Publicada em 11/05/2023 às 14h39
É "a eleição do século" para os turcos. Neste domingo, 14 de maio, acontecem as eleições presidenciais e legislativas na Turquia. Há 20 anos no poder, Recep Tayyip Erdogan é novamente candidato e enfrentará Kemal Kiliçdaroglu, líder da coalizão de oposição. As pesquisas apontam um resultado muito próximo entre os dois candidatos.
É a primeira vez em duas décadas que o líder encara uma oposição unida. Muharrem Ince, um dos quatro candidatos à eleição presidencial, anunciou nesta quinta-feira (11) que se retira da disputa – uma surpresa que prejudica Erdogan. Nas últimas pesquisas, o líder do partido Memleket (Pátria), de 59 anos, aparecia com entre 2% e 4% das intenções de voto.
Vários membros importantes de seu partido renunciaram nos últimos dias, preocupados com o fato de que a candidatura de Ince pudesse dispersar os votos da oposição para derrotar Erdogan. Ince justificou sua decisão afirmando que a aliança da oposição liderada por Kiliçdaroglu "vai colocar toda a culpa nele" se perder o pleito.
Nas eleições de 2018, Incer já concorreu com Erdogan, representando na época o Partido Republicano do Povo (CHP, social-democrata), e perdeu no primeiro turno. Depois, deixou a siga, a principal da oposição, e lançou em maio de 2021 seu próprio movimento, uma organização nacionalista laica.
Kiliçdaroglu, que agora é preside o CHP e também lidera uma aliança que reúne seis partidos, está em uma boa posição contra Erdogan – que tem perdido popularidade inclusive em seus bastiões eleitorais. Nesta semana, a pesquisa de opinião Konda apontou que o presidente teria 43,7% dos votos e Kilicdaroglu, 49,3%.
Nurdagi, no distrito de Gaziantep, é uma cidade dizimada desde o terremoto de 6 de fevereiro. Oitenta por cento dos edifícios caíram ou foram destruídos pelo tremor. Ocupado consertando uma escavadeira, Ali, um pai de família de cerca de 40 anos, aponta para o prédio onde morava com a família: “Cinco pessoas morreram ali”, conta.
Com um boné do AKP na cabeça, partido do presidente, Ali é um eleitor fiel de Erdogan, mas este ano não votará nele, nem em seu partido nas eleições legislativas. “Um partido no poder há 20 anos deveria ter garantido a segurança destes edifícios. A responsabilidade é deles. Sempre apoiei Erdogan até agora, mas desta vez , eu e minha família não vamos votar nele”, afirmou à reportagem da RFI. "O governo é criminoso, mas nós também somos culpados, porque votamos nele todos esses anos e não deveríamos”, disse.
O prefeito de Nurdagi, do AKP, foi preso duas semanas após o terremoto. A população atingida pela tragédia denuncia uma conivência histórica entre as autoridades locais e alguns construtores sobre as regras urbanísticas.
Cinco anos atrás, Recep Tayyip Erdogan conquistou 76% dos votos na localidade, bem acima de seu desempenho nacional. Para alguns eleitores, apesar dos problemas, o presidente ainda é visto como a única solução para o país.
"Quando eu era criança, esperávamos horas para ir ao hospital, para abastecer o carro. Era só uma vez por semana. Tudo isso mudou”, garante. "Nosso povo é ingrato. Tayyip fez o possível. Respeito todas as pessoas que votam em partidos de esquerda, mas não vimos nada de concreto deles. Não tivemos benefícios”, avalia.
Contexto econômico delicado
Erdogan tem a vantagem da sua onipresença no país e na diplomacia. O principal programa de seu governo, "O Século da Turquia”, ainda seduz muitos eleitores, apesar da inflação galopante, em torno de 50%, segundo números oficiais. Economistas indicam que, na realidade, o índice é muito maior.
Além disso, o nível de endividamento da população é enorme: os créditos não pagos ultrapassam 30 bilhões de liras turcas, ou cerca de US$ 1,5 bilhão. O contexto econômico desfavorável pode influenciar a votação.
“As pessoas estavam acostumadas com a inflação em torno de 5 a 10% e, de repente, nos encontramos com 80% de inflação, algo que elas não aceitam bem”, aponta Haluk Tukel, economista em Istambul e consultor de empresas.
“Os turcos acreditaram muito no que Erdogan lhes dizia, mas estão começando a acreditar cada vez menos, especialmente nas promessas que ele faz se for reeleito. A pergunta muito simples que todos fazem é: 'Você governou por 20 anos, por que não fez tudo isso?’”, complementa.
O preço da cebola tornou-se o símbolo da alta dos preços. No mercado de Sultanbeily, em Istambul, antigo reduto do AKP, o quilo da cebola está a 28 liras turcas (US$ 1,43). As palavras dos clientes e comerciantes são duras sobre o presidente em exercício.
"Todos estão à espera das eleições. Se Kemal Kiliçdaroglu chegar ao poder, os preços vão cair, tenho certeza", diz um vendedor, antes de um cliente acrescentar: “Todos nós fazemos horas extras para sobreviver. O atual governo tem que sair, senão o país vai acabar em pouco tempo”.
O segundo turno da eleição presidencial está previsto para 28 de maio