Publicada em 03/06/2024 às 09h23
Pela primeira vez na história desde o fim do regime do Apartheid, o Congresso Nacional Africano (ANC, na sigla em inglês) perdeu maioria absoluta nas eleições gerais da África do Sul. Com isso, o partido tem 14 dias para formar uma coalizão e manter o atual presidente Cyril Ramaphosa na liderança do país.
O anúncio oficial da contagem dos votos neste domingo (2) confirmou que a sigla conquistou 159 cadeiras das 400 na Assembleia Nacional do país, segundo a agência Reuters. O valor é uma perda significativa em comparação com a última eleição, quando o partido conquistou 230 assentos do legislativo.
Sem maioria, o ANC confirmou que fará uma coalizão com um ou mais partidos de oposição, desde que o atual presidente não seja substituído.
Após a divulgação do resultado, Ramaphosa disse que, apesar da derrota do partido, o resultado da eleição foi uma vitória para a democracia. "O que esta eleição deixou claro é que o povo da África do Sul espera que seus líderes trabalhem juntos para atender às suas necessidades", afirmou.
A justificativa para o declínio do partido de Nelson Mandela (1918-2013), símbolo da luta pelo fim do regime de segregação racial, é a insatisfação da população sul-africana com desemprego, desigualdade e escassez de energia.
Na contramão, o principal partido da oposição, a Aliança Democrática (DA), angariou 21,7% dos votos, enquanto o uMkhonto we Sizwe (MK), um novo partido liderado pelo ex-presidente Jacob Zuma, conseguiu 14,6%.
Já o grupo de extrema esquerda Economic Freedom Fighters (EFF), liderado pelo ex-líder da juventude do ANC, Julius Malema, obteve 9,5%. O pequeno Inkatha Freedom Party (IFP), um partido conservador zulu com uma base de poder na província de KwaZulu-Natal obteve cerca de 4% dos votos.
"Podemos falar com todos e com qualquer pessoa", disse Gwede Mantashe, presidente do ANC e atual ministro das Minas e da Energia, aos jornalistas em comentários transmitidos pela South African Broadcasting Corporation (SABC), esquivando-se a uma pergunta sobre quem é o partido que estava a discutir uma possível coligação.
Após perda histórica nas eleições da África do Sul, partido de Mandela terá que disputar a presidência com oposição
Alianças incertas
Os potenciais aliados, porém, são desde a Aliança Democrática, uma legenda pró-mercado, a partidos insurgentes de ex-membros do ANC que deixaram a legenda.
Investidores da economia mais industrializada da África esperam que as incertezas acabem rapidamente.
O resultado ruim, contudo, pode alimentar discussões sobre a liderança de Cyril Ramaphosa. A vice-secretária-geral do ANC, Nomvula Mokonyane, afirmou que o mandatário não vai renunciar. “Ninguém vai renunciar... Coletivamente, todos nós estamos confiantes de que ele (Ramaphosa) continuará como presidente do ANC”, afirmou ela a repórteres no centro de resultados eleitorais.
"Há paz, há harmonia. Estamos todos a falar uns com os outros. Eu (gostaria) que o clima que existe aqui pudesse permear as comunidades e os eleitores”, completou Mokonyane à Associated Press.
Na sexta-feira, porém, um alto funcionário do ANC o apoiou para permanecer como líder do partido, e analistas dizem que ele não tem um sucessor óbvio.
Um acordo para manter o ANC na presidência poderia envolver o apoio da oposição em troca de cargos no gabinete ou de maior controle do Parlamento, talvez até do presidente da Câmara.
Outros partidos questionam o que consideram ser inconsistências na contagem de votos que podem levar à contestação de alguns resultados.
Desde o pleito histórico de 1994, que acabou com o domínio da minoria branca, o ANC venceu todas as eleições presidenciais sul-africanas.