Publicada em 22/09/2022 às 15h47
O anúncio da mobilização parcial de cerca de 300 mil reservistas causou pânico na Rússia. A demanda por bilhetes de avião foi tão grande que se tornou quase impossível encontrar um voo para deixar o país rapidamente para destinos próximos sem exigência de visto, como a Sérvia e a Turquia.
Um avião vindo de Moscou posa em Belgrado, a única capital europeia que ainda aceita voos originários da Rússia. A maior parte dos passageiros russos se recusa a conversar com os jornalistas. Um jovem diz temer ser convocado para lutar na Ucrânia e é puxado pelo braço pela mãe, que o impede de falar com a reportagem da RFI.
Mas nem todos se mantém em silêncio. Julia, uma russa de cerca de 30 anos, está assustada com o destino que podem ter seus amigos e colegas. "Muitos deles já receberam a convocação. Meu irmão foi integrado às forças russas há três meses, e tem apenas 20 anos. Ele foi enviado a Izium e a Kharkiv", conta.
A russa Irina desembarca com o nervosismo à flor da pele. "Minha filha já está aqui em Belgrado. Talvez poderemos permanecer aqui, mas tenho medo. Posso ser presa só porque estou falando isso, a polícia russa pode me perseguir. Desejo liberdade à Ucrânia. Por favor, que alguém prenda Putin", diz.
Irina, como todos os cidadãos russos, podem permanecer apenas três meses na Sérvia, como turista. Em seguida, ela precisará viajar à Bósnia ou ao Montenegro, para voltar como turista e ter direito a mais três meses em Belgrado.
As autoridades locais calculam que ao menos 40 mil russos chegaram ao país desde o início da guerra na Ucrânia, em fevereiro. A mobilização de reservistas pode ter como consequência uma nova onda de migração à Sérvia.
Fuga para a Turquia
Outros dois destinos escolhidos de última hora pelos russos são a Turquia e a Armênia, para onde ainda há trajetos aéreos saindo de Moscou e nenhum visto é exigido. Vitaly, de 24 anos, resolveu deixar a Rússia rapidamente e desembarcou em Istambul nesta quinta-feira, depois dos anúncios do presidente Vladimir Putin.
"É um pesadelo que se tornou realidade. Você não pode fazer nada. É como se a União Soviética estivesse de volta", disse à rádio francesa Franceinfo.
O russo Elmar chegou em Istambul na noite de terça-feira (20), suspeitando dos planos do Kremlin. "Meus amigos não param de me escrever para saber como eu fiz para conseguir escapar em tempo. Estou preocupado com eles e pelo destino que eles podem ter", explicou à rádio francesa.
Outra grande questão que preocupa a comunidade russa na Turquia é por quanto tempo ainda as fronteiras do país permanecerão abertas aos cidadãos da Rússia.
Como deixar a Rússia
Nos sites de busca, desde 20 de setembro, uma frase lidera as pesquisas em russo: "como deixar a Rússia". Outra, no aplicativo Google Trends, é "como quebrar um braço", num claro desespero dos cidadãos para escapar da convocação às forças russas.
O aplicativo de mensagens Telegram também é palco da angústia de jovens russos que temem ser obrigados a lutar na Ucrânia. Tentativas de fuga ou mutilação à parte, o governo russo já indicou que "as pessoas convocadas a seguir uma formação militar serão penalmente responsabilizadas em caso de não comparecimento ou abandono não autorizado do serviço".
Até o momento, não existem dados oficiais do êxodo após o anúncio da "mobilização parcial" dos 300 mil reservistas. No entanto, segundo o FSB, serviço federal russo de segurança, cerca de quatro milhões de cidadãos decidiram deixar o país nos três primeiros meses deste ano.