Publicada em 16/05/2023 às 15h44
Ex-repúblicas soviéticas e alguns países ideologicamente aliados à Rússia estão sendo usados por Moscou para burlar as sanções impostas depois do início da guerra contra a Ucrânia. Desde fevereiro de 2022, exportações de EUA, UE e Japão, por exemplo, saltaram para países como Geórgia, Belarus, Cazaquistão, Armênia e Uzbequistão, que, por sua vez, ampliaram suas exportações para a Rússia.
O aumento é incompatível com a tendência dos últimos anos, o que leva a crer que essas nações estão sendo usadas como uma espécie de "porta giratória" para repassar produtos após o início das sanções.
As informações e a hipótese de os países estarem servindo de atalhos para suprir a Rússia constam em relatório do IIF (Instituto de Finanças Internacionais, baseado em Washington) e em dados da ONU.
No site da empresa de comércio exterior Imex.Expert, da Belarus, forte aliada de Moscou, componentes eletrônicos, chips de computador, máquinas e equipamentos, matérias-primas e peças de reposição de Alemanha, França, Polônia "e quaisquer outros países da União Europeia" podem ser destinados à Rússia.
"Você está procurando um sistema de trabalho que funcione bem com as sanções? Fornecemos serviços de importação paralela (...) que funciona bem nessas condições", afirma o site da empresa.
A reportagem procurou a firma para obter detalhes sobre como as operações são realizadas, mas não obteve resposta. O mesmo tipo de serviço é oferecido a quem, na Rússia, deseja importar produtos dos EUA.
Números da ONU compilados na plataforma UN Comtrade Database revelam que, juntas, as exportações dos EUA e da União Europeia para Armênia, Geórgia, Quirguistão e Cazaquistão saltaram para US$ 20 bilhões (R$ 97,7 bilhões) no ano passado, ante US$ 11,6 bilhões (R$ 56,7 bilhões) em 2021. Na outra ponta, esses países aumentaram suas exportações para a Rússia em quase 50% neste ano.
Os dados do IIF mostram que, além das ex-repúblicas soviéticas, Turquia e China –Pequim firmou uma "amizade sem limites" com a Rússia dias antes do início do conflito no Leste Europeu– multiplicaram as vendas a Moscou no último ano, em volumes e valores bem maiores.
Embora o montante entre as ex-repúblicas soviéticas e a Rússia seja limitado em comparação às transações entre Rússia e China, hoje o maior fornecedor de Moscou, as novas rotas comerciais permitem o acesso a tecnologia ocidental que Vladimir Putin tem dificuldade de obter em outros locais.
"Enquanto a Rússia seguir ganhando moeda forte com suas exportações de energia, [ela] tentará importar produtos e tecnologia ocidentais", afirma o IIF. Segundo o órgão, o aumento da corrente de comércio entre Moscou, Pequim e Ancara, por exemplo, foi grande o suficiente para abrandar o aperto financeiro sofrido pelos russos e para que o índice voltasse a um patamar próximo ao de antes do conflito.
A Rússia também intensificou as vendas externas de óleo e gás para a China e para ex-repúblicas soviéticas, contribuindo para elevar suas reservas em moeda estrangeira e melhorar o resultado de sua conta corrente (posição dos ativos financeiros líquidos em relação ao resto do mundo).
Desde o início da guerra, cerca de mil empresas deixaram completamente a Rússia ou diminuíram drasticamente suas operações no país, segundo levantamento de abril da Universidade de Yale. O resultado geral, no entanto, tem ficado aquém do que Washington e Bruxelas esperaram com as sanções, já que a economia russa sofreu baque limitado desde que as hostilidades começaram.
Em abril do ano passado, o FMI (Fundo Monetário Internacional) chegou a estimar que a economia russa afundaria -8,5% em 2022. Os números tiveram de ser revistos, e a entidade divulgou recentemente que a retração foi de apenas -2,2%. Para este ano, o órgão espera um leve crescimento, de 0,3%.