Publicada em 12/08/2022 às 09h18
Nações Unidas propõem zona desmilitarizada no entorno da usina de Zaporíjia, após Moscou e Kiev se acusarem mutuamente de bombardear complexo nuclear. Chefe da AIEA diz que situação "está se deteriorando rapidamente".
Rússia e Ucrânia voltaram a se acusar mutuamente de bombardear a usina nuclear de Zaporíjia, a maior da Europa, atualmente sob controle russo. Em meio a temores de um desastre, a ONU propôs uma zona desmilitarizada no local, e Kiev exigiu a retirada das forças russas.
A agência nuclear ucraniana Energoatom afirmou que o complexo nuclear de Zaporíjia, localizado no sul da Ucrânia, foi atingido cinco vezes nesta quinta-feira (11/08), inclusive nas proximidades do local de armazenamento de materiais radioativos.
As autoridades russas, por sua vez, afirmaram que tropas ucranianas bombardearam a usina duas vezes, interrompendo uma troca de turno, segundo a agência de notícias russa TASS.
Em reunião do Conselho de Segurança da ONU nesta quinta, o diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), Rafael Grossi, pediu a Moscou e Kiev que permitam imediatamente que especialistas em energia nuclear inspecionem a usina e avaliem os danos, segurança e proteção no extenso complexo nuclear, onde a situação "vem se deteriorando muito rapidamente".
Grossi afirmou que as declarações de Rússia e Ucrânia "são frequentemente contraditórias", e a AIEA não pode corroborar fatos importantes a menos que seus especialistas visitem o complexo nuclear de Zaporíjia.
Ele apontou que, devido a bombardeios e várias explosões na usina na última sexta-feira, um dos reatores nucleares da usina teve que ser desligado.
Na reunião, o secretário-geral da ONU, António Guterres, pediu a ambos os lados que parassem com todos os combates nos arredores da usina. "A instalação não deve ser usada como parte de nenhuma operação militar", disse Guterres comunicado. "Em vez disso, é necessário um acordo de nível técnico urgente sobre um perímetro seguro de desmilitarização para garantir a segurança da área."
A Rússia ocupou Zaporíjia em março, após invadir a Ucrânia em 24 de fevereiro. A usina, próxima à linha de frente dos combates, está sob o controle das forças russas, mas é operada por trabalhadores ucranianos.
No encontro do Conselho de Segurança, os EUA apoiaram o apelo por uma zona desmilitarizada e instaram a Agência Internacional de Energia Atômica a visitar o local.
"Catástrofe comparável a Tchernobyl"
O embaixador da Rússia na ONU, Vasily Nebenzia, disse que o mundo está sendo empurrado para "a beira de uma catástrofe nuclear comparável a Tchernobyl" e acrescentou que funcionários da AIEA poderão visitar o local ainda neste mês.
Assim como a AIEA, a agência de notícias Reuters afirmou que não conseguiu verificar de forma independente os relatos de ambos os lados sobre as condições na usina de Zaporíjia.
O presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, exigiu que a Rússia devolvesse o controle da usina à Ucrânia. "Apenas a retirada total dos russos e a restauração do controle total ucraniano sobre a situação em torno da usina podem garantir a retomada da segurança nuclear para toda a Europa", disse Zelenski em vídeo.
A França repetiu a exigência de Zelenski e disse que a ocupação russa do local colocou o mundo em perigo. "A presença e os movimentos das Forças Armadas russas perto da usina aumentam significativamente o risco de um acidente com consequências potencialmente devastadoras", afirmou o Ministério do Exterior francês em comunicado.
Kiev acusa Moscou de disparar mísseis a partir da usina nuclear capturada contra cidades do entorno, sabendo que seria muito arriscado para as forças ucranianas contra-atacarem. Ao menos 13 pessoas foram mortas nesta quarta num desses bombardeios contra o distrito de Nikopol, segundo autoridades locais.
Nesta sexta-feira, o Estado-Maior ucraniano relatou ataques aéreos das forças russas em dezenas de cidades e bases militares, principalmente no leste do país.
Bombardeios frequentes contra usina
Os seguidos bombardeios à usina de Zaporíjia nos últimos dias provocaram alarme na comunidade internacional e na AIEA. A Energoatom afirmou que ataques realizados na noite do último sábado por militares russos danificaram três sensores de radiação da usina.
De acordo com a empresa, o bombardeio atingiu as instalações de armazenamento seco, onde ficam 174 contêineres com tubos de combustível nuclear já usados. A Rússia, por sua vez, disse que os militares ucranianos haviam atingido a instalação nuclear usando um sistema de lançamento múltiplo de foguetes de 220 mm.
O complexo nuclear tem seis reatores e é capaz de gerar 5.700 megawatts e, no momento, três deles estão em operação. Segundo especialistas, se a usina perder a energia da rede, há risco de os geradores e baterias de backup não serem suficientes para resfriar os reatores e os reservatórios de combustível radioativo.
Somam-se a essas preocupações as suspeitas de que as forças russas estariam usando Zaporíjia como depósito de armas e cobertura para o lançamento de ataques.
Em 4 de março, no início da ocupação russa, houve um incêndio na usina após um bombardeio russo, que foi controlado duas horas e meia depois e provocou pânico sobre a possibilidade de um desastre nuclear.