Publicada em 03/11/2022 às 14h57
Com o voto contrário dos Estados Unidos e Israel e abstenções do Brasil e Ucrânia, a Assembleia Geral da ONU aprovou nesta quinta-feira (3), por esmagadora maioria, uma resolução apresentada por Cuba que pede o fim do embargo americano imposto há 60 anos.
Com 185 votos a favor, a resolução - aprovada pela terceira vez desde 1992 - pede "fim ao bloqueio econômico, comercial e financeiro imposto pelos Estados Unidos da América contra Cuba" e defende a "igualdade soberana" dos Estados, a "não ingerência em seus assuntos internos" e a "liberdade de comércio e de navegação".
Imposto em fevereiro de 1962, em plena Guerra Fria, pelo então presidente John F. Kennedy, o bloqueio tem sido reforçado progressivamente para asfixiar o regime comunista, "tem efeito de uma pandemia permanente, de um furacão constante", lamentou o chanceler cubano Bruno Rodríguez na tribuna da ONU.
Segundo o ministro, nos primeiros 14 meses do governo democrata de Joe Biden, os "prejuízos" ocasionados pelo bloqueio ultrapassaram 6 bilhões de dólares e 154 bilhões em seis décadas.
"Não atribuímos ao bloqueio todas as dificuldades enfrentadas hoje por nosso país; mas faltaria com a verdade quem negasse seus gravíssimos efeitos e não reconhecesse que é a causa principal das privações, carências e sofrimentos das famílias cubanas", assegurou, após alertar que "cria as condições que encorajam a imigração ilegal".
Nos últimos dois dias, delegações de países do Sul - nenhum país desenvolvido falou - apareceram na tribuna da Assembleia Geral para denunciar o embargo - "injusto", "ilegal", "inaceitável", "criminoso", "desumano", "desproporcional" - do bloqueio que foi sendo progressivamente reforçado.
Apesar deste apoio maciço constituir uma vitória moral para o governo da ilha, patrocinador da resolução, na prática não se espera nenhuma mudança, como tem ocorrido desde 1992 com a adoção das 29 resoluções prévias com o mesmo teor.
- Define política dos EUA com Cuba -
O chanceler Rodríguez lamentou que o embargo "continua sendo o elemento central que define a política dos Estados Unidos em relação a Cuba".
O cientista político Christian Sabatini, do centro de análise Chatham House, em Londres, é da mesma opinião. Mas acima de tudo, "oculta o problema real e legítimo dos direitos humanos" na ilha.
"Isola os Estados Unidos" quando se podia encontrar "uma causa comum" com muitos dos países que ano após ano apoiam Cuba na ONU "em busca de mudanças razoáveis, positivas e construtivas", assegurou à AFP por telefone.
Apesar de suas promessas de campanha, Biden mantém as sanções draconianas impostas por seu antecessor no cargo, o republicano Donald Trump, salvo algumas alterações em termos de vistos, viagens e remessas para a ilha.
Para lidar com os estragos deixados pelo devastador furacão Ian, Havana pediu a Biden, em 19 de outubro, que suspendesse as sanções que dependem dele, já que o restante só pode ser suspenso pelo Congresso.
Na véspera, 18 ex-presidentes latino-americanos, entre eles a brasileira Dilma Rousseff, o uruguaio José Mujica, o colombiano Juan Manuel Santos e o equatoriano Rafael Correa, pediram a Biden em uma carta que, diante da "delicada situação que as pessoas estão passando", "levante essas restrições que atingem os mais vulneráveis".
Agravada pela pandemia de covid, Cuba vive sua pior crise econômica em três décadas, com escassez de alimentos, remédios e combustíveis, enquanto enfrenta apagões diários devido à tecnologia obsoleta de suas usinas termelétricas.
Desde 2000, os alimentos estão isentos do embargo, mas Cuba deve pagar em dinheiro.