Publicada em 08/08/2024 às 11h11
O economista e vencedor do prêmio Nobel da Paz Muhammad Yunus foi anunciado nesta semana como novo líder de governo interino de Bangladesh após a fuga da então primeira-ministra, Sheikh Hasina.
Conhecido como "banqueiro dos pobres", Yunus criou a primeira instituição financeira do mundo a fornecer microcréditos com taxas de juros mais acessíveis.
A escolha de colocá-lo no poder, inclusive, foi uma exigência dos líderes estudantis que comandaram os protestos que culminaram na renúncia e fuga de Hasina.
Em seu primeiro discurso de volta ao país, Yunus disse que Bangladesh não pode "dar um passo adiante a menos que solucionemos a situação da lei e da ordem".
"O país tem a possibilidade de se tornar uma nação muito bonita. Seja qual for o caminho que nossos estudantes nos mostrarem, seguiremos em frente. Nós tínhamos acabado com essas possibilidades, agora novamente temos que nos levantar. Para os oficiais do governo aqui e chefes de defesa: nós somos uma família, devemos seguir em frente juntos", falou.
Quem é Muhammad Yunus
Yunus nasceu em 1940, na cidade portuária de Chittagong. É muçulmano não-praticante e estudou Ciências Econômicas na Universidade de Dhaka.
Posteriormente, ampliou seus estudos nos Estados Unidos com bolsas das instituições Fullbright e Eisenhower. Voltou a seu país em 1972 para dirigir o departamento de Economia da Universidade de Chittagong. Ele continua trabalhando na área acadêmica até hoje.
Mas foram os projetos sociais na área de economia que se tornaram a força-motriz para que Yunus recebesse centenas de premiações e homenagens ao longo dos anos, inclusive o Nobel da Paz, em 2006.
Ele é reconhecido, principalmente, pela criação do Grameen Bank, a primeira instituição especializada na concessão de microcrédito a pessoas de baixa renda do mundo.
O banco foi fundado em 1976, e a ambição de Yunus no longo prazo era justamente contribuir para erradicar a pobreza do mundo por meio de microcréditos, que beneficiam especialmente as mulheres.
A ideia de criara uma instituição desse tipo nasceu durante o período conhecido como "fome de Bangladesh", em 1974, quando Yunus resolveu fazer um empréstimo pessoal de US$ 27 para um grupo de 42 famílias para que pudessem produzir itens para venda.
"Yunus acreditava que tornar esses empréstimos disponíveis para uma população maior poderia estimular negócios e reduzir a pobreza rural generalizada em Bangladesh", diz a página oficial do banco.
À época do Nobel, os tomadores de empréstimo do Grameen chegavam a 3,8 milhões de pessoas. Cada um deles se tornavam acionistas do banco e nada menos que 98% eram mulheres. Atualmente, até junho de 2024, já são mais de 9,3 milhões beneficiários, sendo 97% mulheres.
De sua fundação até aqui, o banco já desembolsou quase US$ 39 bilhões em empréstimos e, de acordo com a empresa, já garantiu uma taxa de recuperação de lucros de 96,29%.
O Comitê Nobel afirmou que os "microcréditos se tornaram uma importante força de libertação em sociedades nas quais as mulheres precisam lutar contra um entorno social e econômico repressivo". Yunus passou a ser reconhecido como "banqueiro dos pobres".
Yunus e a política
Yunus manteve uma disputa pública durante anos com as autoridades de seu país devido a um documentário da uma emissora norueguesa que denunciou uma suposta transferência ilegal de fundos entre duas entidades do Grupo Grameen.
A cena política bengalesa era dominada pela primeira-ministra Sheikh Hasina e sua opositora Khaleda Zia, herdeiras de dinastias políticas. Yunus tentou abrir uma terceira via com a formação de um partido antes das eleições de 2008, abrindo divergência com as forças estabelecidas.
O Governo de Bangladesh chegou a reconhecer que o banco não incorreu na irregularidade denunciada pelo documentário, baseando-se nas conclusões do comitê de especialistas nomeado em janeiro para examinar suas atividades. Mas Yunus renunciou ao seu cargo de diretor-executivo do Grameen em 2011.
Na última segunda-feira (5), após uma série de protestos em Bangladesh, a Sheikh Hasina, que estava no poder há 15 anos, renunciou ao poder e fugiu do país.
A pressão começou com uma onda de protestos iniciados em julho com um movimento estudantil contra um sistema de cotas para funcionários, mas evoluiu para uma mobilização mais ampla contra o governo.
Desde o início das mobilizações, pelo menos 432 pessoas morreram, segundo um levantamento da AFP baseado em relatórios da polícia, autoridades e médicos em hospitais, e que terminou com a fuga de Hasina em um helicóptero.
Em um comunicado publicado na terça-feira (6), o principal sindicato da polícia pediu "desculpas" por ter disparado contra estudantes. A federação afirmou que os policiais foram obrigados a "abrir fogo" contra os jovens e que, depois, foram apresentados como os "vilões", e também anunciou uma greve para garantir a segurança dos efetivos.
Muhammad Yunus foi anunciado pela Presidência de Bangladesh como líder de um governo interino também na terça. A escolha dele foi uma exigência dos líderes estudantis que comandaram os protestos que levaram à renúncia de Hasina.
"O país tem a possibilidade de se tornar uma nação muito bonita.Seja qual for o caminho que nossos estudantes nos mostrarem, seguiremos em frente. Nós tínhamos acabado com essas possibilidades, agora novamente temos que nos levantar. Para os oficiais do governo aqui e chefes de defesa: nós somos uma família, devemos seguir em frente juntos", falou.
Yunus deve tomar posse como chefe de uma equipe de conselheiros ainda nesta quinta, na residência oficial do presidente Mohammed Shahabuddin.