Publicada em 27/03/2023 às 15h00
O presidente Emmanuel Macron busca uma saída para a crise desencadeada pela reforma previdenciária na França. Nesta segunda-feira (27), a imprensa condena os métodos violentos empregados pela polícia para reprimir um certo número de black blocs que têm se infiltrado nos protestos.
"A polícia francesa protagoniza um espetáculo lamentável", destaca o jornal Libération, citando uma escalada da repressão em sua manchete, seja durante as manifestações contra a reforma das aposentadorias ou no protesto ocorrido sábado (25) em Sainte-Soline.
Neste vilarejo rural do oeste da França, black blocs se juntaram a militantes ecologistas para rejeitar um projeto de instalação de reservatórios de água para uso agrícola. Houve confronto violento entre manifestantes radicais e a polícia.
É certo que os black blocs estão determinados a causar o máximo de estragos possíveis, escreve o Libération em seu editorial. "Mas a imagem dos policiais avançando contra manifestantes em quads como se fossem cowboys" na zona rural, ou nas ruas em Paris, onde esquadrões móveis atravessam as passeatas em motocicletas, batendo nos participantes com matracas, revela um uso da força desmesurado, estima o veículo.
O balanço de feridos entre manifestantes e policiais atesta a gravidade dos confrontos, mas ainda é preciso adicionar a essa brutalidade "as humilhações, ameaças e os espancamentos promovidos pela polícia", inclusive contra jornalistas. Vídeos postados nas redes sociais documentam essas agressões.
Em entrevista à RFI, Driss Aït Youssef, doutor em Direito e especialista em questões de segurança, analisa os diferentes perfis de manifestantes nos atos. Segundo ele, a maioria dos participantes é pacífica.
No entanto, Youssef ressalta que os black blocs que se infiltram nos protestos "são expressivos". No caso específico de Sainte-Soline, "entre os manifestantes, havia indivíduos que não vieram para protestar, mas foram ao local para provocar e desafiar as autoridades", explica. "De fato, há uma minoria que procura o confronto e não o debate de ideias", reitera.
O especialista também chama a atenção ao aumento da quantidade de jovens nos atos contra a reforma da Previdência. "A juventude se mobiliza porque é o futuro deles que está em jogo", diz.
De acordo com o Youssef, diante deste quadro, é importante que o governo inicie o quanto antes um diálogo com as novas gerações. "Mesmo que os jovens não participem das eleições - vemos que a abstenção entre eles é grande - eles estão encontrando outras formas de se expressar", observa.
Denúncias de abusos
O portal de notícias France Info registra que membros do governo foram questionados sobre as críticas ao policiamento ostensivo. "Não há espaço para a violência policial", respondeu Christophe Béchu, ministro da Ecologia e Transição Energética, garantindo que a Corregedoria da Polícia (IGPN, na sigla em francês) tem sido sistematicamente acionada para investigar as denúncias de abusos.
Já o porta-voz do governo, Olivier Véran, condenou "qualquer forma de violência" e afirmou estar preocupado com um manifestante que se encontra em coma, depois de sofrer um ferimento na cabeça no protesto de sábado em Sainte-Soline.
A Comissária para os Direitos Humanos do Conselho da Europa, Dunja Mijatovic, expressou preocupação com a violência contra os opositores da reforma previdenciária na sexta-feira (24). "Os atos esporádicos de violência de alguns manifestantes [...] não podem justificar o uso excessivo da força por agentes do Estado", ressaltou a comissária.
Duzentos feridos e 4.000 granadas
Manchete de capa do site do Le Monde nesta segunda, a batalha campal na localidade de Sainte-Soline deixou 200 manifestantes feridos, segundo os organizadores, e 47 policiais, de acordo com o Ministério do Interior. "Quarenta [pessoas] ficaram gravemente feridas, principalmente por estilhaços de granadas e disparos de balas de borracha usados pela polícia", relata o Le Monde.
De acordo com o ministro do Interior, Gérald Darmanin, os policiais tiveram que lidar com "mil pessoas radicalizadas" e uma "explosão de violência absolutamente inaceitável".
Por outro lado, a reportagem cita que "as autoridades apresentaram o número astronômico de 4.000 granadas de todos os tipos disparadas", apesar de um porta-voz da polícia alegar que houve "uso gradual e proporcional da força". Entre os manifestantes, as autoridades afirmam ter apreendido "bolas de bocha, machados e facões, fogos de artifício e alguns bastões de beisebol".
Três veículos da polícia foram incendiados. Apesar do alto culto dessas violências, militantes e a polícia se acusuam mutuamente pela brutalidade, assinala o Le Monde.