Publicada em 26/08/2022 às 09h01
Passados quase oito anos da criação da Comissão de Transposição, ainda continua sem resposta por parte do Ministério da Economia questões importantes, como a escolaridade, o cumprimento do Acórdão do Tribunal de Contas da União e ainda há regulamentos pendentes de decisão. A falta de resposta concreta sobre esses temas criou uma enorme interrogação (?) na cabeça de milhares de servidores e sem perspectiva de se ter o esclarecimento, uma vez que a Comissão está cada vez mais encastelada, trabalhando mais para dentro dos muros da Esplanada dos Ministérios e o seu único sinal de existência é a publicação das atas semanais.
Vamos aos fatos: uma alteração recente sobre a comprovação da escolaridade trazida pelo Decreto nº 11.116, permite aplicar a regra que considera a formação escolar do cargo ou emprego no qual a pessoa foi contratada, mesmo que o vínculo tenha sido encerrado, com a condição de o empregado comprovar que concluiu a referida escolaridade até a data da entrega do requerimento de opção. Esse mesmo critério já era aplicado para os empregados que tiveram vínculo com empresas públicas e sociedades de economia mista que foram contratados e continuam no vínculo atualmente. Esse requisito vale também para os empregados do Amapá e de Roraima e tem provocado muita confusão nos três estados, pois nem a Comissão de Transposição consegue explicar com clareza como será feita essa aplicação, já que é patente o amadorismo de quem redigiu o dispositivo, pois a técnica redacional aplicada na elaboração foi imprecisa e enseja múltiplas interpretações.
Publicamos matéria em julho, onde abordamos esse tema da necessidade ou não de comprovação do nível de escolaridade para efeito de transposição. Naquela ocasião mostramos a divulgação de mensagens confusas produzidas por parlamentares, assessores e pelo próprio presidente da Comissão em que, como autores dos vídeos eles afirmaram que o Decreto 11.116 e o Acordão do Tribunal de Contas da União aboliram a exigência de escolaridade. Ou seja, no entender dos parlamentares e seus assessores, qualquer servidor poderia entrar no quadro da União, sem apresentar certificado ou diploma exigido para o cargo. Outra opinião sem fundamento partiu de um gestor do Ministério da Economia, que comentou que o direito dos professores leigos estava resolvido pela existência do termo “pessoal dos ex-Territórios” escrito na ementa do Decreto, comentário este que aumentou ainda mais a confusão e desinformação acerca da escolaridade.
A abordagem da escolaridade, no caso de Rondônia é mais amena, haja vista que somente as empresas públicas e sociedades de economia mista têm direito a transposição pela Emenda Constitucional nº 98. Porém, entre os servidores do Amapá e de Roraima o debate está bastante acirrado. A expectativa é de que nos próximos dias será publicada uma portaria da Secretaria de Gestão que poderá desvendar todos os mistérios que cercam o tema da escolaridade, para fazer uma espécie de tradução do decreto.
Não bastassem os vídeos produzidos antes e após a publicação do decreto, por parlamentares de Roraima, que contou com a presença do presidente da Comissão e culminou na divulgação de informações equivocadas sobre a questão da escolaridade, nesta semana, nos deparamos com a veiculação em grupos de Whatsapp nos três estados, de outros dois vídeos gravados por um senhor que aparentemente representa um parlamentar de Roraima. Esses vídeos que foram espalhados nos mais diversos grupos, só serviram para deixar o tema da escolaridade e da decisão do TCU ainda mais confusos na cabeça dos servidores. Basta dizer que as explicações do autor do vídeo não seguem minimamente nenhuma coerência técnica que possa orientar adequadamente a aplicação do decreto ou do Acordão. Primeiro porque, a maior ênfase do autor foi de puxar a paternidade do decreto para o parlamentar ao qual ele diz representar, quando todos sabem que a questão da escolaridade é uma demanda coletiva, construída na mobilização de parlamentares dos três extintos Territórios, inclusive de Rondônia
Em um dos vídeos, seu autor diz claramente que o Acordão do TCU “derruba a escolaridade”, quando a decisão do Tribunal não faz qualquer referência ao item escolaridade, além do que, o TCU tem suas competências constitucionais e regimentais bem definidas e não cabe a esse órgão de controle criar regra para suprimir a exigência de escolaridade para cargos ou empregos públicos. Na verdade, a publicação do decreto em julho foi a concretização de um trabalho conjunto de deputados e senadores de Rondônia, Amapá e Roraima, que estão nessa luta pela alteração do critério da escolaridade há bastante tempo.
