Publicada em 17/08/2023 às 09h36
O hacker Walter Delgatti Neto disse, em depoimento à CPI dos Atos Golpistas nesta quinta-feira (17), que a deputada Carla Zambelli (PL-SP) prometeu a ele um emprego na campanha à reeleição do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), mas que acabou cuidando das redes sociais da parlamentar.
A sessão para ouvir o hacker começou às 9h35. Ele presta esclarecimentos aos parlamentares sobre a invasão a sistemas do Judiciário, além da relação com Zambelli e sobre a reunião que teve com Bolsonaro e a deputada sobre as urnas eletrônicas, no Palácio da Alvorada.
Delgatti afirmou que se encontrou por acaso com Zambelli em Ribeirão Preto (SP) e se apresentou. Os dois então teriam trocado contato e, segundo o hacker, a deputada o contatou e ofereceu uma vaga de trabalho.
"Posteriormente, ela disse que havia uma oportunidade de emprego a mim, no caso, seria na campanha do Jair Bolsonaro, do ex-presidente. Eu estive em Brasília, eu falei com o presidente, e logo em seguida, [...] eu fiquei em Brasília. Eu ia trabalhar na parte de redes sociais do gabinete dela", disse.
Delgatti, no entanto, afirmou que o serviço foi interrompido após ordem do ministro Alexandre de Moraes que impediu o acesso da parlamentar às redes sociais.
O hacker afirmou ainda que foi levado a Bolsonaro também por Carla Zambelli, e que, em reunião próximo às eleições do ano passado, foi questionado pelo ex-presidente sobre a lisura das urnas eletrônicas.
"Apareceu a oportunidade da deputada Carla Zambelli, de um encontro com o Bolsonaro, que foi no ano de 2022, antes da campanha. Ele queria que eu autenticasse... autenticasse a lisura das eleições, das urnas. E por ser o presidente da República, eu acabei indo ao encontro. [...] Lembrando que eu estava desemparado, sem emprego, e ofereceram um emprego a mim. Por isso que eu fui até eles."
Em depoimento à Polícia Federal, Delgatti já havia dito que havia se reunido com Bolsonaro, por intermédio de Carla Zambelli, e que o ex-presidente o perguntou se ele conseguiria invadir as urnas eletrônicas.
No total, foram aprovados 6 requerimentos para convocação do hacker na CPI — todos de autoria parlamentares da base de apoio do governo, entre eles a senadora Eliziane Gama (PSD-MA).
Na noite desta quarta (16), o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou que o hacker recorra ao silêncio durante o depoimento. A decisão atendeu a um pedido da defesa de Delgatti. No entanto, ele ainda não usou a decisão para ficar em silêncio.
Segundo Fachin, ele também:
poderá contar com a assistência de um advogado
e não deverá "sofrer constrangimentos físicos ou morais decorrentes do exercício dos direitos anteriores"
Quem é Walter Delgatti?
Delgatti ficou conhecido por ter vazado, em 2019, mensagens atribuídas ao então ministro da Justiça e ex-juiz Sergio Moro, a integrantes da força-tarefa da Lava Jato e outras autoridades.
Recentemente, o "hacker de Araraquara" voltou à mira da Polícia Federal pela invasão de sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para a inclusão de um falso mandado de prisão contra o ministro Alexandre de Moraes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
No ofício, havia inclusive a frase "faz o L" — um dos slogans da campanha eleitoral mais recente do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). À época, Walter Delgatti Neto disse que o falso documento foi redigido pela deputada Carla Zambelli.
R$ 40 mil de Zambelli
A deputada Carla Zambelli postou foto de encontro com Walter Delgatti — Foto: Reprodução/Twitter
Walter Delgatti Neto voltou a ser ouvido pela Polícia Federal nesta quarta (16), um dia antes da ida à CPI. Foi a segunda vez em que o hacker depôs sobre a relação com Zambelli e o plano para invadir sistemas do Judiciário.
Investigado pela tentativa de invasão à Justiça, Delgatti está preso desde o início de agosto. Ele foi detido em operação da PF, que também contou com buscas e apreensões em endereços de Zambelli.
Segundo o advogado Ariovaldo Moreira, no depoimento, o hacker complementou informações e apresentou provas à PF de que foi contratado pela deputada para "invadir qualquer sistema do Judiciário".
Em entrevista a jornalistas, Moreira declarou que Delgatti recebeu R$ 40 mil pelo serviço.
"Ele faz provas de que recebeu valores da Carla Zambelli. Segundo o Walter, o valor chega próximo a R$ 40 mil. Foi próximo a R$ 14 mil em depósito bancário. O restante, em espécie. [Para] invadir qualquer sistema do Judiciário", disse o advogado.
Em depoimento à PF, Delgatti disse que esteve no Palácio da Alvorada e que, na ocasião, o então presidente Jair Bolsonaro (PL) teria questionado a ele se seria possível invadir as urnas eletrônicas.
O encontro entre o hacker e Bolsonaro foi articulado por Zambelli.
Enquanto presidente da República, Bolsonaro fez reiteradas críticas às urnas e tentou colocar em xeque o sistema eleitoral sem jamais ter apresentado provas de eventuais irregularidades.
Em uma das empreitadas contra o sistema eleitoral, o então presidente convocou embaixadores para encontro no Palácio da Alvorada, com o objetivo de apresentar suposições infundadas sobre o processo eleitoral brasileiro. A reunião levou o TSE a declarar Bolsonaro inelegível.
À imprensa, a defesa de Carla Zambelli afirmou que a deputada "rechaça qualquer acusação de prática de conduta ilícita e imoral pela parlamentar, inclusive, negando qualquer tipo de pagamento ao mencionado hacker".
Lava Jato
Preso pela PF por suspeita de fraude em sistemas de órgãos públicos, Delgatti ficou conhecido no episódio do vazamento de mensagens da Lava Jato.
À época, Walter Delgatti Neto afirmou ter conseguido acessar perfil de aplicativo de mensagens vinculado a autoridades da Operação Lava Jato, em Curitiba (PR).
Em 2019, foram vazadas mensagens atribuídas, por exemplo, ao então juiz Sergio Moro, atualmente senador, e ao então procurador Deltan Dallagnol, ex-deputado.
Delgatti e outros três suspeitos chegaram a ser presos, apontados como responsáveis pela invasão dos dispositivos.
Um ano depois, em 2020, Walter Delgatti Neto foi posto em liberdade, com a adoção de medidas cautelares. Entre os requisitos para o relaxamento da prisão estavam o uso de tornozeleira eletrônica e a restrição ao uso de internet.
Nos últimos meses, voltou a ser preso e solto. Primeiro, em junho, ele foi deitdo pelo descumprimento das medidas cautelares. Isso porque, à época, Delgatti afirmava estar cuidando do site e das redes sociais de Zambelli.
Em julho, foi solto e voltou a usar tornozeleira. No último dia 2, voltou a ser preso na operação da PF que investiga o plano para invadir sistemas do Judiciário.