Publicada em 24/09/2024 às 15h09
Em seu discurso de despedida à Assembleia-Geral da ONU, o presidente Joe Biden disse que colocou a defesa da democracia no centro de seu mandato, fez uma defesa de seu legado internacional e afirmou, sob aplausos, que há coisas mais importantes do que permanecer no poder.
Em uma abordagem inusual, o americano tratou no discurso da sua decisão de sair da disputa pela Casa Branca. "Eu queria fazer muito mais, mas por mais que eu ame meu trabalho, amo mais o meu país", disse.
"Líderes, vamos esquecer que algumas coisas são mais importantes do que permanecer no poder. O mais importante é o seu povo. Nunca se esqueça que nós estamos aqui para o povo. Não o contrário".
Diante da escalada da tensão no Oriente Médio, com os ataques de Israel ao Líbano, o americano disse que uma guerra ampla na região não é do interesse de ninguém e fez um apelo por uma solução diplomática. "Estamos trabalhando duramente para alcançar isso", disse.
Ele ainda condenou os ataques de 7 de outubro pelo Hamas, mas ao mesmo tempo apontou que "civis inocentes em Gaza também estão vivendo um inferno". Biden cobrou que as partes fechem um acordo de cessar-fogo para acabar com a guerra. "Esta é a hora", disse.
Já no trecho final do discurso, que durou 24 minutos (quase 10 a mais do que o permitido), Biden citou a crise política na Venezuela. "O mundo sabe a verdade", afirmou sobre a eleição contestada em que o regime de Nicolás Maduro disse ter saído vencedor. Para a Casa Branca, a oposição venceu.
O tom da fala foi de balanço -não apenas de seu mandato como presidente, mas desde seu início de sua carreira política. Biden relembrou, por exemplo, sua oposição ao apartheid na África do Sul quando era senador e a queda do muro de Berlim. O americano de 81 anos até brincou com a idade, dizendo que sabe que, apesar de ter vivido tudo isso, aparenta "ter só 40 anos".
O americano discursou na manhã desta terça-feira (24), logo após o presidente Lula. Embora não seja mais o candidato democrata à Casa Branca, substituído na chapa por sua vice, Kamala Harris, a disputa contra Donald Trump esteve nas entrelinhas.
Em uma indireta ao adversário, Biden defendeu que cooperação global é o melhor caminho, em vez de uma postura isolacionista. "Nossa tarefa é garantir que as forças que nos unem são mais fortes do que as que nos dividem", disse o democrata.
"Toda geração enfrenta seus desafios. Vi isso quando era um homem jovem, e vejo hoje. Mas somos mais fortes do que pensamos, somos mais fortes juntos do que sozinhos", disse de modo enfático, citando em seguida o sul-africano Nelson Mandela: "tudo parece impossível até ser feito".
A instabilidade global nos últimos anos vem sendo um dos alvos de ataque de Trump. O republicano atribui os conflitos ao que vê como uma fraqueza de Biden, exemplificadas pela suspensão de sanções ao Irã e à Venezuela e pela saída desastrosa das tropas americanas do Afeganistão.
Em campanha, o empresário diz com frequência que resolvia problemas com outros países durante seu governo simplesmente ameaçando suspender o repasse de recursos americanos. Seu retorno à Casa Branca é visto com temor por aliados dos EUA, principalmente entre europeus, que contam com Washington para fazer frente à Rússia.
Biden reconheceu nesta terça os problemas da saída do Afeganistão, mas, ainda assim, defendeu sua decisão. "Quatro presidentes antes de mim tentaram. Eu não seria o quinto", disse.
O americano contou a história de seu mandato como uma espécie de "os Estados Unidos voltaram" após os turbulentos anos Trump, apontando o que vê como resultados concretos de sua liderança: a união do mundo em defesa da Ucrânia após a invasão pela Rússia, a negociação de um acordo de cessar-fogo para Gaza e a gestão da competição entre Washington e Pequim.
Biden relembrou que trouxe de volta os EUA para o Acordo de Paris, do qual Trump havia se retirado, e sua atuação no âmbito da OMS (Organização Mundial da Saúde) no combate à pandemia e, agora, à mpox.
A mensagem foi de que esses desafios persistem, se somam a problemas como a crise climática e as implicações de novas novas tecnologias como a inteligência artificial, e só podem ser resolvidos por meio de cooperação. "Estamos em um ponto de inflexão da história. As decisões que tomamos hoje vão repercutir por décadas", alertou.
O americano fez um alerta sobre o impacto sem precedentes da IA, para o bem e para o mal. Ele elencou alguns esforços de regulação dentro e fora dos EUA. "Mas vamos ser honestos, esta é a ponta do iceberg do que precisamos fazer diante dessa nova tecnologia", disse.
Como fez no ano passado, Biden repetiu seu apoio a uma reforma de organismos multilaterais, como a própria ONU, e citou especificamente seu apoio a uma expansão do Conselho de Segurança.
Após o discurso, o presidente americano vai se reunir com o secretário-geral da organização, António Guterres. À tarde, ele promove um encontro da coalizão global sobre ameaças oferecidas por drogas sintéticas, uma iniciativa lançada em junho do ano passado que reúne hoje 158 países e 15 entidades internacionais.
No mesmo dia, o democrata participa de um evento em que fará um discurso sobre crise climática. Na quarta, ele tem um encontro bilateral com o presidente do Vietnã, To Lam, e participa de uma reunião sobre a reconstrução da Ucrânia. À noite, ele participa de uma recepção para líderes estrangeiros no Met, o Museu Metropolitano de Arte de Nova York.