E o que causa estranheza é que o autor do vídeo criou um novo parâmetro interpretativo, afirmando que vale a “escolaridade que a pessoa tem e não a que deveria ter”, ou seja, uma explanação que não combina com uma adequada leitura do decreto, quando se constata que o ato normativo se refere a escolaridade que é exigida para o cargo ou emprego de origem, conforme a classificação escolar de níveis médio, superior ou auxiliar. Na visão dele os servidores apresentariam apenas o diploma de escolaridade que possuem hoje, com direito de serem transpostos para cargos correspondentes a formação escolar atual. A explicação dos vídeos revela-se bastante confusa e nada esclarecedora, requerendo uma explicação mais clara e transparente do decreto.
Com tanta controvérsia, cabe até uma proposta para a Secretaria de Gestão-SGP, no sentido de que no âmbito de sua competência de gestora de pessoal do governo federal, possa elaborar um documento ou uma nota, a ser enviada às representações do Ministério da Economia nos estados, com esclarecimentos detalhados que possam orientar a todos os servidores dos ex-Territórios, quanto a aplicação do critério da escolaridade previsto no decreto e se for o caso, esclareça ainda o teor do Acórdão do Tribunal de Contas da União.
Não é plausível que a Secretaria, com toda a estrutura que possui continue omissa no papel de explicar como se dará a aplicação de um ato normativo ou de uma decisão do TCU, que envolve o direito de milhares de pessoas que estão com dúvidas de toda ordem, pois a persistir esse silêncio institucional, aparecerão mais e mais espertalhões de plantão, que via de regra são pessoas despreparadas que mais confundem os servidores. E, em plena vigência do período eleitoral é impensável assistirmos a vídeos, onde claramente o autor, com certo tom de arrogância e prepotência tenta explicar a aplicação, no caso concreto, de um normativo que foi produzido por gestores e assinado pelo Chefe do Poder Executivo Federal.
Basta verificar que o autor do vídeo, menciona que a formatação do decreto presidencial foi idealizada pelo parlamentar que ele representa, nos seguintes termos “o decreto quando foi pensado pelo senador”, “O senador usou na justificativa do decreto dele”. Diante dos trechos em destaque fica a pergunta: o decreto é de um parlamentar? Essa parece ser uma informação fantasiosa ou até mesmo uma propaganda enganosa, que pode ter o propósito de influenciar o processo eleitoral em curso no estado do autor dos vídeos.
Outrossim, o contexto em que os vídeos foram produzidos, enseja que pode estar ocorrendo uma irregularidade ou no mínimo uma impropriedade, haja vista que estamos em plena vigência de uma regra de vedação eleitoral, na qual é proibido aos gestores públicos, de qualquer esfera de poder estadual e federal realizar tratativas com representantes de partidos ou mandatos políticos ou com candidatos, pois tais relações podem desequilibrar a balança eleitoral em favor de candidatos ou aliados que tiverem proximidade com gestores públicos, ainda mais se considerado o tema transposição, que envolve o interesse de milhares de servidores.
Diante da afirmação no vídeo de que “reuniões foram feitas na semana passada” ou seja, na semana de 15 a 19 de agosto, fica a seguinte pergunta para as autoridades do Ministério da Economia, ou mesmo para o Ministério Público Eleitoral: Pode uma pessoa que se diz representante de um parlamentar, que é do poder legislativo, afirmar que participou durante o período eleitoral, de reuniões com gestores do Ministério da Economia para unificar entendimento em torno da elaboração de atos normativos relativos à transposição de servidores nesses estados? Na hipótese de serem confirmadas tais reuniões, se faz oportuna a pergunta: a função normativa é ou não privativa dos técnicos da Secretaria de Gestão?
Esses esclarecimentos são importantes, pois caso venha a se confirmar o que foi dito nos vídeos estar-se-á diante de uma conduta atípica, que precisará ser esclarecida pelo Secretário, tendo em vista que outras lideranças e representantes de entidades dos ex-Territórios têm recebido a orientação da Secretaria, de que a Comissão e demais órgãos do Ministério, durante o período eleitoral, não podem se reunir com lideranças dos estados, ou recebe-las em reunião e nem mesmo pode atende-las pessoalmente, representação de servidores ou sindicatos para tratar da transposição.
O que se espera da Secretaria e da Comissão é que atuem com coerência, nos seus estritos limites institucionais e que deem publicidade de suas ações e decisões aos verdadeiros interessados, que são os servidores, que clamam por respostas e as autoridades precisam ficar de olhos bem abertos, para evitar que algum gestor venha a descumprir as regras eleitorais, mesmo porque, o Ministério Público Eleitoral tem atuado com rapidez em casos de violação da lei neste período que vai até o final do ano.