Publicada em 30/01/2023 às 09h34
“Nós estamos discutindo Lula e Bolsonaro. Nós estamos discutindo modelo de sociedade. E o modelo de sociedade que o Bolsonarismo traz para mim ele não é compatível com a minha sensibilidade espiritual, cristã, humana, cidadã. Eu não posso admitir que um jornalista e um ambientalista sejam mortos na floresta e o presidente diga que a culpa é deles, o que eles foram fazer lá? Eu não posso admitir e achar que é normal um sujeito invadir uma festa de aniversário de uma família e assassinar o aniversariante na frente da sua esposa e de seus filhos. Eu não posso admitir que seja normal um irmão puxar um revólver dentro de um templo no meio de um culto e dar um tiro no outro e o culto continuar. Mas Ismael o que o presidente tem a ver com isso? Então eu não estou falando do Bolsonaro. Eu estou falando do bolsonarismo.”
“Estou falando de uma cultura. De uma mentalidade. Não posso admitir que alguém saia na rua com suástica e que alguém faça discurso nazista e que ache que isso é liberdade de expressão, direito de opinião. Eu não posso admitir um negócio desse. Então o sujeito que vem falar comigo: ah! E o PT? Ah! Para, faz favor. Não estamos discutindo corrupção. Nós estamos discutindo muito mais coisas aí. Pense o que teria acontecido se um preto no saguão do aeroporto disparasse acidentalmente uma arma de fogo. O ex-ministro da Educação, Milton Ribeiro, fez isso no saguão do aeroporto. E aconteceu o quê? Nada. E se fosse um homem preto? Pense o que seria desse Brasil o que teria acontecido no Brasil se ficasse comprovado que a família do presidente Lula comprou 51 imóveis em dinheiro vivo?”
“Se ficasse comprovado que os filhos do presidente Lula homenagearam milicianos e deram empregos para eles em seus gabinetes? O que teria acontecido nesse país, como que a elite do poder político do Brasil teria tratado o presidente Lula se o vizinho, assassino, tivesse uma filha que namorasse com um de seus filhos? Então o que acontece com o Brasil é grotesco na minha opinião. Nós temos 3% da população do mundo e 11% das vítimas de Covid. De cada cinco brasileiros que morreram quatro mortes poderiam ter sido evitadas. Nós temos 700 mil pessoas que morreram com um presidente da República que fez motociatas e nunca foi visitar um hospital. Nós não estamos falando de corrupção, nós estamos falando de modelo de sociedade. E o modelo de sociedade no Brasil é de tal ordem que o Mandetta, que foi Ministro da Saúde, que propôs um protocolo alinhado com a OMS, a Organização Mundial da Saúde, teve que sair do governo e não foi eleito. Mas o Pazuello o general subserviente ao chefe de Estado, o presidente Bolsonaro, que deu ordem para cancelar compras de vacinas, ele foi eleito”.
“Que Brasil é esse? Que Brasil é esse que o Ricardo Salles, que fez passar uma boiada no sentido de desmantelamento dos órgãos de controle das florestas, recebe mais votos do que a Marina Silva? Que Brasil é esse? Então, nós não estamos mais discutindo mais corrupção. Falar em corrupção com orçamento secreto, o presidente vai dizer que não é problema dele? Como não é problema dele? Um orçamento secreto que é um escândalo de corrupção muito maior do que foi o chamado Petrolão. Nós não estamos falando de corrupção. Nós estamos falando de modelo de civilização, de modelo de sociedade, né? Uma sociedade que quer manter-se estratificada. Eu insisto nisso já, infelizmente faz tempo.”
“Nós temos um contingente significativo da nossa sociedade que quer manter a ordem social estabelecida. Homem vale mais do que mulher. Hetero vale mais que gay. Magro vale mais que gordo. Branco vale mais que preto. Rico vale mais que pobre. Europeu e americano valem mais que brasileiro, sul-americano e africano. É isto que está posto. Quando você tem um ministro da Economia que diz que o dólar está muito baixo e que agora a empregada doméstica quer ir para a Disney. Quando você tem um ministro da Educação que diz que a universidade não é para todo mundo. Quando você tem um ministro da Educação que diz que pobre tem que fazer curso técnico, nós estamos falando de modelo de sociedade e de civilização. Quando você tem uma ministra da Mulher e dos Direitos Humanos que diz que menino veste azul e menina veste rosa nós não estamos falando de corrupção, nós estamos falando de modelo de civilização.”
“Quando nós temos uma sociedade em que a religião que se torna hegemônica se julga no direito de depredar, destruir, incendiar terreiros de religiões de matriz afro, não estamos falando de corrupção. Quando nós temos um pais estruturalmente racista que ainda discute a legitimidade de cota racial, nós não estamos falando de corrupção. Nós estamos falando de modelo de sociedade. E eu lamento muito ser uma das vozes dentro da Igreja que vocaliza esse tipo de discurso porque dizem: Ah! então você é Lula. Você é ... E o PT? Rapaz, faz favor! Não estamos discutindo corrupção.”
P.S: Precisaríamos, então, discutir sobre o genocídio dos Yanomami durante o governo de Bolsonaro ou também temos que nos calar diante da monstruosidade em terras indígenas?
*Texto do Pastor René Kivitz, conferencista e escritor em São Paulo.
(Transcrição da entrevista do pastor feita por Professor Nazareno)
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