Publicada em 26/08/2024 às 08h59
Porto Velho, RO – O jovem estado de Rondônia é uma espécie de “aborto da natureza”. Não tem nem nunca teve importância nenhuma na já caótica e triste realidade nacional. O número de habitantes nas suas principais cidades só diminui a cada dia. A diáspora rondoniana é sentida principalmente em sua capital, Porto Velho. Esse Estado foi resultado de um dos maiores desastres ambientais da história da Humanidade e hoje está em franca e visível decadência. Talvez por isso ou em consequência disso, resolveu-se de uma hora para outra privatizar tudo o que existe por aqui. Desde praças e monumentos até as belezas naturais como, por exemplo o rio Madeira. O velho “rio das Madeiras” não só foi privatizado, mas praticamente morto pela ambição humana. Fincaram-lhe duas hidrelétricas no seu já assoreado leito e o resultado prático é que nem mais madeiras em seu curso ele tem mais.
Privatizado, assoreado e sem peixes, o velho Madeira agoniza a cada ano e sua morte já é quase certa. Este ano de 2024 vai secar tanto que em alguns trechos ficará difícil até para se navegar de canoa. Mas a sanha privatista e perversa não parou por aí. O agronegócio pode ser o maior responsável pelas queimadas que se verificam no estado todo ano no verão amazônico. A floresta arde em chamas para dar passagem a mais produção de commodities. A fumaça sufocante e tóxica invade os estados de outras regiões denunciando o pouco caso que Rondônia tem com o já combalido meio ambiente. Durante todo o mês de agosto, Porto Velho teve o pior ar do Brasil para se respirar. Os poucos hospitais se encheram de velhos e de crianças com problemas respiratórios. “É o progresso em Rondônia”, dizem os mais desinformados. Mas o sofrimento atinge a todos.
Privatizaram também a antiga Ceron, Centrais Elétricas de Rondônia, por um preço ínfimo, mas os benefícios ainda não apareceram para ninguém. Como esquecer o apagão do dia 22 de agosto último? Estão querendo privatizar a Caerd, Companhia de Água e Esgotos de Rondônia. Só que a bola da vez foi a EFMM, a lendária e histórica Estrada de Ferro Madeira-Mamoré. Dizem que a velha “Ferrovia do Diabo” pertence ao povo de Rondônia. Mentira! Se você quiser visitar o museu tem que pagar pelo menos 33 reais. Muito caro e até inadmissível. Para se visitar o Museu do Louvre em Paris paga-se somente 17 euros. Só que o salário mínimo francês é de quase 1.600 euros e aqui no Brasil não passa de 1.412 reais. Além do mais o Louvre é visitado por pessoas do mundo inteiro, enquanto a EFMM... Mas ambos têm a sua importância. O Louvre superado pela EFMM?
O poder público é que deveria custear a EFMM e seu museu, dada a relevância deles para Rondônia, para os rondonienses e principalmente para os porto-velhenses. Embora estejamos cansados de ver trilhos espalhados pela cidade de Porto Velho servindo de proteção para algumas casas e comércios. Vimos também as águas do rio Madeira invadirem lentamente os galpões históricos na grande enchente de 2014. Talvez por isso, resolveram “vender” o maior e mais importante ponto histórico e turístico daqui. Cobrar 10 reais a título de manutenção já seria algo muito incomum. Ainda assim, duvido que muita gente se interessasse em visitá-lo. E não tem que privatizar nada. O poder público tem competência suficiente para administrar sua própria história. Se privatizar fosse bom, o “Built to Suit” do governador Marcos Rocha teria dado certo e a velha EFMM estaria com multidões na sua porta. Fato: “Quando tudo for privado, seremos privados de tudo”.
*Foi Professor em Porto Velho.