Publicada em 26/08/2024 às 15h33
Um dos mais altos funcionários do Poder Eleitoral da Venezuela, Juan Carlos Delpino afirmou em carta nesta segunda-feira (26) que houve falta de transparência e veracidade nos resultados anunciados pelo próprio órgão que compõe e que determinaram Nicolás Maduro reeleito para um mandato de mais seis anos.
Delpino é um dos cinco reitores do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), um dos cinco Poderes do país, e é o primeiro a contrariar o resultado oficial, que no mais é questionado pela oposição, que afirma haver fraude, e por boa parcela da comunidade internacional, com países como EUA e Chile e a União Europeia (UE).
O advogado compunha a informal cota opositora entre os reitores do órgão conhecido por ter maioria chavista. Eles foram escolhidos pela Assembleia Nacional venezuelana (também dominada pelo chavismo) em agosto passado em um processo pouco transparente.
Três de seus membros estão relacionados ao PSUV, partido do regime, sendo que dois são alvos de sanções de Washington por acusações de minar processos eleitorais e censurar a mídia. Quintero e Aime Nogal, uma outra reitora, eram mais próximos da oposição. O CNE foi o responsável por organizar as eleições que ocorreram em 28 de julho.
A dois dias de se completar um mês da eleição mais importante da Venezuela desde que Maduro chegou ao poder em 2013, as declarações colocam em xeque a independência do Poder Eleitoral, que opositores já afirmaram operar a mando do regime no poder.
Na carta de duas páginas, o advogado que está na clandestinidade por temer represálias demonstra que muitas das decisões tomadas no grupo de reitores do CNE não contemplaram todas as vozes. Ele se opôs, por exemplo, à decisão unilateral do reitor presidente, Elvis Amoroso, de desconvidar a UE como observadora do processo.
"Identifiquei e sinalizei uma série de desafios críticos que ameaçavam a adequada realização do processo", escreve Delpino. Entre outras coisas, ele diz que a legitimidade dos resultados em vários centros de votação foi comprometida à medida que testemunhas eleitorais foram impedidas de obter as atas de votação, como manda a lei.
Ele também critica a judicialização do processo. Na última semana, instado por Maduro, o Supremo do país, dominado pelo chavismo, chancelou os resultados anunciados pelo CNE. Não exigiu, porém, que sejam publicadas as atas de votação tão aguardadas pela comunidade internacional e exigidas por países como o Brasil e a Colômbia, que tentam atuar em um processo de mediação.
Delpino diz que a resolução do conflito "deve ser feita dentro do próprio CNE, convocando os técnicos e os peritos para olharem as atas que o órgão possui desde o dia da eleição com as que os diferentes comandos de campanha têm, e que elas sejam auditadas por observadores internacionais e certificados de forma independente".
A proposta de observação internacional para a auditoria das atas, cada vez mais distante, tampouco encontra consenso na comunidade internacional. O Brasil, por exemplo, se opõe a essa exigência, como já o fez em mais de uma resolução em órgãos multilaterais, ao afirmar que não há base Constitucional para exigir que Caracas aceite receber observadores de fora para auditar seus resultados.
Descartando-se governos aliados de Caracas ou observadores internacionais minoritários e também com afinidade ideológica com o regime, nenhum órgão independente até hoje validou os resultados eleitorais anunciados pelo CNE que dão 52% dos votos para Maduro, ante 43% para o principal opositor, Edmundo González.
O Carter Center, única organização de peso que atuou como observadora credenciada, afirmou que os dados mostram uma vitória clara de González e que a eleição não foi democrática.
Já o painel de especialistas da ONU, que não tinha caráter de observador, mas acompanhou todo o processo in loco, afirmou que Caracas descumpriu medidas básicas para uma eleição com credibilidade.