Publicada em 19/09/2024 às 10h25
Porto Velho, RO – A ativista indígena Txai Suruí, da etnia suruí e coordenadora do Movimento da Juventude Indígena, manifestou-se contra a pavimentação da rodovia BR-319, em um artigo publicado na Folha de S. Paulo. A rodovia, que conecta Manaus (AM) a Porto Velho (RO), tem sido tema de controvérsias ambientais desde sua inauguração parcial nos anos 1970. Atualmente, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva defende a reconstrução da estrada, argumentando que a obra é essencial para a integração e o desenvolvimento econômico da região.
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Não, presidente Lula, não queremos a BR-319
Txai, no entanto, questiona esse discurso. Segundo ela, os povos indígenas "sabem muito bem o que a integração significa" para seus territórios e comunidades. Ela critica o projeto por desrespeitar os direitos indígenas e não realizar consultas prévias, como previsto na legislação internacional. "A BR-319 impacta mais de 18 mil indígenas de 63 terras indígenas", afirma.
A rodovia, que está em grande parte desativada desde 1988 devido à falta de manutenção, foi objeto de uma tentativa de pavimentação em 2020, durante o governo de Jair Bolsonaro. No entanto, o Ministério Público Federal apontou irregularidades no processo, incluindo a ausência de estudos ambientais e consultas às comunidades afetadas. Um trecho da rodovia foi alvo de uma ação judicial que suspendeu a licença de obras por falta de medidas para evitar a destruição da floresta.
Txai alerta que a pavimentação poderia fomentar ainda mais o desmatamento na Amazônia. "No total, estima-se que cerca de metade da floresta amazônica brasileira seria impactada, não apenas a borda da BR-319", escreve. A ativista também critica o uso da crise climática como justificativa para a obra, alegando que o agronegócio seria o principal beneficiado.
Em contrapartida, Lula tem defendido a necessidade da rodovia como uma via de ligação essencial entre os estados de Amazonas e Rondônia, sobretudo em um cenário de seca histórica que isola comunidades devido à baixa navegabilidade dos rios. "Nós vamos ter que garantir que nós não vamos permitir o desmatamento e a grilagem de terra próximo à rodovia", afirmou o presidente em uma visita à Aldeia Kainã, do povo munduruku.
O governo federal também argumenta que a BR-319 é tecnicamente viável e que a obra pode ser conduzida com sustentabilidade. Um relatório do Ministério dos Transportes, publicado em junho deste ano, indica que há espaço para a realização do projeto com "controle e monitoramento" do ecossistema ao redor da rodovia. A próxima etapa envolve negociações entre diferentes ministérios, governos locais e órgãos ambientais.
Apesar das promessas de mitigação, Txai e outros ativistas permanecem céticos quanto aos impactos da pavimentação. Para ela, o projeto da BR-319 "não traz benefício algum aos povos da região, que já sofrem com seus impactos" e representa uma afronta aos direitos indígenas.
Enquanto o debate sobre a rodovia continua, o governo federal anunciou novas medidas para combater a seca na Amazônia, incluindo obras de dragagem nos rios Solimões e Amazonas, num esforço para melhorar a navegabilidade e reduzir os efeitos da estiagem que afeta 61 dos 62 municípios amazonenses.