Publicada em 09/11/2023 às 09h08
A operação que cumpriu mandados contra alvos ligados ao Hezbollah no Brasil contou com o apoio da inteligência de Israel. Poucas horas após a operação ser deflagrada pela Polícia Federal (PF), o gabinete do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, comunicou que a troca de informações faz parte de iniciativa de Israel para frustrar planos do grupo contra “israelenses, judeus e ocidentais”.
“Tendo como pano de fundo a guerra em Gaza contra a organização terrorista Hamas, o Hezbollah e o regime iraniano continuam a operar em todo o mundo para atacar alvos israelenses, judeus e ocidentais”, diz a nota. “O Mossad (serviço secreto israelense) trabalha e continuará a trabalhar para frustrar esses esforços, sempre que necessário, por meio de diversos métodos”.
A nota ressalta que o grupo tem uma extensa rede em operação em outros países. O auxílio da inteligência israelense, aliada a agentes, como os Estados Unidos, tem como pano de fundo a guerra entre Israel e o Hamas. Desde 7 de outubro, quando se deu a escalada do conflito, o Hezbollah demonstrou apoio ao grupo extremista.
Vitor de Pieri, professor do Instituto de Geografia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), ressalta que a troca de inteligência é comum entre os países.
“Eu não acredito que seja uma novidade [o fato de Israel passar informações para outros países]. É uma questão que foi investigada em um contexto de bastante turbulência política naquela região, então isso faz com que esse tema seja mais repercutido”, ressalta.
A troca de informações e o acompanhamento de grupos insurgentes, por meio de inteligência, ganhou força após o 11 de setembro de 2001, quando a organização fundamentalista islâmica Al-Qaeda promoveu uma série de ataques suicidas contra os Estados Unidos. “Os países ocidentais, principalmente os Estados Unidos, passaram a trabalhar com a perspectiva de guerra ao terror”, explica.
O professor acrescenta que, após o 11 de setembro, o mundo saiu das chamadas guerras clássicas e entrou em um momento de ataques preventivos. “[Nesse contexto] Esses grupos insurgentes utilizam de práticas terroristas como forma de guerra irregular, porque eles são inferiores, do ponto de vista militar, em relação às grandes potências”, destaca.
Operação
Como mostrou a coluna Na Mira, do Metrópoles, a Polícia Federal (PF) desarticulou uma célula do Hezbollah que planejava ataques no Brasil. A corporação, em nota, afirmou que a Operação Trapiche, como foi batizada, também buscava obter provas de possível recrutamento de brasileiros para a prática de atos extremistas no país.
A operação cumpriu dois mandados de prisão temporária e 11 mandados de busca e apreensão, expedidos pela Subseção Judiciária de Belo Horizonte, nos estados de Minas Gerais, São Paulo e no Distrito Federal. De acordo com o portal G1, a Interpol foi acionada para prender dois brasileiros que estariam no Líbano.
A corporação divulgou o seguinte balanço:
MG: 7 mandados de busca e apreensão cumpridos;
DF: 3 mandados de busca e apreensão cumpridos;
SP: 1 mandado de busca e apreensão e 2 mandados de prisão temporária cumpridos.
Os recrutadores e os recrutados devem responder pelos crimes de constituir ou integrar organização terroristas e de realizar atos preparatórios de terrorismo, cujas penas máximas, se somadas, chegam a 15 anos e 6 meses de reclusão.
A PF ainda informa que os crimes previstos na Lei de Terrorismo são equiparados a hediondos, considerados inafiançáveis, insuscetíveis de graça, anistia ou indulto, e o cumprimento da pena para esses crimes se dá inicialmente em regime fechado, independentemente de trânsito em julgado da condenação.
A Confederação Israelita do Brasil (Conib), por meio do X (antigo Twitter), manifestou preocupação com a situação. “Parabenizamos a PF, o Ministério Público e o Ministério da Justiça pela sua ação preventiva e reitera que os trágicos conflitos do Oriente Médio não podem ser importados ao nosso país, onde diferentes comunidades convivem de forma pacífica, harmoniosa e sem medo do terrorismo”, completou
O Hezbollah
O Hezbollah é considerado uma organização política e paramilitar que atua há décadas no território libanês. A origem do grupo se deu durante a guerra civil no país nos anos de 1980, como resposta à ocupação israelense no sul do Líbano.
Inspirado e apoiado pelo Irã, o Hezbollah rapidamente se tornou uma força de resistência contra Israel. Sua ala militar é considerada uma das mais poderosas da região, e tem lançado ataques bem-sucedidos contra alvos israelenses.
Tendo em vista o poderio militar do grupo, o envolvimento do Hezbollah na guerra travada entre Israel e o grupo radical Hamas passou a ser visto com preocupação pelos israelenses.
Documento das Forças de Defesa de Israel (FDI), ao qual o Metrópoles teve acesso em outubro, apontou que a participação extensiva do grupo no conflito poderia levar a uma “guerra destrutiva”.
As Forças de Defesa de Israel ainda afirmavam que o Hezbollah seria responsável por todos os ataques vindos do Líbano. “O envolvimento do Hezbollah pode levar a uma guerra destrutiva, que pode ser contra os interesses nacionais israelenses e libaneses”, ressalta.
O líder do grupo Hezbollah, Hassan Nasrallah, chegou a defender os ataques do Hamas contra Israel em 7 de outubro. Para ele, as ações foram “corretas, sábias e justas”.