Publicada em 06/02/2023 às 15h26
A ameaça do balão chinês aos Estados Unidos foi claramente exagerada. O incidente tecnológico se transformou em um evento político em grande parte devido ao sentimento antichinês nos EUA.
A China colocou sobre os Estados Unidos a responsabilidade pelas tensões bilaterais decorrentes de um ataque militar a um aeróstato civil chinês.
O que os EUA fizeram afetou e prejudicou seriamente os esforços de ambos os lados e o progresso na estabilização das relações China-EUA após a reunião dos líderes dos dois países em Bali. Isso é afirmado na apresentação do governo chinês ao chefe da Embaixada dos EUA na China. A apresentação foi enviada pelo vice-ministro das Relações Exteriores da China, Xie Feng. A China apelou a Washington para não tomar novas medidas que prejudiquem os interesses da China e aumentem as tensões.
A China adotou uma atitude equilibrada em relação ao incidente no espaço aéreo dos Estados Unidos, afirmou o cientista político e investigador principal do Instituto da China e da Ásia Moderna Pavel Kamennov numa entrevista à agência russa de notícias Sputnik.
– Os norte-americanos declararam que estão iniciando uma investigação. Provavelmente eles não encontrarão nada. O lado chinês tem realmente razão. Eles, provavelmente, estariam conduzindo alguns experimentos seus, mas o balão teria entrado acidentalmente no espaço aéreo dos EUA levado pelo vento. Ele não ameaçou ninguém e não destruiu nada. A questão de princípio é que o espaço aéreo foi violado, mas Pequim reagiu e pediu desculpas imediatamente. Além disso, o reconhecimento de um território agora é muito mais eficaz a partir do espaço. No entanto, mesmo antes da investigação americana, o balão foi imediatamente qualificado como sendo de reconhecimento, talvez simplesmente porque a China é apontada como uma ameaça à segurança nacional por qualquer pretexto – disse Kamennov.
O lado chinês explicou o incidente por circunstâncias de força maior. Os EUA ignoraram os fatos e insistiram no uso indiscriminado da força contra um objeto aéreo civil.
– Estes aeróstatos têm uma superfície refletora muito pequena. Todo o seu revestimento é feito de plástico, enquanto a própria cápsula, que o balão carrega, tem um tamanho muito pequeno. Seriam precisos muitos esforços para localizar esse objeto usando radares e derrubá-lo – notou especialista.
Apenas um caça de quinta geração F-22, que tem uma poderosa estação de radar, foi capaz de alcançar o balão, observou Konstantin Sivkov, vice-presidente da Academia de Ciências de Mísseis e Artilharia da Rússia, em uma entrevista à Sputnik.
– Abateram com o que puderam, provavelmente na área do incidente não havia defesa antiaérea continental. O incidente do balão chinês realmente testou o sistema de defesa antiaérea continental dos EUA. Este é um ponto importante e uma conclusão importante, a defesa antiaérea continental americana foi impotente. Ou seja, não foi possível derrubar o balão nas altitudes em que ele estava voando com uma instalação no solo. Apenas o F-22 Raptor com sua poderosa estação de radar poderia atingir uma altura tão grande. Os F-15 e F-16 simplesmente não o viram.
Ameaça do balão chinês
As consequências do incidente para as relações China-EUA dependerão do lado americano, disse o cientista político chinês e pesquisador sênior especialista da Universidade Popular da China Zhou Rong.
– O incidente com o aeróstato reflete o crescimento do sentimento antichinês nos EUA, mas não significa uma regressão completa das relações sino-americanas. A duração das consequências do incidente dependerá de os EUA continuarem ou não a tomar medidas de curto prazo para piorar as relações China-EUA. Se houver poucas ações de sua parte nessa direção, podemos esperar que Antony Blinken viaje até a China antes de maio. No entanto, novos incidentes antichineses provocados pelos EUA ou seus aliados, como o Japão, a Coreia do Sul e as Filipinas, podem atrasar ainda mais a visita de Blinken à China. Dada a situação atual, o governo de Biden ainda está tentando manter contatos com a China. Mas, pessoalmente, acredito que a China precisa ser mais dura nas reações às várias provocações dos EUA. No jogo com os EUA, a China deve estar preparada para lutar, para responder com sabedoria e habilidade aos desafios colocados pelos EUA e países ocidentais.
A ameaça do balão chinês aos Estados Unidos foi claramente exagerada. O incidente tecnológico se transformou em um evento político em grande parte devido ao sentimento antichinês nos EUA. Há muito que ele é o maior obstáculo ao diálogo e, neste contexto, o incidente do balão poderia ser simplesmente um pretexto para cancelar as negociações sino-americanas em Pequim com participação do secretário de Estado dos EUA, Anthony Blinken.
Atmosfera das relações
O presidente norte-americano deve agradar constantemente ao sentimento antichinês, observou o especialista Zhou Rong, traçando uma ligação entre a visita adiada e o incidente com o balão.
Segundo o especialista, “a visita do secretário de Estado dos EUA, Blinken, à China foi originalmente planejada para discutir a crise em torno da Ucrânia, o conflito no estreito de Taiwan e a pressão sobre a economia da China. O incidente com o balão mudou a atmosfera das relações na véspera da reunião. O cancelamento da visita agora não significa que Blinken não visitará a China no futuro, porque os resultados das negociações entre o presidente chinês Xi Jinping e o presidente Biden à margem da cúpula do Grupo dos 20 [G20] ainda são válidos. Ao mesmo tempo, democratas e republicanos chegaram a um consenso quanto à oposição à China. Biden precisa atender a essa demanda. Sua posição dura contra a China deve ser vista pelas forças antichinesas no país”.
Esperada visita de Anthony Blinken
Na véspera da esperada visita de Anthony Blinken a Pequim, antes mesmo do incidente com o balão, as tensões nas relações China-EUA já haviam escalado. Essa escalada foi provocada pela declaração do presidente da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, Kevin McCarthy, sobre o direito de visitar livremente Taiwan e pela viagem à ilha do ex-chefe do Comando Indo-Pacífico Philip Davidson. Ele é conhecido por suas declarações provocativas sobre a ameaça a Taiwan por parte da China continental. O cálculo americano poderia prever que a China reagisse duramente a essa “barragem de artilharia” de Washington, e talvez até mesmo questionasse a oportunidade da visita de Blinken a Pequim.
Entretanto, a China não cedeu à pressão norte-americana. Em Pequim havia algumas esperanças de reatar o diálogo com Washington. Os EUA, ao cancelarem a visita, mostraram efetivamente que para eles o diálogo com a China não é uma prioridade. Além disso, não há nenhuma indicação de que os EUA tenham ideias construtivas para começar a reconstruir as relações econômicas e políticas com a China.