação trabalhista – o discurso lido pelo ex-presidente não falou em reverter a independência do Banco Central nem em revogar a reforma trabalhista aprovada no governo Michel Temer. Ele disse que iria estimular “a negociação em bases civilizadas e justas entre patrões e empregados”.
Citou os casos de assassinatos de mulheres, mas passou ao largo do tema do aborto. Segundo ele, seus governos foram marcados pelo diálogo, numa outra tentativa de marcar diferença em relação ao mandato do atual presidente.
A ausência, até aqui, de outras candidaturas viáveis fortalece a polarização com Jair Bolsonaro e aumenta a chance de um deles conquistar, em 2 de outubro, a metade mais um dos votos válidos, o que impediria um segundo turno. No sábado, Lula tratou de vender uma imagem de conciliador – mais do que o apoio formal do PSOL, o abraço na ex-prefeita Luiza Erundina selou a aliança com o PSOL.
Garantido o apoio da esquerda, Lula vai em busca do eleitor conservador. O tom ameno tenta impedir que Ciro Gomes se apresente como uma versão light da esquerda (um figurino que, pelo próprio temperamento, o próprio pedetista tem dificuldade de vestir; ele também já se disse contra a independência do BC). Serve também de aceno para os políticos que ainda tentam viabilizar uma terceira via. Como verbalizou Geraldo Alckmin, Lula seria assim a única via.
Por falar nisso. A decisão de Luciano Bivar (União Brasil) de reafirmar sua pré-candidatura à Presidência praticamente sepultou a possibilidade de uma união de candidatos de centro direita, pelo menos, neste momento. Segundo o presidente de um dos partidos envolvidos na negociação, a unificação, se vier, ocorrerá no segundo semestre, com as campanhas nas ruas.
Ao bancar a própria candidatura, Bivar surpreendeu o MDB, que contava com ele para ocupar o cargo de vice na chapa da senadora Simone Tebet. Como na canção de Chico Buarque, Bivar se acostumou à fantasia de candidato a presidente.
Houve também argumentos menos lúdicos. O governo mandou dizer que, em caso de aliança com o MDB, haveria mudança no comando da poderosa Codevasf, Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba, principal destino das verbas destinadas por deputados e senadores por meio do orçamento secreto. O presidente da empresa foi indicado pelo deputado federal Elmar Nascimento (União Brasil-BA). Um tipo de recado que desestimula qualquer tentativa de rebelião.