Publicada em 10/07/2024 às 07h59
Em cima de dados falsos: empresa usou informações superdimensionadas para participar de licitação / Imagem: IA (ChatGPT-4)
Porto Velho, RO – Na última sexta-feira, dia 05 de julho, o site Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Rondônia (Crea-RO) publicou matéria intitulada “Crea-RO cancela Certidão de Acervo Técnico após denúncia de informações falsas em processo licitatório”.
“O Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Rondônia (Crea-RO) tomou medidas decisivas após uma grave denúncia envolvendo informações falsas em uma Certidão de Acervo Técnico (CAT). A certidão, utilizada por um profissional em um processo licitatório, foi cancelada pelo Crea-RO após confirmação da veracidade dos fatos por meio de diligência realizada pela equipe de fiscalização do conselho”, destacou o órgão, à ocasião.
Crea-RO encaminhou o caso à Polícia Federal (PF) / Reprodução-Print Screen
O site de notícias Rondônia Dinâmica teve acesso exclusivo a documentos que expõem o profissional signatário do CAT, que, por sua vez, é o proprietário da empresa, segundo dados do CNPJ.
A Madecon Engenharia e Participações Ltda participou do Edital de Concorrência nº 90001/2024, lançado pelo governo federal cujo contratante trata-se da Superintendência Regional de Polícia Federal em Rondônia. Para conseguir se habilitar, apresentou uma Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) com informações falsas, segundo a conclusão do Crea-RO.
Os documentos – tanto a ART quanto o CAT –, foram anexados à licitação. Ali foram relatados os serviços supostamente utilizados na construção da agência do Banco do Brasil, situada à Avenida Farquar. A equipe do Crea-RO, formada pela dupla Leandro Topan Leite, engenheiro, Gilton Carlos, fiscal, encontrou várias não conformidades – algumas delas drásticas –, entre os números dos quantitativos documentados e a realidade encontrada na inspeção.
Edital prevê construção do prédio da Polícia Federal por mais de R$ 80,5 milhões / Reprodução
Licitação da Polícia Federal em Rondônia
Para entender o caso é necessário indicar que a Superintendência Regional de Polícia Federal em Rondônia anunciou, então, por meio do certame, a locação de um imóvel na modalidade Built to Suit, que incluirá serviços de manutenção predial preventiva, corretiva e preditiva. O objetivo é criar uma nova sede para atender às necessidades institucionais da PF em Rondônia.
O projeto envolve um imóvel adaptado ou a ser construído, com uma área total de 6.998 m². O espaço deve abrigar salas corporativas e escritórios, um setor técnico-científico (incluindo laboratórios), um centro de articulações operacionais, um centro de treinamento, um estande de tiro, um canil, áreas de circulação, guaritas, um lava-jato e áreas técnicas. Além disso, o terreno, que terá uma área mínima de 9.000 m², contará com estacionamento e um pátio para veículos apreendidos. O valor total da contratação é de mais de R$ 80,5 milhões e o contrato tem duração de 15 anos. A Madecon Engenharia e Participações Ltda figura entre as concorrentes que almejam o contrato.
Denúncia
Em resposta a uma denúncia registrada no dia 21 de junho de 2024, através do protocolo PRO0022451624, uma equipe do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Rondônia (Crea-RO) realizou uma vistoria no endereço Avenida Farquar, nº 3235, bairro Panair, em Porto Velho. A denúncia mencionava discrepâncias nas informações apresentadas em uma Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) e sua correspondente Certidão de Acervo Técnico (CAT). Com a realidade in loco, os profissionais detectaram que havia vários serviços na ART e na CERTIDÃO que não existiam ou que estavam superdimensionados.
No dia 28 de junho de 2024, como já citado, o engenheiro Leandro Topan Leite, junto com o fiscal Gilton Carlos, foi recebido no local por Rogério Hoffmann, gerente de serviços do Banco do Brasil. Durante a inspeção, Rogério apresentou o habite-se nº 258/20219, que indicava uma área construída de 5.975,79 m², diferindo substancialmente dos 9.440,51 m² mencionados na ART 2320138207415548.
A equipe do Crea-RO, porém, encontrou várias outras inconsistências. Por exemplo, a ART mencionava um total de 14.765,58 m² de forro em fibra mineral, uma quantidade exageradamente superior à área total construída de 5.975,79 m². Além disso, divisórias em granito foram relatadas na ART como sendo 1.128,40 m², mas Rogério Hoffmann informou que estas divisórias existiam apenas nos banheiros, somando menos de 150 m².
Relatório apontou inconsistênciais abissais / Reprodução-Print Screen
Outra discrepância significativa foi em relação às portas metálicas corta-fogo. A ART registrava 60 unidades, enquanto na vistoria apenas duas portas foram encontradas. Em relação ao material Brisecell 200 mm, que deveria estar presente na fachada conforme a ART, a inspeção não encontrou nenhum metro quadrado instalado. Similarmente, a ART mencionava 762,07 m² de chapa de alumínio composto (ACM) na cor amarela, mas a vistoria revelou que a fachada utilizava apenas pastilhas.
Além dessas observações, a ART mencionava a instalação de 3.580 luminárias, mas segundo Hoffmann, o prédio não possuía essa quantidade. Foram constatados apenas 20 quadros de distribuição, em contraste com os 95 listados na ART, e 16 racks de equipamento de lógica, em vez dos 31 racks descritos.
As imagens anexadas ao relatório mostraram claramente as discrepâncias, como a ausência do Brisecell e a utilização de pastilhas no lugar do ACM amarelo mencionado.
O relatório concluiu que as informações apresentadas na ART e na CAT estavam em desacordo com a realidade constatada durante a vistoria.
Consequências técnicas
De acordo com o Crea-RO, além do cancelamento da Certidão de Acervo Técnico (CAT) e da respectiva Anotação de Responsabilidade Técnica (ART), a entidade iniciou um processo ético contra o profissional responsável e notificou o órgão licitante sobre a irregularidade detectada.
A CAT é, ainda segundo a instituição, um documento fundamental que certifica legalmente as atividades registradas no Crea-RO de um profissional, com base em suas competências técnicas comprovadas por ARTs.
Diante da gravidade do ocorrido, “o Crea-RO encaminhou toda a documentação pertinente à denúncia para investigação pela Polícia Federal. Como Autarquia Federal, o conselho reforça seu compromisso institucional de proteger a sociedade, comprometendo-se a investigar e reportar quaisquer irregularidades que possam comprometer a integridade do sistema profissional”, anotou o comunicado.
Edison Rigoli, presidentre do Crea-RO, enfatizou à época a seriedade com que o conselho trata essas questões, destacando que serão aplicadas as punições cabíveis com rigor para garantir a correção e ética nas práticas profissionais sob sua jurisdição.
Edital prevê punições a quem apresenta informações falsas à licitação / Reprodução-Print Screen
Desdobramentos
Existe uma expectativa muito grande por parte da classe de engenheiros sobre eventuais punições às quais a empresa poderá sofrer por supostas infringências no Edital. Isto, vez que seu item 9 prevê sanções como declaração de inidoneidade da empresa, além do pagamento de multa, para a concorrente que apresentar documentos falsos na licitação. “E também pelo desrespeito com a Polícia Federal”, diz uma fonte ligada à categoria que não quis se identificar.
A Madecon já consta como desclassificada, mas por motivos alheios ao documento com informações falsas.
O espaço está aberto para eventuais manifestações a respeito do caso.