Publicada em 01/07/2022 às 09h20
O líder supremo do movimento Talibã, Hibatullah Akhundzada, pediu nesta sexta-feira (1) ao mundo que pare de "interferir" nos assuntos do Afeganistão e afirmou que a aplicação da lei islâmica é a chave para o sucesso do país.
Akhundzada, que normalmente vive afastado da vida pública, discursou em Cabul, durante uma assembleia de autoridades religiosas convocada pelo regime para consolidar seu poder.
"Eles dizem 'por que não fazem isto, por que não fazem aquilo?' Por que o mundo interfere em nosso trabalho? Não aceitaremos ordens de ninguém. Apenas nos curvaremos a Alá Todo-Poderoso", disse Akhundzada em um discurso de uma hora transmitido pela rádio estatal.
Mais de 3.000 religiosos e líderes tribais estão reunidos desde quinta-feira na capital afegã para um conselho de três dias que pretende legitimar o regime talibã.
A imprensa, que não foi autorizada a comparecer ao evento, especulou durante vários dias sobre a possível participação de Akhundzada no conselho.
O líder do Talibã não havia sido filmado ou fotografado em público desde a chegada ao poder do movimento fundamentalista em agosto do ano passado. Apenas mensagens de áudio de Akhundzada, foram divulgadas, mas sem a possibilidade de verificação por fontes independentes.
Apesar da discrição, Akhundaza, que de acordo com algumas estimativas tem mais de 70 anos, mantém, segundo analistas, um controle rígido sobre o movimento e ostenta o título de "Comandante dos Fiéis".
O líder disse que o sucesso do regime dependerá de sua capacidade de romper com "a corrupção, o egoísmo, a tirania, o nacionalismo e o nepotismo", características, segundo ele, dos governos que se sucederam nas últimas duas décadas no Afeganistão, após a etapa anterior do Talibã no poder (1996-2001).
- Sem mulheres -
Para conseguir, "chegou o momento de aplicar a 'sharia' (lei islâmica)", disse.
"Com a sharia teríamos segurança, liberdade, um sistema islâmico e tudo o que precisamos", acrescentou.
A assembleia, a mais importante desde que o Talibã retornou ao poder, acontece uma semana depois de um terremoto que deixou mais de 1.000 mortos e dezenas de milhares de desabrigados no leste do país.
A participação das mulheres foi vetada na assembleia. Os talibãs consideraram que não era necessário porque elas seriam representadas pelos homens de suas famílias.
Uma fonte talibã disse à AFP no início da semana que os participantes do conselho teriam permissão para criticar o governo e que alguns temas delicados, como a educação das mulheres - objeto de debate inclusive dentro do movimento -, estariam na agenda.
No fim de março, o Talibã fechou as escolas de Ensino Médio para as meninas, poucas horas depois da reabertura. A decisão foi uma ordem de Akhundzada, de acordo com várias fontes do movimento.
Akhundzada não citou o tema em seu discurso.
- "Não pode haver reconciliação" -
Os talibãs retornaram em grade medida à interpretação extremamente rigorosa que marcou seu primeiro período no poder.
Eles restringiam os direitos das mulheres, que foram excluídas dos cargos públicos e forçadas a usar o véu integral em público.
Também proibiram música não religiosa, a representação de rostos humanos em anúncios publicitários e a exibição de filmes ou séries em que aparecem mulheres sem véu. E pediram aos homens que usem roupas tradicionais e deixem a barba crescer.
Akhundzada disse aos participantes do conselho que os países não muçulmanos nunca aceitarão um Estado genuinamente islâmico e pediu que estejam preparados para enfrentar muitas dificuldades.
"Não pode haver reconciliação entre o islã e os 'kafirs' (infiéis). Nem no passado, nem agora", afirmou.
Apesar das fortes medidas de segurança ao redor da assembleia, na quinta-feira dois homens armados conseguiram se aproximar da Universidade Politécnica de Cabul, local do encontro, e foram mortos.
Fontes talibãs afirmaram que os dois abriram fogo a partir do teto de um imóvel próximo, mas foram "eliminados rapidamente".