Publicada em 12/09/2022 às 15h01
O risco de um acidente nuclear na central de Zaporíjia é real. A mais potente usina nuclear da Europa central e seus seis reatores, todos parados, estão sob controle dos russos desde março e é alvo de bombardeios desde julho. Kiev também acusa Moscou de estocar armas pesadas e utilizar a usina como base para atacar as posições ucranianas. A situação é insustentável, segundo a AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica), e funcionários da empresa ouvidos pela RFI.
Na cidade, situada a 50 quilômetros da central, a população se prepara para o pior. "Estamos a um centímetro eu diria até um milimetro da catásfrofe. E essa catástrofe atingirá a Rússia, a Europa, e em proporções ainda maiores, a Ucrânia", explica uma engenheira que trabalhava na central e era encarregada da segurança nuclear. Ela prefere manter o anonimato, já que seu marido ainda trabalha na usina.
"Muitas pessoas não entendem o que está acontecendo de verdade e como essa situação pode ser perigosa. Os soldados atiram na central, jogam foguetes, abrem crateras. A tensão é muito grande, estamos constantemente sob pressão. Estamos preparados para enfrentar situações de stress, mas não nesse nível. Há tantos fatores que devem ser levados em conta. Com certeza esses seis reatores, se não forem resfriados, podem gerar uma catástrofe mundial. Que Deus nos ajude!", resume.
A operadora Energoatam, que gerencia a central, anunciou neste domingo (11) que o último reator que ainda estava em funcionamento seria desligado. A decisão foi tomada após o reestabelecimento parcial da eletricidade localizada na parte externa da central. Mas, no caso de um novo bombardeio, a usina dependerá dos geradores de diesel de emergência para garantir a segurança e evitar um vazamento de material radioativo.
A RFI também entrevistou outro funcionário da central, refugiado em Zaporíjia. Para ele, o perigo está no estoque de dejetos radioativos. "Nos reatores, o combustível nuclear está protegido, mas o combustivel usado é estocado apenas em contêineres de aço, de cerca de 100 milimetros de espessura, com cimento por cima, e pronto. Há mais de 150 contêineres como esse ao ar livre, protegidos somente por uma coluna de cimento de 2 metros de altura", relata.
Ajuda humanitária
Em Zaporíjia, Dmytro Orlov, o prefeito exilado de Energodar, ex-engenheiro chefe da central antes de ser eleito em 2020, abriu um centro de ajuda humanitária, social e médica. O objetivo é ajudar todos que fogem da cidade, incluindo muitos empregados da usina. Energodar foi bombardeada e privada de água corrente e de eletricidade.
"A retirada dos funcionários pode afetar de maneira significativa a segurança", explica Dmytro Orlov. "As pessoas não podem trabalhar 24 horas por dia. Para assegurar os turnos entre as equipes, precisamos de 5 empregados em cada grupo. Em alguns casos, temos apenas 4. Isso significa que aqueles que trabalham têm menos tempo de descanso. Se sobrarem apenas três funcionarios, eles deverão trabalhar todos os dias", diz.
A cerca de 50 quilômetros da central, as autoridades de Zaporíjia acompanham de perto a situação. Um laboratorio móvel mede os níveis de radiação a cada 24 horas. "Nós acompanhamos os monitores em tempo real, após a análise pelos sensores que medem a taxa de radiação. Atualmente, os níveis estão normais", observa.
As autoridades locais, entretanto, continuam atentas. "Todos os serviços da região de Zaporíjia estão prontos, assim como o Ministério de Situações de Emergência e a Administração Militar Regional. Eles trabalham todos os dias sem interrupção", explica Taras Tyshchenko, representante do Ministério da Saude em Zaporijia. "A ideia é elaborar respostas para todas as hipóteses possíveis e caso o pior aconteça"; declara. Para evitar a tragédia, a Ucrânia e a AIEA reiteraram seu pedido para a formação de uma área desmilitarizada em torno da central, o que por enquanto não ocorreu.