Publicada em 02/06/2022 às 08h58
Em seu primeiro discurso público em seis meses, ex-chanceler federal repudia guerra de agressão contra Ucrânia e diz apoiar a atuação do atual governo alemão e do Ocidente em relação a Moscou.
A ex-chanceler federal alemã Angela Merkel rompeu nesta quarta-feira (01/06) seu silêncio e classificou o ataque russo contra a Ucrânia como "uma violação flagrante" do direito internacional e uma "ruptura profunda" na história da Europa depois da Segunda Guerra Mundial.
Em seu primeiro discurso público em seis meses, Merkel, que tem se mostrado relutante em se manifestar publicamente, expressou sua solidariedade à Ucrânia, afirmando que o país "foi atacado e invadido pela Rússia" e que apoia seu "direito à autodefesa".
Apoio ao atual governo
Merkel disse apoiar também os esforços empreendidos pelo atual governo alemão, liderado por Olaf Scholz, assim como o papel da União Europeia, dos Estados Unidos e aliados da Otan, do G7 e também da ONU, "para garantir que se pare esta bárbara guerra de agressão da Rússia".
As declarações de Merkel foram feitas diante de 200 convidados em um evento de despedida realizado em Berlim para o líder sindical Reiner Hoffmann, que recentemente deixou o cargo de presidente da influente Confederação Alemã de Sindicatos (DGB).
Merkel acrescentou que as consequências da guerra serão "de longo alcance", especialmente para o povo ucraniano, mas também para o continente.
Solidariedade é "raio de esperança"
Além disso, ela enfatizou os abusos de direitos humanos perpetrados contra civis em território ucraniano. "Bucha é a representação desse horror", disse.
Em cidades como Bucha e Irpin, atrocidades cometidas vieram à tona após a retirada das tropas russas. As fotos de cidadãos assassinados e relatos de estupros chocaram o mundo. O Tribunal Penal Internacional (TPI), sediado em Haia, na Holanda, enviou investigadores à Ucrânia para investigar supostos crimes de guerra.
Por fim, Merkel afirmou que há "um pequeno raio de esperança" nessa "tristeza infinita", devido ao enorme apoio aos ucranianos que muitos países vizinhos, como Polônia e Moldávia, demonstraram. "Jamais devemos considerar paz e liberdade como garantidas", concluiu a ex-chanceler.
Na próxima semana, em 7 de junho, Merkel deverá fazer um novo discurso político, quando participará de uma mesa redonda em Berlim. Na ocasião, é esperado que a ex-chanceler se expresse mais detalhadamente sobre a Rússia e as relações da Alemanha com o presidente russo, Vladimir Putin, abordando possíveis erros de julgamento durante seus anos como chefe de governo.
Próprios erros
Até agora, Merkel não comentou seus próprios erros. Outros ex-políticos de alto escalão, como o atual presidente alemão, Frank-Walter Steinmeier – por anos ministro do Exterior de Merkel –, admitiram publicamente sua responsabilidade sobre a política alemã em relação a Moscou. "Eu estava errado", disse Steinmeier publicamente.
Seu ex-ministro do Exterior, o social-democrata Sigmar Gabriel, também reconheceu falhas na política alemã de reconciliação com a Rússia praticada na gestão passada.
Merkel foi repetidamente criticada pelos Estados Unidos e outros países por apoiar o gasoduto Nord Stream 2, projetado para entregar gás russo diretamente para a Alemanha. O sucessor de Merkel, Olaf Scholz, engavetou o projeto após a invasão russa.
Ela também enfatizava a necessidade de continuar conversas com o presidente russo, Vladimir Putin, mesmo após a anexação da Crimeia e do conflito no leste da Ucrânia que levou a sanções ocidentais.
Embora Merkel tenha feito uma breve declaração logo após a invasão da Rússia em fevereiro, dizendo que não havia justificativa para a flagrante violação do direito internacional, seu silêncio desde então vinha provocando surpresa.
Enfrentando críticas de que a Alemanha está fazendo muito pouco para ajudar a Ucrânia, Scholz disse na quarta-feira que a Alemanha vai fornecer ao país o sistema de defesa aérea Iris-T.
Na noite de quarta-feira, a comissão parlamentar do orçamento abriu caminho para que os planejados 100 bilhões de euros de reforço para as Forças Armadas da Alemanha recebam o aval do Parlamento nesta sexta-feira.