Publicada em 23/09/2022 às 09h07
Os referendos de anexação pela Rússia começaram na sexta-feira (23) em regiões da Ucrânia controladas total ou parcialmente por Moscou, num processo denunciado por Kiev e o Ocidente. As votações, consideradas um “simulacro” pelo governo ucraniano, são o prenúncio de uma provável escalada do conflito.
Os referendos começaram às 7h no horário local e poderão ser realizados até 27 de setembro nas regiões separatistas pró-Rússia de Donetsk e Lugansk (leste), e em áreas sob ocupação russa nas regiões de Kherson e Zaporíjia (sul). As votações são idealizadas há meses por Moscou, mas o calendário parece ter sido acelerado após a contra-ofensiva ucraniana, que obrigou o Exército russo a recuar no nordeste do país.
As consultas populares foram anunciadas pelo presidente Vladimir Putin no início da semana, que chegou a ameaçar com ataques nucleares para defender o que considera ser territórios russos.
De antemão, não há qualquer dúvida sobre o resultado destes referendos, organizados às pressas. O pleito foi criticado com veemência pelo governo ucraniano e seus apoiadores ocidentais, que acusam Moscou de repetir a estratégia utilizada na península da Crimeia em 2014, para assumir o controle de faixas inteiras de território ucraniano.
"Realizar este referendo é um passo histórico. Estamos voltando para casa", celebrou o líder da região separatista pró-Rússia de Donetsk, Denis Pushilin, em um vídeo publicado na manhã de sexta-feira no Telegram.
Os separatistas encarregados dos procedimentos eleitorais em Donetsk indicaram que, "por razões de segurança", já que os combates permanecem, a votação seria organizada principalmente de porta em porta durante quatro dias. As seções de votação abrirão "apenas no último dia", ou seja, em setembro 27.
Serão 450 e 461 seções nas regiões de Donetsk e Lugansk, respectivamente, 394 em Zaporíjia e 198 em Kherson. Vários locais de votação também foram abertos na Rússia para permitir o voto de "refugiados" que fugiram dos combates, segundo agências de notícias russas.
Aceleração dos planos
Os moradores das regiões separatistas pró-Rússia de Donetsk e Lugansk, que já declararam "independência", devem decidir se querem ou não fazer parte da Rússia. Já em Kherson e Zaporíjia, parcialmente ocupadas pelas forças russas, a pergunta feita é: "Você quer se separar da Ucrânia, criar estados independentes e se tornar parte da Rússia?"
O presidente da câmara baixa do Parlamento russo, Vyacheslav Volodin, exortou na sexta-feira seus "compatriotas" – os pró-russos da Ucrânia – a "escolher integrar a Rússia". "Nós vamos apoiá-los", disse.
Mesmo que a anexação dessas quatro áreas não seja reconhecida pela comunidade internacional, ela marcará um ponto de virada na ofensiva que a Rússia lidera na Ucrânia desde 24 de fevereiro. Na quarta-feira, o presidente Vladimir Putin decretou uma mobilização parcial de russos em idade de combate, que envolverá pelo menos 300 mil pessoas.
Acusando os ocidentais de querer "destruir" a Rússia, Putin também ameaçou usar "todos os meios", incluindo os nucleares – declarações que foram fortemente condenadas pelos Estados Unidos e a União Europeia.
"Combustível no fogo"
Até a China, próxima de Moscou, tomou distância da Rússia após o anúncio dos referendos, pedindo “respeito à integridade territorial dos Estados”. A Rússia também se viu isolada no Conselho de Segurança da ONU, onde o secretário de Estado americano, Anthony Blinken, liderou acusações nesta quinta-feira.
"O fato de o presidente Putin ter escolhido esta semana, quando a maioria dos líderes mundiais se reúne na ONU, para adicionar combustível ao fogo que ele começou demonstra seu total desrespeito à Carta da ONU", disse Blinken, que se recusou a se encontrar com seu colega russo, Sergei Lavrov.
"A ordem internacional que tentamos salvar aqui está sendo destruída diante de nossos olhos. Não podemos deixar o presidente Putin se safar", adicionou ele, na reunião convocada pela presidência francesa.
Lavrov, presente na sala do conselho, onde também discursou, não estava sentado na mesma mesa dos demais ministros, sendo substituído por um deputado.